Relações internacionais, uma abordagem ecológica.
Maurício Andrés Ribeiro
As
relações internacionais podem ser enfocadas numa abordagem ecológica.
No
mundo natural há relações ecológicas desarmônicas ou negativas; entre elas o parasitismo,
a predação, o escravagismo. Há também relações harmônicas, tais como a
simbiose, o comensalismo, o mutualismo.
Entre
países e povos, há relações de colaboração, de competição, de opressão, de
dependência. Países que derrotam militarmente ou que colonizam outros exercem o
parasitismo (ao sugar seus recursos), a predação (ao tratá-los como presas), o escravagismo
(ao subjugarem seus povos e os espoliarem). Há países e sociedades que
canibalizam ou que parasitam outros, extraindo seus recursos. Na história do
colonialismo há vários exemplos disso, como Portugal com o Brasil, a Inglaterra
com a Índia etc.
Países
que cooperam entre si exercem relações ecológicas harmônicas, tais como a
simbiose ou o mutualismo (a capacidade de se complementarem e adaptarem
mutuamente). Somam forças, formam coalizões e alianças militares ou econômicas,
protegem-se contra terceiros e estrangeiros indesejados. Exemplo disso são os
filtros e barreiras à migração de pessoas pobres, vistas como parasitas que vão
disputar os recursos com os nativos de países ricos.
Dentro
de países federativos há relações de competição (guerra fiscal, disputas por
água e outras) entre os estados e relações de cooperação. Numa federação, parte
da soberania de cada estado é cedida a um governo nacional.
O
que viabiliza uma federação? Uma moeda comum é importante mas não
suficiente. Tampouco é a língua comum, (a
Índia é uma federação com muitas línguas) ou uma religião comum (idem). São fatores relevantes para cimentar uma federação
a vontade política de permanecer juntos, superando diferenças; a percepção de
que os benefícios de permanecer juntos são maiores do que os custos; a consciência
de que os riscos de se permanecer juntos são menores do que os riscos se houver
uma separação. (Riscos de guerras, de insegurança).
Separatismos
quando regiões se sentem prejudicadas por participar de uma federação. (Catalunha
e pais basco na Espanha, Quebec no Canada)
Cada
federação tem sua história. Nos Estados Unidos da América, foi preciso uma guerra
civil para manter a unidade. A Federação indiana foi alcançada depois de uma
longa luta pela independência. Já a federação brasileira foi formada com
estados herdeiros das províncias existentes no império e das capitanias
hereditárias do Brasil colônia.
A federação europeia ainda está em sua pré-história.
Os fundadores da União Europeia tiveram uma visão e procuraram formas de evitar
guerras entre os países daquele continente. Guerras que trouxeram ao Brasil meu
bisavô Luiz Andrés, da Alsacia conflagrada entre a França e a Alemanha.
A Europa
se unificou monetariamente, criou o euro, uma moeda comum e encontra-se ainda
num estágio embrionário que poderá vir a tornar-se uma federação.
Uma
perspectiva materialista, pragmática e utilitarista e sem ideais e valores mais
intangíveis gera uma união corporativa, centrada em seus interesses internos e
insensível ou egoísta, refrataria a demandas externas (por exemplo, as
dificuldades de migrantes obterem guarida na Europa, morrendo afogados no
mediterrâneo). A exclusão dos estrangeiros pobres, migrantes indesejados e ao
mesmo tempo todas as facilidades para os estrangeiros ricos. Aos ricos, tudo;
aos pobres, o mar. A Europa é pouco hospitaleira para os estrangeiros pobres e
pratica uma hospitalidade seletiva que facilita a vida dos ricos e exclui ou
abandona a própria sorte os pobres.
Numa relação predador-presa,
o predador não pode exterminar a presa totalmente, pois isso se volta num
efeito bumerangue contra si próprio. A derrota numa guerra militar ou numa
guerra econômica supõe não o extermínio do adversário ou inimigo, mas a
possibilidade de voltar a conviver com ele em novas bases.
Diante
de crises como a atual crise grega, uma saída de futuro para a União europeia é
evoluir para uma federação e deixar de ser a zona de uma moeda. Nesse ponto,
pode aprender com outras federações, como a americana, a brasileira, a indiana,
que não se chamam zona do dólar, do real ou da rupia.
Numa
tal federação, todos os países, e não
apenas a Grécia, cederiam parcela da soberania e adotariam uma união fiscal e
bancaria, para além da união monetária. Quando as relações internacionais se
reduzem a relações contábeis entre devedores e credores, há necessidade de
expandir a abordagem e trata-las como relações ecológicas.
Mas para isso é preciso, mais
do que banqueiros e políticos com seu pragmatismo de curto prazo. São necessários
visionários, sonhadores, utopistas, com clareza para levar adiante uma união
para que se torne uma federação. No contexto atual isso significa ter uma visão
mundialista, para além das fronteiras continentais ou nacionais. Ter
generosidade pra com os povos externos à blindagem egoísta que procura
preservar e garantir privilégios conquistados a partir de parasitismo e
predação do mundo colonizado.
Ir
além de uma visão autocentrada eurocêntrica e ver o mundo de modo mais global.
Isso falta e sobre pragmatismo e realismo míope.
Quando será que os cidadãos
europeus vão demandar uma federação que vá além do atual estágio incompleto da União
europeia com sua moeda única? Quando a Europa superar suas dificuldades e
tornar-se uma federação mais um passo terá sido dado para se avançar em direção
a uma federação planetária em que os valores da solidariedade, liberdade e
igualdade sejam exercidos.
Há
entre os países e povos relações ecológicas desarmônicas e negativas de
parasitismo, predação e escravagismo que precisam dar lugar a relações
ecológicas harmônicas de simbiose, comensalismo, cooperação.
Nessa
dinâmica, é relevante a ação de líderes visionários capazes de colocar em
prática ideias federalistas e mundialistas expostas por europeus como Kant,
Teilhard de Chardin, Bertrand Russel, Norberto Bobbio, Plotino, de americanos
como Charles Pinckley e Thomas Madison, de persas como Bahá'u'lláh, de indianos
como Sri Aurobindo, Gandhi, Jawaharlal Nehru,
bem como do brasileiro Josué de Castro.
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