O autointeresse motiva muitas das ações humanas. Um bebê com fome tem interesse em se alimentar. O bebe chora, obtém o leite e sossega. É saciado com uma mamadeira ou o seio da mãe.
Nossos interesses motivam aquilo em que prestamos atenção e que influenciam nossos pensamentos e consciência. O interesse corporativista caracteriza-se pela defesa do autointeresse de um grupo a exemplo de uma corporação, organização empresarial ou instituição que tenha interesses específicos; ou de uma categoria profissional que queira defender seu mercado de trabalho. Guetos, enclaves, gangues, tribos autocentradas e antagônicas ao entorno também se comportam na defesa do autointeresse de um grupo em oposição aos demais. No campo das raças, o autointeresse confunde-se com o racismo. Centrado em crenças religiosas, leva ao fanatismo e à intolerância.
A defesa do autointeresse particularista se dá também a partir de um território, tais como os burgos da cidade média fortificados com muros para se defender contra os perigos e ameaças externos ou os condomínios fechados que proliferam nas metrópoles modernas e que procuram proteger seus moradores da insegurança e da violência que ocorre no meio externo. Em escala nacional, confunde-se com o chamado interesse nacional. No campo internacional, as dificuldades para se chegar a um acordo sobre o clima explicitam que cada país enxerga como sendo de seu interesse um aspecto distinto. O interesse nacional míope se sobrepõe ao interesse global da espécie. As reuniões internacionais sobre o clima tem sido termômetros que revelam a disposição ao autointeresse estreito ou ao generoso autointeresse planetário.
Num planeta interligado, onde ações num local produzem impactos distantes, cresce a consciência de que o interesse próprio confunde-se com o interesse do outro; em longo prazo e numa perspectiva planetária, são os interesses da própria vida, de sua reprodução e da expansão da consciência. Nessa escala, somos todos terráqueos e o que ocorrer ao planeta Gaia nos afetará a cada um. A perspectiva da catástrofe natural, como, por exemplo, a trazida pelas mudanças climáticas, ajuda a entender que, no limite, o autointeresse confunde-se com o interesse planetário.
O que você pensa percebe ou enxerga como sendo de seu auto interesse?
Em busca do programa que nos interessa, giramos o dial e sintonizamos na freqüência de onda de uma rádio ou zapeamos até encontrar um canal no controle remoto da TV. Quando encontramos uma programação interessante, nos habituamos a sintonizar nela, por rotina ou satisfação. Se estivermos sintonizados numa faixa, não percebemos o conteúdo das demais, apesar de sabermos que elas existem. É impossível estar sintonizado em todas as faixas ao mesmo tempo. Quando nos desinteressa ou não mais nos satisfaz, buscamos outras sintonias ou canais que despertem nosso interesse ou curiosidade.
A compreensão do que é o autointeresse varia de acordo com o modo de consciência em que se está.
O espectro da consciência tem diversos canais. Os diferentes interesses políticos e econômicos se refletem na percepção e no maior ou menor grau de consciência ecológica de cada ator.
Despertar o interesse por uma faixa de onda faz com que a consciência se sintonize e fixe a atenção nela. Há no planeta bilhões de indivíduos humanos, sintonizados em distintas faixas ou canais da consciência. A consciência é condicionada ou moldada por influências culturais, familiares, religiosas, do ambiente humano, social, natural. À medida que se amplia a consciência, passa-se a incluir outros aspectos no campo do interesse próprio. Percebe-se ou enxerga-se mais longe.
O autointeresse nos faz sintonizar a faixa da consciência. À medida que evolui do estágio egocêntrico para o etnocêntrico (o interesse do grupo racial ou social) para o mundicêntrico (o interesse planetário) ou o ecocêntrico, o campo do autointeresse se expande e torna-se mais inclusivo. (Atualmente inúmeros recursos visuais facilitam desenvolver essa perspectiva de escala a exemplo de http://www.youtube.com/watch?v=17jymDn0W6U e http://www.youtube.com/watch?v=Nspk_J9nzHk )
O autointeresse ampliado se aproxima ou identifica com o interesse ecológico. Enquanto a eco-ação focaliza o interesse da vida e de um planeta em condições de abrigá-la, a ego-ação enfatiza o interesse particularista, privado, pessoal. Quando a consciência focada no ego pessoal se amplia para a consciência ecológica, percebe-se que somos parte do ambiente e o que ocorrer com ele ocorrerá conosco.
A consciência social ajuda a avançar de um egoísmo estreito para o altruísmo da ação social. A consciência ecológica ajuda a avançar de um egoísmo míope e ignorante para uma forma mais ilustrada e esclarecida de egoísmo ou para um altruísmo que inclui as pessoas não-humanas (como os golfinhos, por exemplo). Com a consciência ecológica, a noção de autointeresse se alarga e expande. Ecologizar o interesse é uma atitude sábia para enfrentar a atual megacrise da evolução.
quinta-feira, 21 de janeiro de 2010
segunda-feira, 11 de janeiro de 2010
Evolução da consciência e crise climática
Três anos depois de ter lançado o livro Uma verdade inconveniente e o filme que ganhou o Oscar e lhe proporcionou o prêmio Nobel da paz, Al Gore lançou novo livro em 2009: Nossa Escolha - um plano para resolver a crise climática. [1] Al Gore considera que há um fio comum que liga três megacrises: a de segurança, a econômica e a climática. Tal fio é a dependência de petróleo e dos combustíveis fósseis. Para ele, a solução para todas essas crises é afastar-se da dependência dos combustíveis fósseis, desenvolvendo outras fontes de energia renováveis.
Para propor soluções para a crise climática, Al Gore mobilizou mais de 30 encontros com cientistas e especialistas de vários países e áreas temáticas. Seus insights e propostas são apresentados no livro, que é uma chamada à ação: não a ação individual, mas a que interfere nos processos políticos, na elaboração de leis e regulamentos e na construção de uma infraestrutura coletiva que dê respostas à crise climática. Assim por exemplo, ele denuncia a desatualização regulatória e problemas na gestão de energia que precisam ser corrigidos com prioridade.
Em 18 capítulos, o livro trata da crise atual, das fontes e de como usamos a energia, dos sistemas vivos, dos obstáculos que precisamos superar. Capítulos específicos tratam das florestas, do solo; da população, suas demandas e impactos ambientais e climáticos.
Al Gore afirma que já temos conhecimento e tecnologia para enfrentar a crise climática, mas que falta despertar a vontade coletiva. A importância da evolução da consciência é enfatizada: "As únicas soluções efetivas e significativas para a crise climática envolvem mudanças massivas no pensamento e comportamento humanos."
O livro mapeia três tipos de dificuldades associadas à mudança de pensamento que precisam ser superadas: em primeiro lugar, aponta que nosso cérebro foi programado para processar perigos como os que nossos antepassados precisaram enfrentar em sua luta pela sobrevivência. Entretanto, a crise climática não aciona as defesas emocionais que outros riscos despertam: ela é muito abstrata, exige muito conhecimento para ser percebida como uma ameaça, é grande demais e seu impacto parece remoto: “Seus efeitos são distribuídos pela Terra num padrão que torna difícil atribuir uma relação sem ambigüidades de causa e efeito entre o que está acontecendo com a Terra como um todo e o que está acontecendo com um indivíduo num determinado momento e lugar." Exemplifica ele que “é como não sentíssemos a dor de uma queimadura e por isso continuamos a ser queimados sem perceber.”
Em segundo lugar, e como dificuldades adicionais para a mudança de pensamento, nossos cérebros estão estressados pela overdose de estímulos bombardeada pela propaganda, conduzida a partir da neurociência pelos marqueteiros e publicitários, “os grandes usuários da nova pesquisa do cérebro.” Estresse, ansiedade e preocupação dificultam que se focalize a mente no longo prazo necessário para lidar com a mudança climatica, e fazem com que se priorize o imediato, como ocorre com quem precisa lutar para sobreviver no dia a dia.
Uma terceira dificuldade para a mudança de pensamento é o poder dos lobbies das empresas que lucram com o petróleo e o carvão. Repetindo a estratégia de companhias de cigarro, que negavam que o cigarro fizesse mal a saúde, as empresas de petróleo também fazem campanhas milionárias e doam recursos para eleger políticos. Dúvida e controvérsia são semeadas na mente das pessoas e enfraquecem a motivação para agir de forma convergente. Uma estratégia de desinformação influencia o público, que tende a não querer acreditar que exista tal ameaça. “O resultado de semear tais dúvidas e controvérsias é paralisar os processos políticos ou atrasá-los, no sentido de postergar ações que contrariem interesses da indústria do petróleo e do carvão.”Al Gore defende o ativismo nas bases para neutralizar essa ação financiada por interesses poderosos. Para tanto, criou uma instituição, a Aliança para a proteção climática WWW.climateprotect.org que divulga o tema na TV, rádio, internet, jornais, revistas.
Ele nos dá pistas de que investir na ecologia mental e da consciência, ecologizar a cultura e a comunicação, são abordagens estratégicas para dar respostas à crise climática, que traz consigo uma crise da evolução.
[1] Al Gore - Our Choice, a plan do solve the climate crisis, Rodale Inc., US, 2009; 416pgs.
Para propor soluções para a crise climática, Al Gore mobilizou mais de 30 encontros com cientistas e especialistas de vários países e áreas temáticas. Seus insights e propostas são apresentados no livro, que é uma chamada à ação: não a ação individual, mas a que interfere nos processos políticos, na elaboração de leis e regulamentos e na construção de uma infraestrutura coletiva que dê respostas à crise climática. Assim por exemplo, ele denuncia a desatualização regulatória e problemas na gestão de energia que precisam ser corrigidos com prioridade.
Em 18 capítulos, o livro trata da crise atual, das fontes e de como usamos a energia, dos sistemas vivos, dos obstáculos que precisamos superar. Capítulos específicos tratam das florestas, do solo; da população, suas demandas e impactos ambientais e climáticos.
Al Gore afirma que já temos conhecimento e tecnologia para enfrentar a crise climática, mas que falta despertar a vontade coletiva. A importância da evolução da consciência é enfatizada: "As únicas soluções efetivas e significativas para a crise climática envolvem mudanças massivas no pensamento e comportamento humanos."
O livro mapeia três tipos de dificuldades associadas à mudança de pensamento que precisam ser superadas: em primeiro lugar, aponta que nosso cérebro foi programado para processar perigos como os que nossos antepassados precisaram enfrentar em sua luta pela sobrevivência. Entretanto, a crise climática não aciona as defesas emocionais que outros riscos despertam: ela é muito abstrata, exige muito conhecimento para ser percebida como uma ameaça, é grande demais e seu impacto parece remoto: “Seus efeitos são distribuídos pela Terra num padrão que torna difícil atribuir uma relação sem ambigüidades de causa e efeito entre o que está acontecendo com a Terra como um todo e o que está acontecendo com um indivíduo num determinado momento e lugar." Exemplifica ele que “é como não sentíssemos a dor de uma queimadura e por isso continuamos a ser queimados sem perceber.”
Em segundo lugar, e como dificuldades adicionais para a mudança de pensamento, nossos cérebros estão estressados pela overdose de estímulos bombardeada pela propaganda, conduzida a partir da neurociência pelos marqueteiros e publicitários, “os grandes usuários da nova pesquisa do cérebro.” Estresse, ansiedade e preocupação dificultam que se focalize a mente no longo prazo necessário para lidar com a mudança climatica, e fazem com que se priorize o imediato, como ocorre com quem precisa lutar para sobreviver no dia a dia.
Uma terceira dificuldade para a mudança de pensamento é o poder dos lobbies das empresas que lucram com o petróleo e o carvão. Repetindo a estratégia de companhias de cigarro, que negavam que o cigarro fizesse mal a saúde, as empresas de petróleo também fazem campanhas milionárias e doam recursos para eleger políticos. Dúvida e controvérsia são semeadas na mente das pessoas e enfraquecem a motivação para agir de forma convergente. Uma estratégia de desinformação influencia o público, que tende a não querer acreditar que exista tal ameaça. “O resultado de semear tais dúvidas e controvérsias é paralisar os processos políticos ou atrasá-los, no sentido de postergar ações que contrariem interesses da indústria do petróleo e do carvão.”Al Gore defende o ativismo nas bases para neutralizar essa ação financiada por interesses poderosos. Para tanto, criou uma instituição, a Aliança para a proteção climática WWW.climateprotect.org que divulga o tema na TV, rádio, internet, jornais, revistas.
Ele nos dá pistas de que investir na ecologia mental e da consciência, ecologizar a cultura e a comunicação, são abordagens estratégicas para dar respostas à crise climática, que traz consigo uma crise da evolução.
[1] Al Gore - Our Choice, a plan do solve the climate crisis, Rodale Inc., US, 2009; 416pgs.