quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Ecologizar a economia: do homo economicus ao homo ecologicus - o acionista engajado



Manifestação em Sydney - Austrália - em frente à sede da  BHP Billiton, sócia da Samarco em 2015.

O capitalista, o investidor, o acionista, o empreendedor, o engenheiro, o gestor corporativo, o CEO, o trabalhador, o contribuinte, o consumidor: eis alguns dos papéis desempenhados pelo homo economicus.
O investidor e o acionista se interessam por ter o maior lucro proveniente do capital que investem, o que implica reduzir custos. Os diretores, executivos e gestores corporativos são pressionados para produzir mais com menos, reduzindo os custos. Aqueles que conseguem tais resultados são valorizados e costumam receber bônus e boa remuneração pelo seu trabalho.
Em processos de gestão temerária, reduzir custos pode significar reduzir os cuidados com a segurança do trabalho, a segurança ambiental e operar com crescentes riscos. Internalizam-se os lucros, externalizam-se os custos.
A contabilidade econômica que externaliza custos e internaliza benefícios pode não ser sustentável e cada vez será menos confiável e benéfica para os investidores, quando tiverem que pagar pelos prejuízos sociais, culturais, econômicos e ambientais provocados por desastres. Quando levada a extremos para maximizar os lucros, a redução de custos imediatos implica aumento de prejuízos futuros, com os riscos de desastres. Quem se descuidou, foi negligente, incompetente, ganancioso e sem visão de longo prazo, paga pelos prejuízos sociais, culturais e ambientais que causou.
Uma das formas de ação direta usadas por ativistas ambientais é adquirir umas poucas ações de uma corporação para terem o direito de participar de assembleias de acionistas e de influenciar nas decisões corporativas, de dentro para fora.
O acionista engajado (concerned shareholder) não demanda das empresas em que investe apenas o máximo de lucro com o mínimo de custos. Ele usa as prerrogativas de acionista para questionar as prioridades e procedimentos corporativos gananciosos, predatórios e irresponsáveis. Demanda qualidade de vida e bons salários para os trabalhadores bem como segurança ambiental. Ele não deseja que a empresa se comporte espertamente, como uma delinquente juvenil, esperando ser fiscalizada de fora para dentro por governos ou órgãos reguladores; exige que ela se comporte como adulta responsável e tenha práticas e procedimentos ética e ecologicamente consistentes, não dependendo de tutela e de controle externo para ser intrinsecamente responsável e competente. Demanda que as empresas deixem de buscar lucros com imprudência e ganância ilimitada. Exige das empresas mais transparência na informação, eficiência, honestidade nas auditorias, responsabilidade, competência na engenharia, competência gerencial, responsabilidade ecológica.  O investidor engajado é, portanto, um forte agente indutor de transformações e de ecologização das empresas, para que deixem de promover destruição ambiental e de externalizar custos para as vizinhanças em que operam.
Esse tipo de acionista e investidor ainda é minoria diante da massa de investidores exclusivamente interessados nos lucros imediatos que a empresa lhes proporciona.  Mas mesmo estes têm buscado na justiça reparação pelos prejuizos que as empresas lhes causam quando omitem informações e os induzem a erro ao investirem. Quando a mudança de atitude do investidor ocorrer em larga escala, projetos e execução de engenharia serão bem feitos, auditorias ambientais serão holísticas e completas, a gestão da empresa será menos temerária e ecologicamente responsável e - aí sim! -, ela se tornará um investimento ético e ecológico.
Então, os interesses econômicos e ecológicos convergirão e o capital  daquela empresa terá se ecologizado. 
A ecologização do capital é uma grande tarefa. Sem ela, os demais esforços de proteção ambiental tornam-se pouco eficientes e com parcos resultados. É possível direcionar a força do capital, colocando-a a serviço da saúde ambiental, planetária e local e para tanto é relevante a ação dos acionistas conscientes, de dentro para fora das empresas.
A espécie humana, que já domesticou as forças da natureza, criou o dinheiro como força capaz de criar e de destruir. Tendo engenho e vontade, pode também ecologizar os investimentos e a aplicação do capital, colocando-os a serviço de sua evolução, da passagem do homo economicus para o homo ecologicus.

terça-feira, 17 de novembro de 2015

Ecologizar o capital: o investimento ético



Numa atividade econômica há múltiplas partes interessadas (stakeholders), conforme mostra a figura. Cada uma dessas partes tem interesses específicos e umas têm mais força do que outras para fazer prevalecer seus interesses. Os trabalhadores procuram maximizar seus salários e melhorar as condições e  a segurança de seu trabalho; as organizações comunitárias das vizinhanças procuram obter compensações e reduzir os  riscos e os danos que a atividade provoca no ambiente; os órgãos de governo licenciam e autorizam o funcionamento de empresas que geram empregos e renda, mas que também têm impactos negativos. Os investidores e acionistas têm interesse em maximizar o rendimento no capital que investem na empresa. Os dirigentes, presidentes, executivos e técnicos operacionalizam as ações da empresa, supervisionados pelos conselhos de administração.  
É desigual a força econômica, política e social de cada uma dessas partes interessadas. Com frequência prevalecem os interesses dos investidores ou acionistas, que orientam as ações operacionais das empresas.
Muitos investidores, grandes ou pequenos, escolhem onde investir baseados apenas nos critérios de rentabilidade e lucro do capital. Eles querem ter resultados financeiros e em geral estão alienados do modo como esse lucro é obtido.  A pressão dos acionistas incide sobre os diretores, gestores e executivos das empresas, que procuram atender suas demandas e responder às pressões por produtividade e lucro. Não por acaso as remunerações desses dirigentes dependem do resultado que produzam financeiramente. 
Em tal conjuntura, e no afã de agradar as expectativas dos acionistas, muitas vezes os executivos das empresas se empenham em reduzir custos. Ao faze-lo, consciente  ou inconscientemente, reduzem os controles e a prevenção ambiental, precarizam a segurança do trabalho, aumentando os graus de risco de que venha a ocorrer um desastre ou uma catástrofe ecológica ou social. Ao reduzir custos,  a gestão temerária costuma aumentar os riscos.
A gestão temerária pode resultar em desastres e catástrofes com alto custo econômico, social e ambiental e com sofrimento para a população e para o ambiente.
A catástrofe ou desastre é pedagógica para todos. No Brasil, desastres ecológicos despertam temporariamente para o tema; aprovam-se novas leis, aprimoram-se alguns procedimentos. Mas tudo tende a ser fogo de palha, pois em breve se esquece, a memória é curta. Outras tragédias aparecem e capturam mais uma vez a atenção pública. 
As tragédias também podem ser pedagógicas para os investidores ou acionistas, pois doem em seus bolsos, fazendo com que tenham prejuízos com seguros, indenizações, perda de valor das ações da empresa em que investiram.  
Por outro lado, também podem trazer-lhes o amadurecimento de escolherem como executivos das empresas pessoas que tenham visão estratégica de longo prazo e que não se contentem apenas com os lucros de curto prazo; executivos que evitem a gestão temerária que aumenta os riscos de desastres, com os prejuízos financeiros que os acompanham.
A gestão financeira de curto prazo frequentemente movimenta-se por critérios que camuflam os prejuízos coletivos no longo prazo. Quanto mais antiecológico, mais rentável um empreendimento pode ser, caso transfira seus ônus socioambientais para a sociedade.
Aí existe o divórcio entre os interesses coletivos de longo prazo e os interesses particularistas de curto prazo, sinais do descasamento entre ecologia e economia.
O investidor - o acionista de uma empresa, o detentor do capital –  atualmente é um ator frequentemente alienado das questões sociais e ambientais. O que o motiva é o retorno pelo seu investimento. Ele hoje é um agente que agrava aos problemas ecológicos mas que pode vir a ser um ator relevante para a ecologização da sociedade. Há um movimento de acionistas engajados (concerned shareholders) que procura transformar de dentro para fora das empresas as suas práticas, tornando-as social e ambientalmente mais responsáveis. As grandes corporações já foram descritas como instituições psicopatas, que se movem compulsivamente em função de seus interesses próprios, pouco lhes importando os interesses dos demais atores sociais ou do ambiente.(ver a esse respsito o documentário canadense de 2004,  The Corporation).
O investimento ético é uma boa opção escolhida por poupadores que aplicam suas economias em empresas, empreendimentos e projetos social e ambientalmente responsáveis. Algum volume de capitais tem migrado para os econegócios. Nos países em que existe forte poupança, os bancos e fundos éticos cresceram e se tornam mais rentáveis, à medida que a consciência ecológica dos investidores é fortalecida. Eles vetam a aplicação de recursos em empreendimentos destrutivos da vida humana, como a indústria bélica, pornográfica ou de tabaco. Mas ainda divergem em sua definição do que seja impacto ambiental, podendo investir, por exemplo em uma empresa mineradora ou de exploração petrolífera, que tem práticas agressivas ao meio ambiente.  
Ademais, o percentual de negócios ecologicamente responsáveis, proporcionalmente ao total das operações das empresas e instituições, é pouco e mal informado à sociedade, o que prejudica a credibilidade de suas iniciativas.
A vigilância dos investidores sobre empresas, bancos e fundos éticos é necessária para se evitar que gestores e banqueiros inescrupulosos ou que pratiquem ações contrárias aos princípios da ecologia integral se beneficiem da boa-fé e tirem vantagens dela.
A vigilância mútua entre as próprias instituições financeiras reduz os riscos de que se pratique uma concorrência desleal, que atraia simpatias e clientes com propagandas enganosas.
A adesão de bancos a princípios socioambientais, ainda que inicialmente não seja consistente com suas práticas, pode ser um passo para provocar neles um saudável contágio que leve à ecologização de seu comportamento. Para que isso ocorra, será essencial a vigilância da sociedade.

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

As redes sociais se tornaram um dos canais de acesso à noosfera



As novas tecnologias da comunicação abriram a possibilidade de acesso a um vasto mundo que se encontrava oculto no interior das mentes individuais. Quem se conecta às redes sociais tem acesso, por meio das palavras, vídeos e imagens ali postadas, a uma grande diversidade de ideias, sentimentos e emoções. A atração exercida por esse mundo se revela nos ambientes em que se vê cada indivíduo com seu celular ou computador pessoal, de corpo presente, mas cuja mente está ausente do ambiente imediato, atenta e concentrada nas interações e conexões do universo virtual em que navega. As redes se tornaram um espaço para a participação e trocas de informações, o que se faz de modo gentil, respeitoso e educado, ou grosseiro, truculento, brutal e conflitivo.  
As mensagens postadas revelam ampla diversidade de interesses, motivações, abordagens, crenças e valores. Há pessoas monotemáticas, fixadas num assunto específico e que martelam na mesma tecla, obsessivamente; outras têm um leque amplo de interesses e comentam as ideias alheias.  Uns se interessam por gatos, outros por sapatos, cinema e filmes, arquitetura, frases inspiradoras, humor e piadas, notícias de economia, ecologia, saúde, alimentação, denúncias, campanhas políticas e ideológicas, militância partidária, futebol. Alguns se autopromovem vaidosa e narcisicamente; outros observam ou simplesmente jogam e se divertem. Alguns se mostram sinceros e verdadeiros, outros se disfarçam e dissimulam, com suas personas, as máscaras com que se apresentam num espaço público. Existe ativismo e defesa de causas, tentativas de convencimento ou de conversão, debates, afetividade, autoajuda. As conexões e interações criam novas ideias e sinergicamente aceleram o aprendizado à distância. Os indivíduos aprendem a interagir, a se unir e organizar, a dialogar, a aprimorar sua sensibilidade e a enriquecer seu conhecimento. Comentam-se ideias, interativamente, em diálogo que pode contribuir para aprimorá-las.  Abrem-se possibilidades para a autorreflexão. A rede social abre oportunidades para praticar boa ação diária: veicular e circular ideias edificantes e inspiradoras, que expandem a consciência humana. Num sentido negativo, as redes abrem oportunidades para os intolerantes manifestarem a destrutividade e o ódio. Tornam-se arenas de luta em que se praticam insultos e provocações, ofensas e agressões e se revelam as dificuldades de lidar com ideias diferentes. Criam-se novas amizades e inimizades. Estabelecem-se novas relações, que se aquecem e esfriam. Cortam-se relações e bloqueiam-se conexões, ignorando o outro que incomoda ou chateia. Descobrem-se afinidades eletivas. Abrem o acesso a outros modelos mentais, opiniões, formas de pensar, cosmovisões. Para além de pensamentos, a Internet e as redes sociais facilitam o compartilhamento de sentimentos e emoções. Revelam-se antipatias e simpatias, atrações e aversões, admiração e repulsa. Inveja, ciúme, vaidade, raiva, orgulho, impaciência, violência na comunicação estão presentes nas mensagens. Por outro lado, amor, solidariedade, empatia, generosidade, afeto, ternura, também se expressam em outras postagens. Algumas são abertas, amplas e generosas, sutis, gentis, inteligentes, elegantes; outras revelam preconceitos, antipatias, ódios, medo. Essa conectividade intensa pode facilitar com que os indivíduos evoluam mental e emocionalmente. As redes sociais se tornaram um dos canais de acesso à noosfera.