Em visita a Hiroshima, em 1986,
nosso grupo de estudantes desejou plantar uma árvore no Parque da Paz, em
homenagem aos mortos pela bomba atômica no dia 6 de agosto de 1945.
Foi necessário pedir autorização na prefeitura, que determinou a espécie, o
local em que deveria ser plantada, forneceu a muda de tamanho adequado e as
ferramentas para o plantio. Pela primeira vez percebi que a gestão das árvores
demandava cuidado técnico e científico.
A adequada arborização urbana
e rodoviária exige conhecimentos de botânica, de engenharia florestal, de paisagismo, para
que cumpra suas funções com segurança e beleza. Na ausência desses
conhecimentos, ocorrem acidentes tais como a queda de árvores ou de galhos, com perdas de
vida e perdas materiais e pode-se gerar um sem número de outros conflitos e inconvenientes para os cidadãos.
Quando fui secretário de meio
ambiente em Belo Horizonte, MG, a maior demanda dos cidadãos era pela poda de
árvores em frente a suas casas. Os galhos invadiam as janelas, facilitavam
assaltos a residências, conflitavam com a fiação elétrica, as raízes rompiam
redes de água e esgoto e estouravam a pavimentação; as folhas entupiam as
calhas e causavam goteiras.
Em articulação com as
administrações regionais, realizamos o
cadastramento, poda e plantio programado de árvores nas vias urbanas. Montamos
um projeto, o Verde Vivo, com o objetivo de aprimorar os critérios e normas
técnicas para poda e plantio de árvores e promover a harmonia na convivência
entre árvores, pessoas e equipamentos urbanos. Foram cadastradas centenas de
milhares de árvores, o que incluía seu endereço, espécie, diâmetro, copa,
altura, condições do tronco, estado fitossanitário, sistema radicular, largura
do passeio e recuo do imóvel, presença de rede elétrica, período de floração e
de frutificação. Engenheiros florestais ou agrônomos definiam as espécies mais
adequadas para serem plantadas e evitavam aquelas que produziriam conflitos com
as condições locais. Empresas contratadas faziam o plantio e a poda. Uma
auditoria aferia se os tipos de podas recomendados eram os executados,
reduzindo a margem de irregularidades por parte das empresas prestadoras dos
serviços, que recebiam efetivamente o preço justo contratado. Campanhas de
comunicação na mídia e folhetos para os moradores proporcionaram o necessário
apoio e a simpatia da população e reduziram os índices de perdas por vandalismo
contra as mudas plantadas. Os galhos e folhas, resíduos da poda de árvores eram
doados a associações de ação social, que distribuíam a receita em obras
filantrópicas. Galhos finos e folhas resultantes da poda eram reutilizados
visando à produção de energia e de composto orgânico, usado na fertilização dos
próprios canteiros e jardins da cidade.
Na Praça da Liberdade restaurada
na ocasião, encontramos árvores inapropriadas, como sapucaias, plantadas com as
melhores intenções, mas com pouca avaliação dos seus impactos, pois crescem
demasiadamente, tornando-se logo impróprias para aqueles locais. A partir de
projetos de paisagismo aprovados no Conselho Municipal de Meio Ambiente, o Parque
Municipal foi remodelado, muitas árvores
foram eliminadas e substituídas por outras.
Sistematizamos o conhecimento
sobre os principais temas da gestão ambiental urbana numa série de Cadernos de
Meio Ambiente, então publicados por meio da Secretaria Municipal de Meio
Ambiente. Um deles abordava a arborização urbana, sua história e
funções, bem como a importância do planejamento. Também descrevia a
estrutura de uma árvore, o planejamento da produção de mudas, do plantio, as
espécies adequadas, a implantação de jardins e canteiros; o planejamento da
poda, as causas da redução da cobertura vegetal e os problemas de saúde das
árvores. Naquele caderno registramos o conhecimento sobre a arborização urbana
e contribuímos para a educação ambiental.
Quando me mudei para Brasília, me
impressionou positivamente a plenitude com que, nessa cidade, as árvores
crescem em amplos espaços, o que reduz a necessidade de podas. Os acidentes com
grandes árvores são raros, mas basta atropelar a periodicidade adequada e
descuidar dos preceitos dos bons cuidados para, em pouco tempo, o mato e a
galharia rebelde da vegetação urbana tomarem conta da cidade.
Historicamente no Brasil desmatador, árvore é desvalorizada como um estorvo: limpar o mato, campo limpo e campo sujo são expressões que denotam essa visão da árvore como sujeira, algo a ser removido. Arquitetura e urbanismo colonizados e que imitam países de clima temperado tampouco valorizam a vegetação. Poucos arquitetos e urbanistas conhecem e valorizam o paisagismo.
Há cidades com pouca vegetação
nas vias públicas, mas com quintais preciosos que merecem ser preservados.
Algumas cidades têm feito isso por meio de isenção de impostos municipais, que
incentivam os proprietários a preservarem as árvores.
A gestão ambiental é
gestão de conflitos de interesses e um dos conflitos frequentes ocorre entre
proprietários de terrenos que querem fazer empreendimentos imobiliários em terrenos com áreas verdes com argumentos de que há interesse social e
grupos ambientalistas que priorizam proteger a vegetação ali existente e criar parques de uso publico e coletivo. A
mediação de tais tipos de conflitos é parte integrante da gestão ambiental urbana. O aporte de conhecimentos técnicos pode ajudar a chegar a uma solução negociada, como ocorreu no parque da Mata das Borboletas, no Sion, onde as áreas no entorno de nascentes foram tecnicamente delimitadas, o que ajudou a definir a área que foi protegida.
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