Três Pierres, de origem
na tradição francesa, com visão cósmica e pós-materialista, contribuíram para
que eu compreendesse de modo holístico e abrangente as questões da consciência:
Pierre Teilhard de Chardin, Pierre Dansereau e Pierre Weil. As contribuições
desses três Pierres ajudam a compreender as transformações da matéria inanimada
para a vida, para a energia e para o conhecimento. Ajudam a compreender o papel
que exerce a espécie humana, com sua capacidade crescente de interferir sobre o
curso da evolução.
O padre, teólogo,
filósofo e paleontólogo Pierre Teilhard de Chardin divulgou em seu livro O fenômeno humano, o conceito de
noosfera. Escreve ele: “É verdadeiramente uma camada nova, a “camada pensante”,
exatamente tão extensiva, mas muito mais coerente ainda, como veremos, do que
todas as camadas precedentes, que, após ter germinado no Terciário declinante,
se expande desde então por cima do mundo das Plantas e dos Animais: fora e
acima da Biosfera, uma Noosfera. ” (TEILHARD DE CHARDIN, 1966, pg.189). Ela
engloba a cultura, ideias, espírito, linguagens, teorias, pensamentos, emoções,
sentimentos, informações, geradas ou captadas desde o início da vida. Esse
conceito surgiu num seminário dado pelo cientista russo, geólogo com interesse
múltiplos Vladimir Vernadsky em Paris, que tinha como dois alunos Eduard LeRoi
e Teilhard de Chardin. Trata-se de uma esfera de informação e consciência que
circunda o planeta, (além da atmosfera, da hidrosfera, da pirosfera etc,
esferas que se referem à matéria e da biosfera, que remete à vida). A Noosfera
(do grego noos, consciência) é a esfera da consciência intuitiva. Trata-se do
conjunto de energias mentais, pensamentos, informações, geradas ou captadas
desde o início da vida, e que constituem uma sutil camada que circunda o
planeta. As ações humanas têm poder crescente de influir sobre a matéria e a
vida, especialmente nesse período antropoceno da história, no qual a ação
humana impacta fortemente na dinâmica de transformações que acontecem no
planeta. A noosfera é o campo da consciência, que influi todos os demais campos
– a pirosfera, a litosfera, a hidrosfera, a atmosfera, a biosfera. O
autoconhecimento, a reflexão sobre a consciência humana, tornaram-se fundamentais
para orientar a energia dessa consciência e a força das palavras e da
comunicação humana em direção a ações amigáveis para o meio ambiente.
As ciências
naturais e biológicas estudam a matéria e a vida conforme as esferas em que se
situam: a pirosfera, barisfera, a litosfera, a hidrosfera, atmosfera, a
biosfera etc.
Pierre Dansereau, botânico e geógrafo,
incorporou a dimensão da consciência em sua obra e em seus diagramas. Trata-se da noosfera que, para ele, penetra
gradualmente muito além dos limites da biosfera e tem a força e o poder de
influir sobre ela. Isso é visivelmente percebido no período antropoceno da
história, no qual ideias, pensamentos, sentimentos, emoções humanas influenciam
em suas ações, que por sua vez produzem impactos sobre a biosfera, a hidrosfera
e todas as demais esferas da natureza.
Pierre Dansereau fala das inscapes, paisagens interiores, e com
isso ele facilita que incorporemos, além da matéria e da vida, também a
consciência do campo dos estudos da ecologia, com visão holística e
integradora.
A paisagem interior é
povoada por componentes subjetivos e vem sendo crescentemente estudada por
aqueles que se dedicam à consciência humana. Um desses componentes são as
necessidades humanas, fisiológicas, de segurança, de participação ou aceitação
social, de respeito, de auto realização, conforme visualizada na pirâmide de
Maslow. Tal lista de necessidades variadas tem correspondência com os chacras,
ou centros de energia, no corpo humano, estudados por Pierre Weil.
Realçando a importância
da percepção de cada indivíduo, Pierre Weil usava uma fórmula para expressar
que a vivência da realidade é função do estado de consciência. VR=f (EC). Essa
compreensão da diversidade de percepção e consciência humana abre para a
necessidade da comunicação e educação estarem baseadas no conhecimento dessas
diferenças subjetivas de percepção e consciência. Também facilita o trabalho
daqueles que precisam mediar conflitos de interesses em torno das questões
ambientais.
Dansereau mostra, num de
seus desenhos expressivos, que uma mesma paisagem é percebida de forma distinta
por pessoas de distintas formações e atividades: um caçador ressalta a fauna, o
minerador a sua geologia, o engenheiro, que nela enxerga a possibilidade de
aproveitamento de seus recursos naturais, e o poeta, a beleza que ali merece ser
contemplada. Cada indivíduo humano percebe o ambiente de modo pessoal e
intransferível, filtrado por seus condicionamentos linguísticos e culturais, de
educação e formação profissional, de sua história pessoal, de seus interesses,
motivações, desejos, vontades, caprichos, sonhos, fantasias, imagens mentais,
estímulos, impulsos, necessidade e demandas, crenças, emoções, sentimentos,
medos, pensamentos, instintos, valores, preconceitos.
Diferentes formações
influenciam a percepção de uma mesma paisagem
Pierre Dansereau mostra
que a ecologia integral pode ser praticada em várias escalas, na mandala em que
ele nos transporta para uma viagem, do pequeno ao grande, do ser humano
interior até a família, a cidade, a região e o planeta. Ele coloca no centro desse
círculo o indivíduo, a pessoa interior, com seus valores éticos e humanos. Em
cada um desses âmbitos de atuação, ocorrem problemas ambientais específicos. Há
questões que devem ser tratadas na escala individual, outras na escala
regional, outras globalmente.
As diversas escalas de
percepção do ambiente e de ações ecológicas
Pierre Dansereau foi
pioneiro ao integrar as ciências cognitivas e todo o ambiente interior das
pessoas ao seu modelo integral do ambiente.
A cosmovisão de Pierre
Dansereau o aproxima de filosofias orientais e tradições includentes, como a do
hinduísmo, de tradições que valorizam a compaixão, como a do budismo e de
tradições que não desacoplam a espécie humana da natureza, mas que a
compreendem como parte integrante de um todo, enriquecida por sua consciência e
capacidade de refletir sobre si mesma.
Numa de suas viagens ao
Brasil, em 1991, Pierre Dansereau, palestrou na Cidade da Paz e em Belo
Horizonte, onde eu era secretário de Meio Ambiente. Era o contexto da Rio-92 e
havia grande efervescência sobre o tema. Quando fui ao Canadá, num encontro do
– International Council of Local Environmental Initiatives-ICLEI em Toronto,
Pierre Dansereau me convidou a estender a visita a Montreal. Estabelecemos
desde então uma grande afinidade eletiva e intelectual. Quando o presenteei com
o livro Ecologizar, ele escreveu um prefácio, que foi incorporado nas edições
posteriores do livro.
Esses Pierres com sua visão holística, transdisciplinar e integral me ensinaram
muito, especialmente nas questões ligadas às paisagens interiores, à ecologia
interior e à noosfera.
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