terça-feira, 10 de maio de 2016

Ecologizando a economia II



Estudantes de ciências humanas da UnB me convidaram para dar uma aula no curso de Holismo que ali frequentam. Estavam interessados em questões econômicas e eu preparei uma apresentação sobre ecologia e economia.
Depois de uma hora de aula, houve diversas perguntas: como mediar conflitos em torno de acesso a recursos naturais?; o que é economia de baixo carbono?; a questão do antropoceno.
Esquematizei a relação entre o meio ambiente e o sistema econômico: recursos naturais são extraídos, transformados na produção industrial ou artesanal, consumidos; parte deles é reciclada no próprio sistema econômico e outra parte é devolvida ao ambiente na forma de rejeitos e degradação que alteram o estado geral do ambiente.  

Falei sobre como uma população de 7 bilhões de pessoas, com aspirações de consumo material crescentes, pressiona a capacidade de suporte de um planeta limitado. Expliquei sobre a pegada ecológica, o indicador de sustentabilidade que mede a pressão humana sobre a biosfera e que estima que, a continuar a tendência de crescimento econômico material, precisaremos de vários planetas. Essa pressão pode levar a aumento de conflitos associados ao acesso a recursos naturais, a crises, colapsos, catástrofes e desastres e a uma necessidade crescente de se desenvolver uma cultura de paz, para reduzir os riscos de violência.

Fiz referência a Jared Diamond, que em seu livro Colapso afirma que “fatores ecológicos, mais frequentemente que guerras ou política, determinam o sucesso e o fracasso dos povos. ” Ele encadeia problemas como mudanças climáticas, que produzem secas e sobrecargas no ambiente, levam ao esgotamento de recursos e da capacidade de suporte, o que por sua vez agrava tensões sociais, leva a empobrecimento econômico e induz a conflitos políticos e guerras. A guerra na Síria é um exemplo desse encadeamento de problemas ecológicos e climáticos, sociais, economicos, políticos e bélicos.
Como exemplos de colapsos, mencionei o Mar de Aral, que praticamente secou depois que o planejamento agrícola hidroalienado na região desviou as águas dos rios para usá-las na irrigação da cultura de algodão. Também mencionei a ilha de Páscoa, onde disputas por status social entre tribos que construíam as grandes estátuas, aceleraram a devastação florestal, a redução das fontes de água e levaram ao empobrecimento econômico e ao declínio social. Como exemplos positivos, falei do Japão, que resolveu no passado os seus problemas florestais e faz uso econômico das florestas sem destruí-las e preservando os serviços ambientais que elas prestam ao conter erosão e proteger mananciais de agua. Esse exemplo é citado por Diamond, que também menciona a ilha de Tikopia, no Pacífico Sul, onde a estratégia para garantir a capacidade de sustentação foi a mudança de hábitos alimentares, eliminando porcos que “atacavam e estragavam as plantações, competiam com os humanos por comida, eram um meio ineficaz de alimentar seres humanos (são necessários nove quilos de vegetais comestíveis para produzir apenas um quilo de porco) e acabaram se tornando uma comida de luxo para os chefes”. (Colapso, p.356)
Em seguida falei sobre o desastre de Mariana e a reação que despertou entre acionistas engajados na Austrália, que desejam que as empresas não produzam apenas lucros imediatos, mas que tenham responsabilidade ecológica e social. Falei sobre as companhias de seguros, o ramo das atividades econômicas diretamente envolvido nas consequências econômicas das catástrofes.
Coloquei a questão econômica num quadro de visão de longo prazo, evolucionária, escapando das questões conjunturais, que atraem muita atenção, mas que desviam o foco da consciência de que a economia é parte da ecologia e que a economia não pode continuar a fazer de conta de que não existem limites ecológicos na capacidade de suporte da terra. Citei Patrick Viveret que, no livro Reconsiderar a riqueza, publicado pela Universidade de Brasília, afirma que o cuidado com a casa menor – a oikos nomos da economia, precisa estar inserido no cuidado com a casa maior, a oikos logos da ecologia. Mencionei as várias crises que se superpõem sob o quadro geral da crise da evolução: a crise da evolução da espécie, a ecológica, a hídrica, a social, a cultural, a civilizatória, a da consciência, a energética, a econômica, a política bem como as crises subjetivas, pessoais, no relacionamento interpessoal.


Muito mais havia a falar sobre as motivações desejos e paixões humanas que impulsionam a economia, sobre o consumo e o consumismo. E também sobre as respostas que vêm se multiplicando, com a opção pela simplicidade voluntária; e a economia colaborativa e solidária, tanto na escala de uma família, em que os filhos cuidam da saúde e bem-estar de sua mãe, como também em escala planetária, supranacional, nos cuidados com a saúde da  mãe Terra. Mas o tempo da aula se esgotou e tais aspectos ficaram para ser abordados em outra ocasião.

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