A ampla gama de questões ambientais da atualidade, que não
cessa de crescer, está sujeita a muitas controvérsias e polêmicas. Para cada
tema específico dessa agenda, é usual haver posições que variam de A a Z, do preto ao branco, passando por todo o espectro de
tonalidades, cada uma delas com seu embasamento e fundamentação próprios. Há
posições extremadas que, por interesses econômicos de autoproteção e por defesa
psicológica para reduzir o sentimento de culpa, procuram minimizar a gravidade
dos problemas, tampar o sol com a peneira, legitimar comportamentos que
pressionam o ambiente; no outro extremo, há posições catastrofistas, que
dramatizam, amplificam e exageram os problemas, semeiam pânico e histeria, para
obter atenção política e recursos econômicos. Ambos os
extremos prestam um desserviço à sociedade: por um lado, os integrados podem
atrasar a tomada de decisões; por outro lado, os apocalípticos podem colocar em
descrédito a causa ambiental, ao anunciarem catástrofes que não ocorrem. A confiabilidade das fontes de informação é um valor
fundamental. Aqueles que repetem alarmes falsos ou que tentam enganar sobre
a gravidade dos problemas perdem a credibilidade.
Na cobertura da questão ecológica, alguns temas são
superexplorados e cala-se sobre outros. Por conveniência empresarial ou ideológica,
deixam de ser pautados temas que possam causar desgastes diante de anunciantes,
tais como a indústria da carne, a indústria automobilística, a indústria do petróleo
ou da extração de minérios, a indústria alimentícia e a farmacêutica. São
pautados e supervalorizados assuntos que causam sensação e ajudam a atrair
leitores e espectadores, porém que não contribuem para a formação de
consciência ecológica profunda. Fritjof Capra
(1993)[1] denuncia
os meios de comunicação ao afirmar que são atualmente dominados pelo mundo dos
grandes negócios, especialmente nos Estados Unidos, e que seu conteúdo é
devidamente censurado.
Ecologizar a comunicação significa mais do que criar editorias
de meio ambiente na mídia. Significa introduzir em cada uma das
editorias – de política nacional ou externa, economia, cultura, cidades,
ciência e tecnologia, assuntos locais, além de esportes, agropecuária,
indústria e comércio, negócios, finanças etc. – o toque ecológico. Esse tema não pode ser segregado nas páginas, cadernos ou
programas de meio ambiente, mas precisa permear cada uma e todas as áreas da
comunicação, para que seja eficaz como instrumento de mudança cultural e para
que complemente as demais formas de aprendizagem formal e informal.
Para ecologizar a comunicação, recomenda-se:
•.
Capacitar e formar os jornalistas, assessores de imprensa
de órgãos públicos e de empresas, os editores e toda a cadeia de profissionais
que cuidam da comunicação nos temas relacionados à sustentabilidade –
ambientais, hídricos, ecológicos e climáticos; entender as questões de forma
integral e ir além dos enfoques pontuais sobre temas específicos. O editor ou o
jornalista bem preparado e capacitado profissionalmente para absorver a
informação e expressá-la pode melhorar o nível de cobertura da imprensa sobre
temas ambientais, e assim contribuir para a educação e as mudanças de valores e
de ação prática. Nesse aspecto, o aprimoramento da formação
cultural e dos conhecimentos técnicos e valores éticos do jornalista nas
escolas de comunicação e fora delas é essencial para melhorar o nível de
cobertura sobre a variedade de temas relacionados com as questões ecológicas.
•.
Romper e desmistificar a linguagem e o jargão técnico,
traduzindo as questões em termos que um cidadão comum possa entender. O
jornalismo científico contribui para a formação da consciência ecológica, ao
ligar a ciência moderna e o cidadão comum, de modo a transformar conhecimentos
científicos em linguagem acessível, ajudando a metabolizar, na sociedade,
valores ecologizados. Ao divulgar temas emergentes, tem função
proativa na mudança de mentalidades e valores.
. Matérias opinativas
ou de divulgação científica tornam-se fontes de referência para o leitor
carente de informações atualizadas e auxiliam na compreensão das mudanças.
•
Despartidarizar os temas ecológicos e
colocá-los acima do patamar de interesses políticos e eleitorais de curto prazo,
e tratá-los como política pública com visão de longo prazo; evitar contaminar o
tema para conferir-lhe credibilidade.
•.
Usar a comunicação como ferramenta de
educação – educomunicação e ecopedagogia. Ela
cumpre finalidades educativas ao colaborar para a expansão da consciência ecológica;
tornar os cidadãos conscientes de sua unidade com o meio do qual tiram seu
sustento; aguçar a percepção ambiental, por meio da educação dos sentidos;
influir sobre hábitos, comportamentos e estimular ações de respeito ao meio
ambiente; explicitar os impactos que o estilo da vida e os hábitos de consumo
exercem sobre os ecossistemas naturais.
•.
Alimentar com informação e conceitos os
jornalistas para abordarem com competência os temas ecológicos. Usar o fluxo de
informações como o fluxo de água, de maneira a evitar enxurradas de releases
que inundam e assoreiam. Distribuir informações como uma boa chuva
e ter um reservatório para os períodos de seca.
•.
Divulgar boas práticas. A promoção e a divulgação de estudos de caso e de boas práticas
de cidades sustentáveis, cidades saudáveis, ecovilas, permacultura, ecodesign
são instrumentos poderosos para influir na consciência social e no aprendizado
coletivo.
•.
Usar a internet como importante veículo para
divulgar e discutir as questões ecológicas.
A ampliação da função de serviço da imprensa, com as inserções
de serviço público, tem importante papel educativo. Bem utilizadas elas contribuem para a criação de hábitos
ecologicamente adequados.
Os veículos de comunicação constituem concessões do poder
público. O cidadão pode reivindicar maior intensidade e quantidade de inserções
de serviço ambiental, previamente regulamentadas e que tenham alto retorno
educacional; e realizar uma avaliação histórica abrangente sobre o desempenho
da mídia na formação da consciência ecológica e sobre seu real papel de
ecoalfabetização.
A poluição cultural e informativa precisa ser reduzida e
informação de melhor qualidade precisa estar disponível para embasar a tomada
de decisões e facilitar a participação consciente. A busca da sensação com motivação
comercial frequentemente distorce e prejudica a qualidade da informação
veiculada pela empresa jornalística. Da mesma
forma, é importante que transcenda o enfoque denunciador.
Uma sociedade civil ativa é capaz de mobilizar a imprensa e a
opinião pública, com potencial para compelir os governos a investir na gestão
ambiental, corrigir e prevenir a ocorrência de novos problemas.
(*) autor de Ecologizar, de Tesouros da Índia e de Meio
Ambiente & Evolução Humana. WWW.ecologizar.com.br
(**) Versão original deste texto integra o livro Ecologizar –
volume 3- instrumentos para a ação. 4ª edição, Editora Universa, 2009.
[1]O autor nota que o capitalismo global opera redes eletrônicas
– fluxos de financiamento e de informação, enquanto o projeto ecológico atua
por meio de redes ecológicas e seus fluxos de matéria e energia.
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