Enquanto as questões
ambientais se concentravam na atenção para com os vegetais, árvores, parques, a
elas se associou a cor verde:
economia verde, partido verde, empregos verdes, tecnologias verdes,
combustíveis verdes, energia verde, alimento verde; marketing verde. Ocorre,
entretanto, que há agendas ambientais com várias cores: a agenda azul cuida das
águas; a marrom combate a poluição ambiental; a verde trata da biodiversidade,
das florestas, das unidades de conservação; a vermelha focaliza as questões
socioambientais e a agenda branca aborda os aspectos institucionais da gestão
ambiental. Uma variação disso foi
formulada por Cristovam Buarque que, em artigo intitulado Economia Colorida (O Globo, 16-7-2011), observa que “A "economia
verde" começou a ser aceita, mas ela não representa a metáfora certa. Pelo
menos cinco cores são necessárias para definir a economia do futuro: o verde da
sustentabilidade ambiental; o vermelho da justiça social; o branco de uma
economia produtiva para a paz; o amarelo da criação de bens de alta tecnologia;
e o azul da economia comprometida mais com o bem-estar do que com a produção e
a renda.” Reduzir o meio ambiente e a economia à cor verde é empobrecer
os conceitos e as múltiplas possibilidades de ação e eles associados.[1]
O adjetivo sustentável hoje se
aplica a tudo – desenvolvimento sustentável, economia sustentável, consumo
sustentável, alimento sustentável, crescimento
sustentável, planeta sustentável, mundo sustentável, agricultura sustentável,
arquitetura e construção sustentáveis, turismo sustentável, propaganda
sustentável; design, embalagem, mobilidade, sociedade, cidade, aldeia, empreendimento
sustentáveis; idéia, visão, projeto, futuro, conversas sustentáveis. No Google
há mais de cinco milhões de entradas para essa palavra; em inglês há mais de 60
milhões para sustainable e 30 milhões
para sustainability. Aplicado a
qualquer coisa, torna-se veículo de confusão e pouco esclarece. O
desenvolvimento sustentável (conceito que se disseminou a partir do relatório Bruntland
em 1987) não equivale ao ecodesenvolvimento (usado na conferência de Estocolmo
em 1972). O prefixo eco, presente no
ecodesenvolvimento, se perdeu à medida que se disseminava a noção de
sustentabilidade. O tripé clássico da
sustentabilidade (economicamente viável, socialmente justo e ambientalmente
prudente ou inofensivo) não abarca a riqueza e diversidade trazidas pela
dimensão ecológica.
O ecológico aos poucos se insere na consciência e na ação. A ecologia
extrapolou sua origem nas ciências biológicas e significa mais do que o estudo
de bichos e plantas em sua relação com o ambiente. As ciências ecológicas hoje
se desdobram em dezenas de campos, da ecologia econômica à social, da ecologia
energética à ecologia do ser. Ser ecologicamente consciente implica em ser economicamente
viável (ecologia econômica) e socialmente justo (ecologia social); além disso,
implica em ser energeticamente eficiente (ecologia energética), culturalmente
criativo (ecologia cultural), industrialmente convergente (ecologia
industrial), cosmicamente integrado (ecologia cósmica), pessoalmente saudável
(ecologia do ser, pessoal), comportamentalmente responsável (ecologia do
cotidiano, ecologia da ação), ética e espiritualmente elevado (ecologia
transpessoal), filosoficamente consistente (ecologia profunda). Essas dimensões
e outras mais estão presentes na consciência ecológica integral e tem
implicações práticas. Assim, por exemplo, a ecologia energética oferece
subsídios para compreender a importância de dietas alimentares vegetarianas. A
ecologia cósmica oferece elementos para compreender a história humana e a
história da terra no contexto da história do universo. E assim por diante. O
biogeógrafo canadense Pierre Dansereau propôs ser preciso voltar aos
fundamentos ecológicos e, com lucidez, clarear equívocos conceituais. Para
avançarmos teoricamente e termos um modelo mental orientador da ação prática, é
preciso resgatar a dimensão ecológica em seu significado integral.
Os verbos
Esverdear, tornar sustentável e
ecologizar são verbos que expressam mudanças nas maneiras de relacionamento do ser
humano com o ambiente.
Esverdear (to green) ou verdejar a economia, o consumo, os
partidos, os empregos, evoca uma postura
maquiadora, um tratamento superficial da questão, sem profundidade e
consistência; esse tipo de ação é necessária, porém não é suficiente diante da
magnitude da crise ambiental atual.
Tornar sustentável transmite uma conotação de permanência, de continuidade,
de perdurar no tempo, de dar sobrevida a algo se encontra em estado terminal,
afastando rupturas e mutações mais radicais.
Antigas civilizações, como a da India, por exemplo, souberam se sustentar por milhares
de anos e preservar tradições com fundamentos ecológicos, ao mesmo tempo em que
se adaptavam à modernização.
Ecologizar é aplicar os conhecimentos das ciências ecológicas e a
sabedoria da consciência ecológica às ações humanas. O uso desse verbo se
iniciou de forma tímida e envergonhada, entre aspas. No livro O
Verde é negócio, Hans Jöhr mencionava a “ecologização” da empresa,
do escritório, da fábrica, do processo, do comércio internacional. À medida que
nos ecoalfabetizarmos e superarmos nossa ignorância sobre o que é são as
ciências ecológicas, esse verbo fecundo e includente torna-se mais
compreensível e útil nas ações práticas.
Para além de esverdear/verdejar ou de tornar
sustentável, o verbo ecologizar
expressa um modo de pensamento e de ação prática essencial no atual contexto de
crise climática e ambiental e de megacrise
da evolução.
[1] Ken Wilber é
um dos grandes estudiosos da consciência e de seus estágios (Uma teoria de
tudo, pg. 126). Ele observa que “O meme verde comandou a produção intelectual
acadêmica, a elite cultural e a maior parte dos políticos liberais durante as
últimas três décadas, mas está agora sendo desafiado por todos os lados
(questiona-se hoje suas contradições internas, sua agenda política falha, sua
filosofia do politicamente correto, seu complexo de superioridade num mundo
onde nada é considerado superior, o narcisismo e o niilismo do pos-modernismo
extremo, a marginalização agressiva das holarquias e, portanto, a falta de uma visão
integral.”
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