sexta-feira, 12 de agosto de 2016

A era noológica



A história da Terra pode ser representada como uma espiral de crescente complexidade, da matéria, para a vida e para a consciência. Durante bilhões de anos predominou a matéria; durante milhões de anos a vida. Atualmente emerge a consciência e suas múltiplas manifestações na ciência, na tecnologia, na cultura, na vida social. Uma consciência capaz de aprofundar o autoconhecimento e de refletir sobre si mesma, sobre a vida e a matéria.
Representação gráfica da história da Terra  como uma espiral. 

 Estamos no estágio terminal da era cenozoica, a era dos mamíferos. Cada era geológica pela qual passou o planeta é subdividida em períodos e épocas. A época mais recente, o holoceno, cede lugar à época antropocena, a dos humanos, assim chamada devido à relevância dos impactos exercidos por nossa espécie e das  marcas que deixa sobre o planeta.
Estamos em transição para qual era na evolução, a partir da atual aceleração? Na visão do biólogo de Harvard, Edward O. Wilson (1998), caminhamos ruma à Era Eremozoica, a era da solidão, na qual o ser humano, tendo dizimado grande parte das demais espécies, viverá em um ambiente biologicamente empobrecido.  Espécies continuarão a ser extintas, tornando o Homo sapiens sapiens cada vez mais um ermitão e um biocida. A imagem de astronautas, poucos indivíduos distantes no espaço cósmico e da possível vida em outros corpos celestes induziu a se pensar no cenário da Era cosmozoica na qual a vida humana e de outros seres espalha-se no cosmos. As viagens espaciais, com a construção de estações orbitando em torno da Terra, a transmigração e a possivel colonização de Marte, são aplicações dessa visão cosmozoica.
Ciência e tecnologia são centrais no cenário da Era Tecnozoica, vislumbrado por Thomas Berry (1999). O ser humano, tendo se apropriado dos recursos da geodiversidade (minerais), dos vegetais e animais (a biodiversidade), processa-os industrialmente e transforma-os em objetos, coisas, máquinas (a coisadiversidade), e ao findar sua vida útil, nos resíduos, parte deles recicláveis e reaproveitáveis.
O cenário da Era Ecozoica foi proposto por Thomas Berry e Brian Swimme em seu livro sobre a História do Universo, lançado em 1992, ano da Conferência do Rio. Eles propuseram que nosso papel e o de nossos filhos é alinhar nossa vida pessoal com a grande obra de gerenciar uma árdua transição. “Todos nós temos nosso trabalho particular. Temos uma variedade de ocupações. Mas além do trabalho que desempenhamos e da vida que levamos, temos uma Grande Obra na qual todos estamos envolvidos e ninguém está isento: é a obra de deixar uma era cenozóica terminal e ingressar na nova Era Ecozoica na história do Planeta Terra. Esta é a Grande Obra” (Thomas Berry (1999, p. 7).  Essa tarefa implica fortalecer relações ecológicas harmônicas intra-específicas (sociais, políticas, econômicas) e reduzir a importância de relações desarmônicas com o ambiente que nos nutre e com as demais espécies
Há cenários que enfatizam o papel da consciência (noos, logos) mais do que o da vida animal (zoo). Nos anos 1970, Daniel Bell, de Harvard, previu uma era do conhecimento, que denominou Psicozoica, a era em que predomina o psiquismo humano. O grande sábio indiano Sri Aurobindo há um século antevia o advento da era subjetiva em que a psique, os pensamentos, sentimentos e emoções humanos cada vez mais influenciam  o mundo exterior.
A era noológica e as eras  zoicas

A época antropocena pode ser o estágio inicial de transição para uma era da consciência, diferente das que as precederam, as eras da vida. Podemos estar no umbral da era noológica da evolução da história na Terra. A esfera da consciência é a noosfera, conceito que surgiu num seminário dado pelo cientista russo, geólogo Vladimir Vernadsky em Paris. Ele tinha como alunos o filósofo e matemático Édouard Le Roy e o padre, teólogo, filósofo e paleontólogo Pierre Teilhard de Chardin que divulgou o conceito de noosfera em seu livro O fenômeno humano: “É verdadeiramente uma camada nova, a “camada pensante”, exatamente tão extensiva, mas muito mais coerente ainda, como veremos, do que todas as camadas precedentes, que, após ter germinado no Terciário declinante, se expande desde então por cima do mundo das Plantas e dos Animais: fora e acima da Biosfera, uma Noosfera.” (TEILHARD DE CHARDIN, 1966, pg.189). A raiz grega da palavra, noos, significa o espírito e a consciência intuitiva. Refere-se à imaginação, ao subjetivo, ao todo, ao pensamento flexível e complexo. Essa era da evolução se baseia na acelerada evolução da consciência humana e não mais nos lentos processos da evolução biológica. Nessa era, explode a noodiversidade. Na era noológica, a vida passa a ser governada pela consciência ecológica, que compreende sermos parte integrante de um organismo vivo e consciente; e entende que da saúde desse organismo depende nossa saúde e sobrevivência. Nela, os seres humanos vivem em um relacionamento mutuamente reforçador com a comunidade maior dos sistemas vivos. A obra de construir essa era requer mudanças em todos os aspectos da sociedade humana. O cenário da Era Noológica exige consciência e ação na direção de uma evolução consciente e generosamente projetada e construída.

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