Maurício Andrés Ribeiro (*)
Governos, empresas, associações e
organizações da sociedade civil, igrejas e famílias são alguns dos tipos de
instituições por meio das quais se constroem, se praticam e se descontroem relações
políticas, econômicas e sociais.
Em sociedades modernas, com grandes
populações, os partidos políticos constituem um dos modos de agrupar os interesses
e organizar a vida política. Partidos podem agregar pessoas com ideários comuns,
dar sustentação política aos governos, além de articularem governos locais com os
estados e com o poder central.
As formas de organização partidária podem
variar de tempos em tempos e de país para país. Na China contemporânea, por
exemplo, o Partido Comunista é o único existente, caracterizando um regime mono ou unipartidário. O partido guia o
governo, todo cidadão que queira participar do governo precisa estar filiado a
ele e o acesso supõe a passagem por um rigoroso processo de seleção. Em alguns países, o bipartidarismo predomina, como nos Estados Unidos, com os democratas
e republicanos, e no Reino Unido, com os trabalhistas e conservadores.
No Brasil, a Constituição Federal dispõe que
“É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos,
resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa.
Em nosso País, os partidos precisam ter caráter nacional,
estão proibidos de receber recursos financeiros de entidades ou governos
estrangeiros ou que a estes se subordinem, devem prestar
contas à Justiça Eleitoral e ter funcionamento parlamentar de
acordo com a lei. A Constituição
Federal assegura aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura
interna, organização e funcionamento e para adotar os critérios de escolha e o
regime de suas coligações eleitorais, sem obrigatoriedade de vinculação entre
as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal. Seus
estatutos devem estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária. Os
partidos políticos têm direito a recursos financeiros oriundos do Fundo Partidário
e acesso gratuito ao rádio e à televisão, na forma da lei.
O parágrafo único do artigo 1º da Constituição Federal de 1988 estabelece que “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou
diretamente, nos termos desta Constituição.” A Carta Magna prevê,
portanto, que os partidos são canais para se
chegar ao poder e aos governos e,
também, que o exercício direto do poder prescinde de representantes eleitos
filiados a partidos políticos.
Quanto à importância relativa e ao papel dos
partidos, há uma diversidade de propostas, desde as anti-partidárias, às apartidárias, passando ainda pelas transpartidárias.
Nas manifestações de rua que ocorreram no mundo e no Brasil, entre 2006 e
2013, as bandeiras de partidos políticos eram rechaçadas por vários manifestantes
com postura anti-partidária. Aqueles protestos explicitaram a crise da
representação política tanto em governos autoritários como na democracia
representativa e em muitos deles foi manifesta a queda de confiança nos
partidos.
Muitas pessoas não se sentem hoje representadas pelos candidatos eleitos
ou pelos partidos políticos existentes. Focados em interesses particularistas e
em carreiras políticas egocentradas e distantes do interesse público, os
partidos perdem a credibilidade para exercerem um papel mediador entre a sociedade
e o sistema político. Mostram-se esclerosados, impotentes para canalizar as demandas
sociais e entregar os serviços demandados ou para fazer jus às esperanças neles
depositadas, autocentrados que estão em manter ou multiplicar seu próprio poder
e o de seus dirigentes. Estes, por sua vez, manipulam os recursos do fundo
partidário, usando seus partidos apenas como legendas de aluguel ou para disputar
postos da máquina governamental dali retirando vantagens para si ou para seus
grupos de interesse.
Uma característica comum de organizações políticas e sociais, tais como
partidos políticos, clubes esportivos, igrejas, organizações civis, é a
presença do militante partidário, do ativista político ou ecológico, do
trabalhador voluntário. Eles doam tempo e talento por uma causa, por ideais e
propostas com as quais têm afinidades eletivas, assumem responsabilidades e
investem tempo livre em iniciativas em que acreditam. A ação voluntária é
movida pela adesão a uma crença ou ideal que pode ser o autointeresse, a defesa
da autoestima, o desejo de poder, a vontade de servir à comunidade, a busca da
verdade, ou outros. Em tais instituições é frequente que por detrás de uma
cortina de altos ideais existam bastidores de lutas pelo poder, por prestígio e
status, característicos da ação ego-orientada. Com frequência forma-se um grupo
dirigente, uma diretoria privilegiada, que passa a ter controle sobre as
decisões e que tende a se apropriar dos bônus e a servir-se do poder para o
autobenefício, socializando os ônus, geralmente por meio da exploração do
trabalho voluntário e da contribuição e ação dos simpatizantes e dos militantes.
Uma organização cujos dirigentes desfrutam de privilégios enquanto os
voluntários ficam com a carga de “carregar o piano” e de suportar os ônus tende
a desmotivar e a corroer a energia do voluntariado. A decepção com fatos desabonadores
também esfria o entusiasmo e pode provocar um desligamento da adesão à
instituição. A servidão voluntária deixa de existir e há como que uma
libertação. Para sustentar a motivação e o ativismo é fundamental a atitude dos
dirigentes, que precisam dar o exemplo e renunciar ao usufruto de vantagens
pessoais, status, benefícios materiais. Para se alimentar a adesão voluntária é
necessário que a mensagem, o pensamento e a palavra da organização que atrai o
voluntário, o militante e o ativista seduzam; que ele seja e permaneça, de
certa maneira, encantado pela missão que lhe é proposta e que se sustenta na
simpatia e na adesão à causa.
Na Índia, a maior
democracia do mundo, o político e ativista pela independência Jayaprakash
Narayan sonhou com uma democracia sem
partidos (partyless democracy). Trata-se de proposta apartidária de se
atuar politicamente, que não se
realizou na prática. Shree Shankar Sharan [1] escreveu: “Mahatma
Gandhi permaneceu um defensor do poder do povo, desde o
início, sem qualquer espaço para a concentração
de poder. Ele não dava espaço para a competição pelo poder entre os partidos.
Considerava que o princípio da maioria
nem sempre é o melhor. O princípio indígena da unanimidade deve ser adotado nas instituições sociais
locais e em outros níveis para promover a solidariedade. O princípio da maioria deve ser adotado somente se o princípio da unanimidade
falhar por duas vezes em entregar um resultado”. Foi também na Índia que Sri Aurobindo propôs a dharmacracia como o sistema politico mais
afinado com a alma asiática, pois o dharma
transcende a oposição entre direitos e deveres, que são conceitos ocidentais.
O psicólogo transpessoal
Pierre Weil, que trabalhou, no Brasil e em outros países por onde passou, por
uma cultura de paz, pela comunicação não violenta e por uma visão integral,
sonhava com o transpartidarismo
político para a transformação num
período de transição. O prefixo trans
significa ir além. O transpartidarismo político considera que temas vitais, por
sua importância, sejam tratados acima e além dos interesses partidários de
poder. Nos parlamentos, os partidos
formam coalizões ou coligações. Frentes partidárias se formam em torno de temas
de apelo geral tais como o meio ambiente, os direitos humanos. Temas ecológicos
vitais como o do clima ou da água demandam visão e iniciativas transpartidárias,
indo além dos interesses particularistas ou pessoais. Sendo abordados por
partidos, por outras instituições e por indivíduos a partir de uma perspectiva
que coloca em primeiro lugar a saúde ambiental e a saúde coletiva constroem-se
metas convergentes que podem levar ao benefício comum.
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