segunda-feira, 26 de setembro de 2022

Hidrodesign

O navegador Amir Klink navega solitário  pelos mares. No oceano de água salgada, cada gota é preciosa. Ele fala que, no projeto do barco, a torneira é acionada com o pé para não desperdiçar água.

Quando Brasília foi construída, nos anos 1960 e 1970, não havia preocupação com gastos e água  e energia. Nos apartamentos então construídos, havia aquecedor central e a água quente precisava fluir vários metros até chegar aos chuveiros. Para tomar um banho quente, era preciso deixar a torneira aberta durante vários minutos. Em prédios recentes, construídos no contexto  da crise energética, climática e hídrica, instalam-se aquecedores solares  que reduzem o consumo de energia elétrica e a torneira de água quente é ligada nessa tubulação. O consumo de água é reduzido.

Em situações de extrema escassez, cada gota vale ouro e soluções  engenhosas de design poupam a água valiosa. Em Israel e na Austrália  tais soluções são concebidas e aplicadas. Na Califórnia os cidadãos recebem incentivos econômicos do governo para substituírem torneiras e chuveiros que gastam muita água por outros que as economizam. Industrias são estimuladas a colocarem tais instalações no mercado e as normas e regulamentos induzem o seu uso.                  

Por outro lado, o hábito de ter à disposição a fartura de água não ajudou a criar uma cultura de economia. Em cidades coloniais antigas, como Ouro Preto, a água corria livre e gratuitamente em chafarizes públicos e muitas casas tinham bicas de água  corrente  gratuitas. Não havia torneiras ou registros de controle ou cobrança de tarifas pelo  uso.

A expressãodo berço ao túmulo"  designa o ciclo de vida dos produtos – objetos, edifícios ou cidades. Ela considera o ciclo da extração e exploração de recursos naturais, sua transformação, uso e descarte.  Entretanto,  esse ciclo é mais amplo e precisa incluir seu período pré-natal: antes de um bebê ir para o berço, há a concepção e meses de gestação. Objetos, casas ou cidades, também têm um período de concepção e projeto, antes que venham à luz.  Arquitetos, urbanistas, engenheiros, designers e todos aqueles que projetam objetos, edificações ou o ambiente construído têm papel crucial nessa fase pré-natal para encontrar soluções hidroeficientes e proporcionar economia de água. Os objetos são projetados e, antes de se materializarem, existem na mente e na imaginação de quem os projeta e concebe.

O  hidrodesign é uma estratégia proativa para reduzir o consumo excessivo e para reduzir perdas de água. É uma forma inteligente de proteger o meio ambiente, preventivamente, ao aproveitar ao máximo as águas, promover o uso de tecnologias limpas e processos de produção hidroeficientes. O hidrodesign leva em consideração os aspectos estéticos, funcionais, de segurança ou de ergonomia dos produtos, casas ou cidades, bem como a maneira com que cada um de seus componentes afeta a água. 
Por meio do desenho de produtos que leve em consideração todo o seu ciclo de vida, desde sua concepção, é possível conceber formas de reduzir o impacto sobre a natureza que fornece a água virtual que resultará naqueles produtos.  

Escolas e centros de pesquisa e inovação têm um papel relevante na formação  profissional. A importância do trabalho de arquitetos e designers nesse campo justifica que, nas universidades, sejam tratadas as questões da captação de água de chuva, de  como a água  se comporta no seu ciclo, quando escorre nas superfícies, se infiltra no solo, evapora e está presente na atmosfera.

Hidratar o design de produtos, de edifícios e de cidades é um modo responsável de atuar na sua concepção, podendo reduzir os impactos da atividade humana sobre as águas e tornar essa  relação mais amigável.

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