Dispor de um projeto, meta ou mito
unificador é um requisito para orientar as energias humanas num rumo
convergente. Em alguns casos, projetos que buscam a unificação interna são
essencialmente destrutivos e voltados para a dominação de outros povos, tais como
as guerras. No sentido inverso apontam projetos de unificação política, como a
experiência da União Europeia, de mudar o relacionamento anteriormente baseado
em guerras ou em conquistas de colônias, para um relacionamento mais
colaborativo.
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Um projeto unificador pode ser a
construção de uma unidade política planetária. Edgar Morin em texto intitulado
“O grande projeto” observa que “A fecundidade histórica do Estado-Nação hoje se
esgotou. Os Estados-Nação são por si mesmos monstros paranoides incontroláveis,
ainda mais sob ameaças mútuas. Uma primeira superação dos Estados-Nação não
pode ser obtida senão por uma confederação que respeite as autonomias,
suprimindo a onipotência. ” “Mas nós ainda estamos na "idade do ferro
planetário": ainda que solidários, continuamos inimigos uns dos outros e a
explosão dos ódios de raça, de religião, de ideologia, provoca sempre guerras,
massacres, torturas, ódio e desprezo. ” (MORIN, 1988).
Um grande projeto político ainda
por se realizar é a constituição de uma Federação Planetária que suceda a atual
fase dos estados–nação e que avance em relação à Organização das Nações Unidas,
da mesma forma como essa avançou em relação à Liga das Nações. Caminhar em
direção a uma federação planetária ecologizada é um campo promissor, pois
considera a Terra como unidade política básica à qual devem estar submetidos os
interesses nacionais e regionais específicos. A ação em cada uma de suas partes
– nações, estados, sociedades, cidades, empresas, indivíduos – se insere em um
objetivo comum maior: a saúde do Planeta, da qual depende a saúde dos sistemas
vivos e a própria vida humana.
Sri Aurobindo enfatizou a
importância de se alcançar a unidade humana. No seu pensamento político e
social, Sri Aurobindo postulou que os Estados-Nação não constituem a última
etapa do desenvolvimento político humano e que a unidade econômica e
administrativa do planeta seria necessária. Em O ideal da unidade humana,
estudou os impérios e as nações, com sua formação e estágios de
desenvolvimento; antecipou a unificação da Europa; abordou as possibilidades de
um Império Mundial e as enormes dificuldades no caminho em direção à unidade
internacional; tratou também dos princípios para uma confederação livre de nações
e das condições necessárias para que ocorresse tal união mundial livre. A
unidade humana estende-se aos domínios militar, econômico e administrativo. Ela
respeita e valoriza a diversidade (AUROBINDO, 1970). A visão mundialista insere
as propostas para a política numa visão cosmopolita da unidade humana, para
além do patriotismo, dos interesses de clãs e tribos, étnicos ou
nacionais. Ela expressa a necessidade de
unidade política humana e de uma cosmovisão ampliada para compreender os tempos
em que vivemos. Insere a história humana no ciclo mais vasto da história
natural.
Promover a Consiliência,
proposta por E.O Wilson em seu livro que tem esse título, é uma forma de
resgatar a unidade. Duane Elgin propõe que se construam grandes narrativas inspiradoras
capazes de comunicar com clareza o sentido e o rumo da evolução, de forma a
produzir convergências de pensamentos e de ações. (ELGIN, 1993). Cosmovisões compartilhadas por milhões ou bilhões
de pessoas magnetizam muitos cérebros individuais num mesmo rumo e direção. Imaginar um projeto unificador, ter determinação
de mobilizar os recursos para colocá-lo em prática numa obra coletiva é um
pré-requisito para lidar com a crise ecológica e climática planetária.
Diante da perspectiva de colapso da
civilização humana e da percepção dos limites da capacidade de suporte do
planeta, a busca da segurança motiva uma construção coletiva de respostas. Na atualidade, uma meta unificadora diante das mudanças
climáticas é a de manter a temperatura do planeta com um aquecimento limitado,
para que eventos climáticos extremos não coloquem em risco a segurança da civilização
humana e a economia.
Thomas Berry, ao estudar a história
do universo, propõe uma grande obra coletiva de transitar dessa fase terminal
da era cenozoica (a era dos mamíferos) para uma era em que exercitemos nossa
capacidade de sustentar o mundo natural para que o mundo natural possa nos
sustentar, num processo de sustentabilidade recíproca.. Thomas Berry assim
definiu a grande obra unificadora: “Nosso próprio papel especial, que vamos
passar a nossos filhos, é o de gerenciar a árdua transição de uma era Cenozoica
terminal para a Era Ecozoica emergente, na qual os humanos estarão presentes no
planeta como membros participantes de uma comunidade Terrena compreensiva. Esse
é a nossa Grande Obra e a Obra de nossos filhos. ” (BERRY, 1999).
De nossa parte, preferimos
denominá-la a Era Noológica, a era da consciência, mas a
ideia é similar: realçar a importância de um mito ou meta unificadora que nos
mostre o rumo em direção ao qual caminhar.
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