quinta-feira, 21 de novembro de 2019

A cultura indiana, do menosprezo à renascença


Maurício Andrés Ribeiro 

Prática de exercícios de yoga em escola em Delhi auxilia na concentração e no aprendizado. O soft power indiano em ação.
Durante  muitos séculos o subcontinente indiano foi invadido, colonizado e se transformou. As grandes navegações que buscavam um caminho marítimo para as Índias, as invasões mongóis e muçulmanas e a colonização pelos europeus impactaram as culturas e valores preexistentes.

A cultura indiana foi desprezada pelos colonizadores europeus e particularmente pelos ingleses.  O político Lorde Macaulay, que reformou o sistema educacional indiano durante a colonização,  afirmou que:  ”o conjunto inteiro da filosofia e literatura indianas  não valia uma única prateleira de uma boa biblioteca europeia.” E Winston Churchill disse que “ Eles (os indianos) são um povo bestial com uma religião bestial”. Falar e ensinar as línguas locais era punido e a língua inglesa era incentivada. Nos clubes dos colonizadores, indianos e cachorros  não entravam.

A partir do final do século XIX redescobriu-se o valor da sabedoria ancestral contida nos Vedas, as escrituras sagradas. Vivekananda no Congresso Mundial de religiões em Chicago em 1893 e os teosofistas (cuja sede mundial se instalou em Adyar - Chennai, no sul da índia) tiveram papel importante nessa revalorização. Sri Aurobindo escreveu sobre a renascença indiana e a força  de seus pensamentos e conceitos, que foram aplicados na política por Gandhi e pelos que alcançaram a independência da Índia em 1947.

Na segunda metade do século XX a influência da Índia se propagou no mundo por meio do yoga, da meditação, da literatura, da ciência, da medicina, da alimentação, do cinema, do poder suave da cultura (o soft power indiano).  Nos anos 60 os Beatles ali buscaram inspiração e a divulgaram; a Índia abrigou o Dalai Lama depois da invasão do Tibete pela China e dali os conhecimentos budistas se disseminaram pelo mundo.  Diversos gurus, uns mais e outros menos polêmicos e controversos, criaram comunidades nos Estados Unidos e na Europa.

O poeta e prêmio Nobel Rabindranath Tagore compreendia a importância de a Índia compartilhar sua experiência com o mundo: “Ao encontrar a solução para nosso problema, teremos ajudado a resolver também o problema do mundo. O que a Índia já foi, o mundo todo é agora. O mundo todo está-se tornando um único país por meio das facilidades científicas.”[1]

O grande laboratório social indiano experimentou modos de solucionar cada questão que ali se apresentou, recorrendo à sua riqueza imaterial. A independência política alcançada por meios não violentos é o resultado mais conhecido. O adensamento demográfico, a convivência entre  os diferentes, a relação com a natureza são questões enfrentadas pioneiramente na Índia há muito tempo. Vários problemas foram solucionados, outros ainda estão sendo processados com liberdade. No mundo que hoje passa por problemas similares recorre-se à sabedoria indiana para buscar respostas.

Na primeira parte do século XXI, a consciência sobre a emergência climática e sobre a atual crise na evolução busca em cosmovisões como a indiana inspirações para produzir respostas adequadas.

 



[1] TAGORE, Rabindranath. On Nationalism, p.59-60.

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