terça-feira, 14 de julho de 2015

Relações internacionais, uma abordagem ecológica.



Relações internacionais, uma abordagem ecológica.

Maurício Andrés Ribeiro

As relações internacionais podem ser enfocadas numa abordagem ecológica.
No mundo natural há relações ecológicas desarmônicas ou negativas; entre elas o parasitismo, a predação, o escravagismo. Há também relações harmônicas, tais como a simbiose, o comensalismo, o mutualismo.
Entre países e povos, há relações de colaboração, de competição, de opressão, de dependência. Países que derrotam militarmente ou que colonizam outros exercem o parasitismo (ao sugar seus recursos), a predação (ao tratá-los como presas), o escravagismo (ao subjugarem seus povos e os espoliarem). Há países e sociedades que canibalizam ou que parasitam outros, extraindo seus recursos. Na história do colonialismo há vários exemplos disso, como Portugal com o Brasil, a Inglaterra com a Índia etc.
Países que cooperam entre si exercem relações ecológicas harmônicas, tais como a simbiose ou o mutualismo (a capacidade de se complementarem e adaptarem mutuamente). Somam forças, formam coalizões e alianças militares ou econômicas, protegem-se contra terceiros e estrangeiros indesejados. Exemplo disso são os filtros e barreiras à migração de pessoas pobres, vistas como parasitas que vão disputar os recursos com os nativos de países ricos.
Dentro de países federativos há relações de competição (guerra fiscal, disputas por água e outras) entre os estados e relações de cooperação. Numa federação, parte da soberania de cada estado é cedida a um governo nacional.
O que viabiliza uma federação? Uma moeda comum é importante mas não suficiente.  Tampouco é a língua comum, (a Índia é uma federação com muitas línguas) ou uma religião comum (idem).  São fatores relevantes para cimentar uma federação a vontade política de permanecer juntos, superando diferenças; a percepção de que os benefícios de permanecer juntos são maiores do que os custos; a consciência de que os riscos de se permanecer juntos são menores do que os riscos se houver uma separação. (Riscos de guerras, de insegurança).
Separatismos quando regiões se sentem prejudicadas por participar de uma federação. (Catalunha e pais basco na Espanha, Quebec no Canada)
Cada federação tem sua história. Nos Estados Unidos da América, foi preciso uma guerra civil para manter a unidade. A Federação indiana foi alcançada depois de uma longa luta pela independência. Já a federação brasileira foi formada com estados herdeiros das províncias existentes no império e das capitanias hereditárias do Brasil colônia.
 A federação europeia ainda está em sua pré-história. Os fundadores da União Europeia tiveram uma visão e procuraram formas de evitar guerras entre os países daquele continente. Guerras que trouxeram ao Brasil meu bisavô Luiz Andrés, da Alsacia conflagrada entre a França e a Alemanha.
A Europa se unificou monetariamente, criou o euro, uma moeda comum e encontra-se ainda num estágio embrionário que poderá vir a tornar-se uma federação.
Uma perspectiva materialista, pragmática e utilitarista e sem ideais e valores mais intangíveis gera uma união corporativa, centrada em seus interesses internos e insensível ou egoísta, refrataria a demandas externas (por exemplo, as dificuldades de migrantes obterem guarida na Europa, morrendo afogados no mediterrâneo). A exclusão dos estrangeiros pobres, migrantes indesejados e ao mesmo tempo todas as facilidades para os estrangeiros ricos. Aos ricos, tudo; aos pobres, o mar. A Europa é pouco hospitaleira para os estrangeiros pobres e pratica uma hospitalidade seletiva que facilita a vida dos ricos e exclui ou abandona a própria sorte os pobres.
Numa relação predador-presa, o predador não pode exterminar a presa totalmente, pois isso se volta num efeito bumerangue contra si próprio. A derrota numa guerra militar ou numa guerra econômica supõe não o extermínio do adversário ou inimigo, mas a possibilidade de voltar a conviver com ele em novas bases.
Diante de crises como a atual crise grega, uma saída de futuro para a União europeia é evoluir para uma federação e deixar de ser a zona de uma moeda. Nesse ponto, pode aprender com outras federações, como a americana, a brasileira, a indiana, que não se chamam zona do dólar, do real ou da rupia.
Numa tal federação, todos os países, e não apenas a Grécia, cederiam parcela da soberania e adotariam uma união fiscal e bancaria, para além da união monetária. Quando as relações internacionais se reduzem a relações contábeis entre devedores e credores, há necessidade de expandir a abordagem e trata-las como relações ecológicas.
Mas para isso é preciso, mais do que banqueiros e políticos com seu pragmatismo de curto prazo. São necessários visionários, sonhadores, utopistas, com clareza para levar adiante uma união para que se torne uma federação. No contexto atual isso significa ter uma visão mundialista, para além das fronteiras continentais ou nacionais. Ter generosidade pra com os povos externos à blindagem egoísta que procura preservar e garantir privilégios conquistados a partir de parasitismo e predação do mundo colonizado.
Ir além de uma visão autocentrada eurocêntrica e ver o mundo de modo mais global. Isso falta e sobre pragmatismo e realismo míope.
Quando será que os cidadãos europeus vão demandar uma federação que vá além do atual estágio incompleto da União europeia com sua moeda única? Quando a Europa superar suas dificuldades e tornar-se uma federação mais um passo terá sido dado para se avançar em direção a uma federação planetária em que os valores da solidariedade, liberdade e igualdade sejam exercidos.
Há entre os países e povos relações ecológicas desarmônicas e negativas de parasitismo, predação e escravagismo que precisam dar lugar a relações ecológicas harmônicas de simbiose, comensalismo, cooperação.
Nessa dinâmica, é relevante a ação de líderes visionários capazes de colocar em prática ideias federalistas e mundialistas expostas por europeus como Kant, Teilhard de Chardin, Bertrand Russel, Norberto Bobbio, Plotino, de americanos como Charles Pinckley e Thomas Madison, de persas como Bahá'u'lláh, de indianos como Sri Aurobindo, Gandhi, Jawaharlal Nehru,  bem como do brasileiro Josué de Castro.




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