terça-feira, 14 de julho de 2020

A pandemia acelerou mudanças na mobilidade urbana


Maurício Andrés Ribeiro 


Há uns dois meses a bateria de meu carro arriou. Ele ficou estacionado desde o início da quarentena por falta de uso. A bateria continuará arriada até que o carro volte a ser necessário. Por enquanto estou em home office. Deixei de consumir gasolina, pneus, de poluir o ar com gás carbônico, de contribuir para agravar o efeito estufa. Para o cálculo do PIB isso é negativo, mas a qualidade do ar na cidade agradece.
Na quarentena muitos carros ficaram parados no estacionamento local.
 
Com a quarentena, os serviços de delivery e entrega em casa foram mais demandados. Isso se traduziu na presença de motoboys e cicloboys na cidade.
Moto boys tiveram muito trabalho de entregas durante a quarentena.
 
No plano piloto em Brasília há comércio local – farmácias, padarias, supermercados, restaurantes onde se vai a pé. As  superquadras, que se tornaram parques urbanos pela sua intensa arborização, têm calçadas para pedestres e ciclovias. O urbanismo modernista de Brasília, tão criticado, mostra qualidades no tempo da pandemia.
No dia em que se flexibilizou a quarentena foi autorizada a abertura de algumas atividades e aumentou a circulação de automóveis. Não porque muita gente retornou ao trabalho, mas porque aqueles que voltaram preferiram se deslocar em automóveis, ao invés de usar o transporte público ou o metrô. Aumentou o uso do transporte solidário em companhia de pessoas que ofereçam menos riscos de contaminação.
Rodoviária de Brasília. Quem pode,  evita usar  o transporte coletivo em ônibus devido aos riscos de contágio.
Greves de motoristas de ônibus expressam que  essa se tornou uma profissão de risco, especialmente quando trafegam superlotados.
Durante a quarentena, há menor frequência de deslocamento de pessoas, por dia ou por semana; fez-se o escalonamento dos horários de atividades para evitar picos e congestionamentos no transporte urbano.
Na pós pandemia, os pedestres e as bicicletas deverão ser mais valorizados nas cidades e os automóveis cederão lugar a esses modos mais econômicos e ecológicos.
Na Índia, onde já existe uso intenso de veículos pequenos como motos, riquixás e autoriquixás,  e na Europa já existem planos para a pedestrianização, a caminhabilidade e o uso de bicicletas.
Nos EUA o transporte de massa público tornou-se menos atrativo, devido aos riscos de aglomeração e de contágio.
Na França, as eleições locais em várias cidades  foram vencidas por  verdes com programas de despoluição  do ar, de abrir espaços para bicicletas, reduzir espaços para carros e enfrentar as mudanças do clima. A cidade de 15 minutos, aquela em que se pode caminhar ou ir de bicicleta de casa para o trabalho, para as compras e o lazer, é uma proposta pós pandemia. Ela evita deslocamentos de longas distâncias, sempre arriscados e que consomem muita energia;  fortalece a localidade e seus recursos. É viável o uso de bicicletas em cidades densas e planas. Já em cidades menos densas, onde as distancias são longas, tal uso fica prejudicado, como acontece por exemplo em ciclovias subutilizadas em Brasília.
Na pandemia impulsionou-se a consciência de que transportar informação é mais econômico, ecológico e rápido do que transportar pessoas ou coisas. A pandemia  acelerou a consciência sobre o  digital, em que haverá mais transporte de informações via internet e mídias e redução do transporte de pessoas. Teletrabalho,  tele-educação, tele cultura, tele lazer tornam-se partes do cotidiano.
O transporte mais ecológico é o que se deixa de usar. Reduzir o uso de veículos poluentes é um modo de tornar mais leve a pegada ecológica dos cidadãos. Há alguns anos dei aulas de gestão ambiental urbana e  alunos faziam o exercício de calcular sua própria pegada ecológica. Em Brasília um peso substancial da pegada ecológica se deve aos deslocamentos em veículos individuais devido à baixa densidade da cidade, a sua concepção rodoviarista e voltada para facilitar o uso de automóveis.


Ecologizar a cidade parece ser uma onda da vez. Ecologizar a mobilidade e  os transportes é um componente essencial disso. Essa onda será avaliada em seus resultados quando os custos e benefícios de ações práticas forem sentidos pelos cidadãos e eleitores.

 

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