Maurício Andrés Ribeiro
A crise sanitária
representada pela pandemia despertou a consciência para a necessidade de
conservar a saúde integral, antes de apenas tratar corretivamente das doenças.
Desde sua origem a
pandemia decorre de uma questão de saúde ambiental: a destruição dos habitats
de animais silvestres que migram para as cidades ou passam a ter contato com os
humanos e disseminam vírus que alastram as doenças.
Animais consumidos
como alimentos (pangolins na China) ou confinados para produção de bens de
consumo na moda (como os visons na Dinamarca) podem transmitir doenças.
Nas cidades,
as doenças do adensamento denunciam as precárias condições em que vive
grande parte da população, em moradias sem ventilação, iluminação natural,
acesso a água tratada e a esgoto.
A saúde climática
está abalada e o planeta está febril com
o aquecimento global; a saúde ecológica está tensionada pelas atividades
humanas, o desmatamento, e pelos hábitos
de consumo como o carnivorismo; a saúde pública ameaçada pelas zoonoses
e pandemias, fruto de relacionamento desarmônico dos humanos com os animais; a
saúde urbana ameaçada pela falta de saneamento e pelas condições ambientais de
moradia precárias; a saúde física das pessoas afetada por todos esses males da
saúde ambiental; a saúde emocional abalada, fragilizando a saúde física; a
saúde mental prejudicada pelos traumas e tensões psicológicas.
Com a pandemia, a questão da saúde readquiriu importância no urbanismo. Evidenciou-se a importância da higiene pessoal e coletiva, da boa
qualidade do ar, da arquitetura clínica,
com insolação e ventilação natural, do
saneamento para evitar epidemias, do controle das zoonoses urbanas (escorpiões,
carrapatos, ratos e outros vetores de doenças).
As cidades compactas voltaram a ser um tema relevante
para os urbanistas, dada a relação que
existe entre as
densidades de população e a saúde humana e animal.
Um
efeito colateral da pandemia foi a necessidade de repensar a cidade e o urbanismo,
a percepção e perguntas sobre o seu futuro,
seu fracasso ou sucesso e de
prevenir as crises nas cidades. Evoluiu a consciência de que é possível desenhar melhor as cidades, melhorar a qualidade do ar e viver com um céu azul.
Ocorreu
um movimento para fora das grandes
cidades, vistas como locais de
aglomeração e a adensamento, e, portanto, de maior possibilidade de contágio
pelos vírus.
O
desenho urbano, o distanciamento físico nos locais que as pessoas frequentam, o
escalonamento no uso do tempo para evitar aglomerações foram algumas das formas
de atuar para reduzir os contágios.
O isolamento físico
transformou o modo como se
usam os espaços nas cidades. O comércio
e os serviços à distância com entregas em casa se intensificaram e
esvaziaram-se as lojas físicas. Espaços públicos em
frente ao comércio se tornaram uma extensão
dessas atividades. Ampliaram-se os espaços
entre mesas nos bares para evitar
contágios. Cabines transparentes foram
instaladas em torno de mesas de restaurantes em Amsterdam, para isolar
fisicamente as pessoas. Instalaram-se bolhas para a prática de yoga em cidade no Canadá. Academias de ginástica ocuparam espaços ao ar livre
em Brasília.
A visão sanitarista mostrou sua importância e evidenciaram-se
os custos que a sociedade paga em vidas e sobrecarga nos sistemas hospitalares
quando se descuida da saúde ambiental e urbanística.
Lavar as mãos com água e sabão; aplicar água sanitária nos
objetos para desinfetá-los; usar o vaso sanitário para recolher os dejetos
humanos; aplicar a engenharia sanitária para prover água, esgoto, drenagem,
gestão dos resíduos numa cidade; exercer a vigilância sanitária ao licenciar
vacinas, medicamentos e a produção de alimentos e para controlar a entrada de produtos animais ou vegetais
vivos nos países; proteger hábitats de animais silvestres para evitar que vírus
perigosos transbordem para contato com humanos; preservar a saúde ambiental do
planeta evitando sua febre medida pelo aquecimento global: esses são alguns dos
modos de sanitarização do ambiente.
Sanitarizar, no sentido da saúde integral,
inclui restaurar ecossistemas e ambientes naturais, mudar padrões de consumo
pouco saudáveis; preparar os ambientes
urbanos para dar condições de saúde física aos
habitantes e de saúde mental e emocional
para que tenham bem estar e qualidade de vida; prover moradias com
ventilação, iluminação, aeração adequadas; nas cidades, prover o saneamento
básico; no planeta, reduzir a emergência
climática por meio de uma reinvenção dos hábitos de consumo e de produção
humanos.
A sanitarização da
vida é uma meta associada com o controle da poluição e que pode se realizar do
global ao pessoal, do doméstico ao regional com benefícios para a saúde
ambiental e para a saúde humana. Por meio da sanitarização a ecologia ambiental
se encontra com a ecologia social, a saúde pública se beneficia da boa saúde
ambiental.
Ambientes doentes
adoecem as pessoas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário