segunda-feira, 28 de dezembro de 2020

A descarnivorização avança no Brasil

 

Maurício Andrés Ribeiro

O carnivorismo e os incêndios na Amazonia

Hamburguer vegetal em anúncios de página inteira na  mídia: um nicho de mercado disputado


No dia 26 de dezembro  de 2020 o jornal the New  York Times publicou  extensa matéria  sobre como o vegetarianismo tem crescido no Brasil nos últimos anos. A busca da saúde, por razões ecológicas e de compaixão para os animais são motivações que têm levado os brasileiros a fazerem essa opção alimentar. Num país em que a feijoada e o churrasco fazem  parte da cultura alimentar tradicional, é positiva essa disposição a mudar hábitos alimentares dos brasileiros e uma atitude responsável e consciente.

Nos últimos anos as redes sociais têm divulgado intensamente mensagens a favor de uma nova relação com os animais e denúncias sobre os impactos ambientais negativos do hábito alimentar carnivorista.  As redes sociais preenchem um vazio de informação  pois os grandes meios de comunicação  estão comprometidos com grandes anunciantes que são as indústrias alimentícias e da carne.

Muitas pessoas têm ligado os pontos e feito as conexões sobre como seus hábitos de vida contribuem para a devastação da Amazônia e o desmatamento.O consumo de carne em grande escala é prejudicial ao clima e à natureza. Quanto mais de descarnivorizar a sociedade, menor o impacto e a pressão sobre o ambiente. Cada quilo de carne exige muitos litros de água e vários hectares de terras seja para pastagens seja para produzir soja para alimentar os animais.A pegada de carbono, a pegada hídrica e a pegada ecológica tornam-se mais pesadas devido aos hábitos carnivoristas.

Há benefícios à  saúde ambiental e à economia de energia no vegetarianismo, que é muito menos impactante sobre o ambiente e o clima do que outros hábitos alimentares: as quantidades de água,  de insumos agrícolas e de área de terra necessária para alimentar vegetarianos são menores que as necessárias para alimentar carnívoros. Empresas de alta tecnologia, como Impossible foods pesquisam e colocam no mercado proteínas vegetais com baixo impacto climático e ambiental que viabilizam inclusive churrascos e feijoadas vegetarianas. Isso é relevante pois o vício de consumir carne está associado  ao prazer do paladar.

Mais recentemente grandes empresas passaram a produzir alimentos vegetarianos para atender à crescente demanda desse mercado, que aumenta à medida que a população toma consciência dos impactos ambientais negativos de seus hábitos alimentares.  A descarnivorização da sociedade é uma das formas mais efetivas de reduzir a pressão pelo desmatamento, os incêndios florestais, a caça e criação de animais silvestres para alimentos, a criação de animais em fazendas-fábricas e o frigoríficos, a pressão pela terra e pela água para produzir soja e carne e as mudanças no clima.   A pecuária industrializada em fazendas-fábricas com animais confinados  e tratados com crueldade e desrespeito com sistemas imunológicos deprimidos  (vacas, porcos, frangos)  produz as condições para que proliferem zoonoses ou doenças de origem animal.O vírus se espalha em frigoríficos cujas linhas de desmontagem de animais são locais úmidos e fechados, refrigerados e com congelamento. Elas se  tornaram locais de risco para a conservação dos vírus.

A pandemia se origina de relações estressadas com os animais e da devastação de seus habitats.

Sociedades carnivoristas produzem pandemias, a exemplo do coronavirus que se originou de destruição de habitats de animais silvestres e comercio de animais em mercados molhados sem higiene e favoráveis a contaminações e contágios.

Mercados em que se vendem animais silvestres, com precárias condições sanitárias são ambientes em que os vírus se  multiplicam e transmitem as zoonoses pelo contato próximo com os compradores. Em Pequim, um novo surto na China se originou num mercado que vende carne bovina e de cordeiros.   

A abolição dos animais silvestres do menu dos chineses deve ser saudada, evoluindo na linha do que fez a vizinha civilização indiana, há milênios, onde o vegetarianismo oferece lições para banir o carnivorismo que impulsiona a devastação florestal. Sociedades menos carnivoristas, como a indiana, reduzem  tais riscos. A difusão de receitas e ingredientes vegetarianos que produzem refeições saborosas facilita a mudança de hábitos alimentares e a renuncia ao carnivorismo. O vegetarianismo indiano mostra o caminho para uma dieta alimentar ecologizada no futuro.

Descarnivorizar a sociedade é um caminho para a prevenção de próximas pandemias.

domingo, 20 de dezembro de 2020

Psicoalfabetização

 

Precisamos de uma cartografia para as viagens dentro do ser

Maurício Andrés Ribeiro

Estamos  numa era em que cada vez importam mais as questões ligadas à subjetividade, à psique, ao universo interior dos seres humanos. Tornamo-nos uma espécie co-gestora da evolução. A mutação psicológica humana será determinante no rumo que ela tomará.

A pressão evolutiva é grande. Pandemias e a emergência climática colocam situações inusitadas diante das quais é preciso dar respostas. Além do estresse físico e dos riscos das perdas e da morte, ela trouxe um estresse psicológico.

Observa-se uma falta de rumo, um desnorteamento e uma desorientação diante da pandemia. Há decisões e posturas contraditórias dos executivos federal, estaduais, municipais, do judiciário, do legislativo, de profissionais da saúde. Há um certo caos e anarquia conceitual sobre qual a melhor postura para lidar com essa situação. Está-se aprendendo empiricamente, por tentativa e erro, em aproximações sucessivas. Governos deram sinalizações contraditórias, populações protestaram contra confinamentos impostos, ainda que a motivação deles seja preservar a saúde. É como se tivéssemos com um radar avariado, incapaz de nos apontar o norte.

Uma transformação da consciência humana supõe uma transformação da ciência da subjetividade. Aprofundar, complexificar e definir com maior clareza os aspectos subjetivos é uma necessidade para o mundo atual. Uma parte de minha geração teve um déficit de educação psicológica até a idade adulta. No dia a dia, erramos e aprendemos.

Grande parte de nós é psicoanalfabeta.  Não tem clareza sobre o que são valores humanos, virtudes humanas, qualidade humanas, confunde o que são emoções e sentimentos.

Assim como os mapas ajudaram os navegantes a traçar seus caminhos nas grandes navegações, um mapa  psicológico ajuda nas viagens interiores à consciência. Uma cartografia psicológica é necessária para viajar para dentro, para a introspecção, para desemaranhar aspectos enredados e orientar o rumo. Aprender a reconhecer sentimentos e  a causa que os gera é importante para que possamos alimentar as atitudes, as virtudes, as qualidades humanas necessárias para lidar com a pandemia e com as demais crises que virão  em  seguida. A partir do autoconhecimento podem-se desenvolver comportamentos adequados para os dias atuais e futuros. Um amplo projeto de psicoalfabetização desde a infância ajudaria as crianças e jovens a se autoconhecerem e a terem maior clareza sobre como se comportar na sociedade, diante de si e dos outros.

Diante da pandemia, comecei a mapear atitudes que podem ser positivas para lidar com ela e para prevenir as próximas que virão. Coletei sugestões de atitudes, oferecidas por amigos na rede social. Elaborei um glossário que se expandiu. Verifiquei que não havia clareza entre o que são atitudes, qualidades, virtudes, valores humanos.  Comecei a organizar e classificar  isso.  Descobri coleção de livros infantis voltados para o tema que  misturavam o que  era uma qualidade, uma atitude ou um valor.

Encontrei alguma indicação em religiões. Na tradição cristã as virtudes cardeais essenciais são a prudência, a justiça, a fortaleza e a temperança, complementadas pela fé, esperança e caridade. Castidade, generosidade, diligência, paciência e humildade completam esse conjunto de virtudes cristãs.

Entre as qualidades humanas encontra-se a amorosidade, a calma, a criatividade, a empatia,  a flexibilidade, a generosidade, a gratidão, a honestidade, a humildade, a paciência, a prudência, a resiliência, o respeito, a responsabilidade, a tolerância. Algumas dessas são consideradas valores humanos, tais como o respeito, a solidariedade, a tolerância, a humildade, a honestidade, a empatia. Várias outras, tais como a afetividade, o ânimo, a bondade, a compaixão, a consideração, a cooperação, a coragem, o cuidado, o desapego, o desprendimento, a frugalidade, a hospitalidade, a união se situam num território ambíguo podendo ser classificadas como atitudes, valores ou virtudes.

Há civilizações, como a indiana, cuja cosmovisão valorizou as questões da subjetividade: “Para cada conceito psicológico em inglês há quatro em grego e quarenta em sânscrito” observa A.K. Coomaraswamy[1].

Uma cartografia das virtudes, dos sentimentos, das emoções e dos valores, colocando cada um em seu devido lugar, ajudaria as pessoas  a se autoconhecerem e desse modo a contribuírem para sua própria saúde física, mental e emocional, e a desenvolverem as atitudes necessárias para propiciar o bem estar coletivo e a saúde do ambiente.

A pandemia trouxe uma oportunidade para cada um se psicoalfabetizar, para aprender o bê-á-bá da psique e dissolver a psicoalienação.

 



[1] Citado por RUSSELL, Peter. Acordando em Tempo – encontrando a paz interior em tempos de mudança acelerada. São Paulo: WHH, Antakarana, 2006.

 

O amor incondicional chegou à consciência de cientistas

 


O grafiteiro pergunta. 

O designer redesenha a bandeira.


Maurício Andrés Ribeiro

Amorosidade é uma atitude necessária para lidar com a pandemia. Num ambiente de doença e morte, o amor dos pais, filhos, avós, netos, primos conforta e alivia dores e aflições. As vibrações e  energia amorosas emitidas por amigos e conhecidos fortalecem os ânimos e a psique dos pacientes e de seus familiares. Se a presença física não é permitida, a presença psíquica e emocional supera distâncias.

Estamos todos enfrentando a mesma tempestade, como terrícolas ou terráqueos, a nossa identidade original. Estamos  em barcos diferentes e nesse momento não há lugar para invejar quem está num barco melhor ou desprezar os que estão em botes mais vulneráveis. A imunidade de cada um é de interesse de todos.

Diante de tragédias e da morte, o amor se explicita, como observou Patrick Viveret:  “No momento dos ataques a Nova York, as pessoas, ao perceber que iam morrer, não telefonaram para seus banqueiros, a fim de se informar sobre a situação de suas contas, mas para os que lhes eram próximos, para lhes falar de seu amor. Diante da morte, o que verdadeiramente constitui valor é o eixo do amor e do sentido, as únicas paixões capazes de enfrentar o desenlace final.”

O amor em suas várias formas é a energia positiva mais forte para melhorar o mundo. As religiões o valorizam ( Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo). A  Organização Brahma Kumaris publica frases inspiradoras sobre virtudes e valores, entre eles o amor: "O amor é uma das qualidades originais da alma humana. Porém, se misturou tanto com apego, possessividade e dependência, que tais hábitos profundamente arraigados foram sendo aceitos como normais. Como resultado, o ser humano tem dificuldade de perceber a verdadeira forma de amor puro, que é incondicional. A qualidade do amor significa: eu me importo, eu compartilho e, em especial, eu liberto. O verdadeiro amor espiritual nunca gera dependência onde os outros não podem ser eles mesmos."

Poetas o declamam. Luiz de Camões: Eu cantarei de amor tão docemente, Por uns termos em si tão concertados, Que dois mil acidentes namorados Faça sentir ao peito que não sente.”

Os artistas  se manifesam: o grafiteiro pergunta onde ele se encontra e o designer o insere na bandeira.

Filósofos reconhecem sua importância: Bertrand Russell  afirmou que o amor é sábio e o ódio é tolo. Edgar Morin fala da força do amor, de Eros, diante do Tanatos, da morte. Goethe observou que “A inveja e o ódio, mesmo se acompanhados pela inteligência, limitam o indivíduo à superfície daquilo que constitui o objeto da sua atenção. Mas, se a inteligência se irmana com a benevolência e com o amor, consegue penetrar em tudo o que nos homens e no mundo há de profundo.” Sri Aurobindo  escreveu que “É o dharma de todo homem ser livre na alma, levado a servir não por compulsão, mas pelo amor; ser igual em espírito, encontrando seu lugar na sociedade pela sua capacidade para servi-la; ser em relações harmônicas com seus irmãos humanos, ligado a eles por amor e serviço, não por laços de servidão ou relações de explorador e explorado.“ Sri Aurobindo também ressaltou a importância do amor para a comunicação não violenta e o mau uso da liberdade de expressão, um dos males que acontecem na sociedade moderna: "Somente o amor pode evitar o mau uso da liberdade."

 Yuval Harari, autor de Sapiens e de Homo Deus: estende a importância do amor à vida animal para evitar novas pandemias: “Bilhões de animais domesticados, como vacas e galinhas, são tratados pela indústria de carne, laticínios e ovos como máquinas, não como criaturas vivas capazes de sentir dor e angústia. E a ciência demonstra-nos que vacas e galinhas vivenciam um mundo complexo de emoções e sensações. Elas são capazes de sentir dor, medo e ansiedade, além de alegria, tranquilidade e amor. Ainda assim, os humanos ignoram completamente o seu sofrimento. "

Finalmente a importância do amor é reconhecida no âmbito da  ciência. Antonio Nobre ressalta a importância do amor incondicional e da colaboração para a evolução da vida e da renúncia ao egoísmo para evitar o crescimento canceroso de células que trazem a morte aos seres vivos que integram o organismo maior de Gaia, nosso planeta vivo.

Muito já se pensou e falou sobre o amor. Colocá-lo em  prática na vida cotidiana e nos tempos da pandemia é um exercício que alivia dores e sofrimentos.

domingo, 13 de dezembro de 2020

Adaptação necessária para a sobrevivência na onda da pandemia.

 

                                                  Adaptar-se à onda e saber surfar nela.

Maurício Andrés Ribeiro

 Em poucos meses o coronavirus impôs  adaptações que incluíram adotar novos estilos de vida, mudar  rotinas, teleatividades, aprender a usar tecnologias digitais,  afastar-se fisicamente dos demais para não ser contagiado, passar a adotar hábitos de higiene mais frequentes, usar máscaras como filtros para se proteger. A pandemia exigiu grande capacidade de adaptação da humanidade.

A capacidade de adaptação é vital para a sobrevivência de um  ser vivo no seu ambiente. Ela exige compreender as condições do contexto e encontrar a melhor maneira de evitar os riscos presentes no ambiente.

As mudanças ambientais exigem adaptações. As espécies que não se adaptam tendem a se extinguir ou a sofrer perdas populacionais. Observou o físico e jornalista Flávio de Carvalho Serpa[1] que “Sobrevive o mais adaptado. A natureza não distingue entre o bem e o mal. A humanidade é a única que tem a ética e honestidade como fator seletivo, o que é bom.” A ética é constituída pelos princípios que regem os costumes e hábitos e propiciam a arte e os benefícios da convivência.

Para se adaptar é preciso estar alerta, atento às instabilidades,  às rápidas variações do  dia a dia e ajustar sua rotina ao contexto do momento. Um surfista  hábil se movimenta conforme a onda e todas  as variações que ela oferece. Se ele vacila, pode se machucar ou coloca em risco a própria vida. A grande onda  da pandemia exigiu a habilidade de  um bom surfista.

Na adaptação se vive cada momento e cada dia, e se renuncia a planos de médio e longo prazos pois o futuro torna-se imprevisível. Muita gente precisou reprogramar viagens ao avaliar que os riscos associados a elas eram maiores do que os benefícios e precisou ter paciência e esperar a vinda de uma vacina ou que passasse o pico de contaminações. A adaptação exige criatividade para formular respostas inovadoras aos desafios. Exige informações e dados para monitorar na sintonia fina, por exemplo, como a pandemia se espalha e desenhar as táticas adequadas para lidar com ela.   

Para se adaptar é necessário compreender as mudanças e aceitar que elas são inevitáveis. Uma certa resignação é pré-requisito para se dispor a mudar. Nesse ponto os brasileiros com o seu jeitinho e os indianos com o seu jugaad estão bem equipados comportamentalmente para a adaptação, que exige capacidade de improvisação, aceitando o inesperado como parte da vida.

Visões controversas nas narrativas sobre a realidade propõem maneiras distintas de lidar com ela. Nesta pandemia governos propuseram ações que iam de um lockdown ou fechamento completo e radical, e outros não impuseram qualquer restrição e deixaram a critério dos indivíduos tomar a decisão que lhes parecesse mais correta. Por ser um evento inesperado, houve experimentações, tentativas e erros e aprendizagem com aproximações sucessivas no modo de lidar com ela.

Há aqueles que negam, resistem a se dobrar aos fatos e a aceitar que mudanças são necessárias, seja por ignorância, por conservadorismo e horror às mudanças ou por incapacidade de ter respostas a dar às novas situações.

Para reduzir ansiedade e estresse e reduzir os custos das demandas extra que deverão atender, planos de saúde  e empresas de seguros divulgaram dicas para a adaptação do modo de vida durante a pandemia.

O homem é produto do meio, que por sua vez é produto do homem. O ser humano, dentro de certos limites,  tem a capacidade de influir sobre o ambiente e de moldá-lo conforme suas necessidades. As paisagens produzidas ou influenciadas pelo ser humano tornam-se cada vez mais frequentes no planeta. Mas somos também aprendizes de feiticeiros: algumas das experimentações que fazemos geram efeitos colaterais imprevistos que se voltam contra nós como bumerangues. A adaptação  a uma nova situação pode ser passageira e volta-se ao estado anterior quando a emergência passar, ou pode ser duradoura, quando essa mudança perdura por longo tempo. Na medida em que a pandemia se  alonga no tempo novos hábitos e táticas precisam se incorporar às rotinas e não se pode baixar a guarda.

Antes da pandemia convivíamos com vários hábitos e, bem ou mal, nos adaptávamos a eles. Assim por exemplo, consumismo, viajismo, carnivorismo são hábitos ecologicamente destrutivos que causam danos ambientais.  A pandemia impôs um freio . e eles serão superados quando a sociedade desenvolver a vontade e os meios para deixá-los para trás. Quando se tornarem psicologicamente impossíveis, desaparecerão.

Adaptar-se a um ambiente doente pode levar a uma doença deformadora, a normose, que Jean Yves Leloup, Pierre Weil e Roberto Crema definem como “o conjunto de normas, conceitos, valores, estereótipos, hábitos de pensar ou de agir aprovados por um consenso ou pela maioria de uma população e que levam a sofrimentos, doenças ou mortes. São patogênicos ou letais, e são executados sem que os seus atores tenham consciência desta natureza patológica, isto é, são de natureza inconsciente. As normoses são estágios ainda não percebidos pela sociedade como doenças, tais como as neuroses ou psicoses.”

Outras normoses ainda não devidamente reconhecidas coletivamente são os modelos mentais como o  especismo, que discrimina  a espécie humana entre as demais, influencia nos comportamentos insensíveis que prevalecem na sociedade e está na origem de pandemias quando se consomem animais silvestres ou se destroem seus habitats naturais.

Numa sociedade convive-se com injustiças sociais e econômicas, com situações que geram poluições ambientais e afetam a saúde individual e coletiva. Por insensibilidade, anestesia, enrijecimento, ou conformismo fecha-se os olhos para tais questões. A superação das normoses se inicia com a tomada de consciência de cada pessoa que, quando desperta, deixa de se deixar levar por comportamentos imitativos, automaticamente.  A partir dessa autocritica e capacidade de discernimento avolumam-se críticas a tais hábitos. A renúncia a tais normoses pode ser uma estratégia para reduzir os riscos de ocorrência de novas pandemias.

 

 

 



[1] Em e-mail ao autor em agosto de 2011.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

A pandemia acelerou a digitalização de tudo

 

                                            Videoencontro em live durante a pandemia

 

Maurício Andrés Ribeiro

 

A pandemia acelerou a digitalização de tudo.

As telecomunicações alteraram a noção de distância. O mais distante é o que não tem conexão com a internet. O mais  próximo é o que tem boa conexão e pode estar instantaneamente presente. O distante ficou próximo com os celulares e computadores.

A internet e a TV mantêm as pessoas conectadas entre si e com o mundo. Virtualmente estamos próximos do que acontece no noutro lado do mundo, na aldeia global em que a educação  à distância, o trabalho à distância, o lazer  por meio de filmes e músicas em streaming e outras atividades são possibilitadas pela tecnologia e pela internet.

As tecnologias da comunicação desterritorializaram o modo de se estudar, viabilizaram o teletrabalho e reduziram a diferença entre o urbano-suburbano-rural.

A proximidade física deixou de ser um requisito para o intercâmbio e as trocas. Ao contrário, ela passou a ser uma característica a se evitar, para reduzir contágios.  As economias de aglomeração  induziam as pessoas a se aglomerarem em cidades. As deseconomias de aglomeração existiam na forma de poluições, de tempo desperdiçado em deslocamentos, de custos para o bem estar. A essas deseconomias de aglomeração se somou o custo que a aglomeração traz à saúde, com o espalhamento do vírus.

Conselhos que se reuniam presencialmente, trazendo pessoas de vários lugares em viagens de avião, tornaram-se tele conselhos e vídeo conselhos, com economia de custos e benefícios ecológicos. Reuniões de trabalho em torno de uma mesa tornaram-se vídeo reuniões. Conferências que antes eram presenciais foram desmarcadas e tornaram-se videoconferências. Teletrabalho,  tele-educação, tele cultura, tele lazer tornam-se partes do cotidiano. 

Ao falar sobre as consequências da pandemia no mercado de trabalho, na estabilidade social e política, bem como a importância de imaginar possibilidades novas, o cientista Silvio Meira afirmou que ela acelerou em vários anos  a digitalização da sociedade.   A pandemia  acelerou a consciência sobre o  digital, em que haverá mais transporte de informações via internet e mídias e redução do transporte de pessoas.

As cidades e os territórios de modo mais geral deixaram de ser apenas ambientes  físicos e se transformaram em ambientes digitais nos quais acontecem intensos fluxos de informações e trocas de conhecimentos. Ambientes fígitais. Algumas cidades, a exemplo de Barcelona, propõem colocar as plataformas digitais a  serviço do bem estar  de todos e não apenas para produzir lucros privados.

Na pandemia,  com a digitalização, tudo se transformou em tele e tudo  está na tela em casa 

O trabalho se transformou em teletrabalho. Home office

O lazer se transformou em telelazer. Home theather

A educação se transformou em teleducação. Home Schooling

A cultura se transformou em tele cultura. Home culture

O turismo se transformou em tele turismo. Home tourism

A religião se transformou em tele culto. Home prayer

O abraço se transformou em tele abraço. Home hug

O beijo se transformou em tele beijo. Home kiss

A amizade de transformou em tele amizade. Home friend

A ideia se transformou em tele ideia. Home idea

A voz se transformou em telefone. Telephone

A visão se transformou em televisão. Television

A comunicação se transformou em telecomunicação.

A escopo se transformou em telescópio. Telescope

A matemática se transformou em telemática. Telematics

A sena se transformou em tele sena. Good luck

A medicina se transformou em telemedicina. Telehealth

A entrega se transformou em tele entrega. Delivery

O entulho se transformou em tele-entulho.Telegarbage

A gratidão se transformou em tele gratidão - telethanks

O hamburguer se transformou em tele hambúrguer.

O comando se transformou em telecomando

A conferência se transformou em teleconferência

O diagnóstico se transformou em telediagnóstico

A medicina se transformou em telemedicina

A pizza se transformou em tele pizza

O serviço se transformou em tele serviço

A sinalização se transformou em tele sinalização

A sonda se transformou em tele sonda

O radar se transformou em tele radar

A reserva se transformou em tele reserva

Tudo se tornou tele. Teletudo.

Tudo à distância. Tudo está na tela.

Teleetc.

 

Videotudo

Videoconferência

Videofone

Videologia

Videodrama

Videoetc.

 

 

quinta-feira, 10 de dezembro de 2020

A grande aceleração foi acelerada pela pandemia

 

A grande aceleração. Painel no museu do amanhã, Rio de Janeiro.


Maurício Andrés Ribeiro

A pandemia acelerou várias tendências nos sistemas socioeconômicos e nos sistemas da terra. Um movimento consciente de desaceleração e de valorização da lentidão contrabalança aquele outro, e leva à reflexão, à contemplação, à atenção ao presente: slow food, slow is beautiful.

O ser humano tornou-se cogestor da evolução, cujo rumo e direção são influenciados pelas atitudes individuais e coletivas.A grande velocidade em que o mundo humano já se movia – time is money, fast food - foi ainda mais acelerada.  

A pandemia acelerou:

 a História

a digitalização da sociedade

mudanças na mobilidade urbana

o êxodo da cidade para o campo

mudanças na economia

mudanças nos negócios

a despoluição do ar

mudanças na relação com os animais

mudanças nos hábitos alimentares

o uso múltiplo da casa

outros  modos de se fazer cultura

a tele cultura

o teletrabalho

a teleducação

o tele turismo

o despertar da solidariedade

a explicitação de egoísmos

A unidade humana

mudanças  de consciência

a introspecção  civilizatória

o autoconhecimento

outras visões sobre a segurança

a colaboração científica

a busca por remédio ou vacina

os hábitos de higiene corporal

as mortes pelo vírus

perdas de liberdade e privacidade

a desigualdade social 

Por outro lado, a pandemia desacelerou: 

o ritmo de atividades humanas

o turismo

a circulação de pessoas

o uso de transportes coletivos

 

domingo, 6 de dezembro de 2020

As mortes por milhão são muito menores na Índia do que no Brasil, EUA, Europa

 


Mortes por milhão de habitantes na India, no Brasil e em países europeus

 

Maurício Andrés Ribeiro

Em 18 de julho quando completou 1 milhão de casos constatou-se que, com seis vezes mais população do que o Brasil, a Índia tinha metade dos casos e três vezes menos mortes, ainda que a população urbana lá seja 3 vezes maior do que a do Brasil.

Por quê a Índia continua em dezembro de 2020 a ter 8 vezes menos mortes  de Covid por milhão de habitantes do que o Brasil, os EUA, a Itália, a França, o Reino Unido, a Espanha, a Argentina etc?

Isso suscita indagações e hipóteses que envolvem tanto aspectos de gestão da pandemia como aspectos culturais e espirituais:

A subnotificação de mortes na Índia será maior do que a subnotificação em outros países, onde ela é de 30 a 60%?

Será maior do que a subnotificação no Brasil?

Qual o número de mortes em excesso comparadas com outros anos, para poder se dimensionar as subnotificações e ter um número mais correto?

1.      Quais as razões da Índia desde o início da pandemia e até o momento estar com números tão abaixo dos do Brasil em total de mortes por 1 milhão de pessoas?

2.      Isso se deve a políticas dos governos federal,  estaduais e locais? Ao fato do governo da India ter sido radical em seu lockdown, enquanto no Brasil houve ambiguidade e posições divergentes das autoridades federais, estaduais e municipais? À melhor ou pior gestão da pandemia? O governo indiano foi mais eficiente no controle sanitário do tráfego aéreo de pessoas?

3.      Ao fato de na Índia as cidades terem se esvaziado após o lockdown, com o retorno de milhares de pessoas a suas aldeias natais?

4.      À distribuição populacional e ao fato  de que a maior parte da população indiana ser rural e mais jovem (mais da metade da população com menos de 25 anos)?

5.      A razões comportamentais e ao fato de o povo indiano ser mais disciplinado e mais respeitoso em relação ao coletivo em comparação com o brasileiro, este mais individualista e mais propenso à transgressão?

6.      À milenar história indiana em que houve um aprendizado e know how de lidar com epidemias e o preparo para enfrentar adversidades e pestes tais como a cólera, peste bubônica e o desenvolvimento de mecanismos de defesa e anticorpos mais fortes e resistentes no sistema imunológico?

7.       A fatores climáticos e ambientais?

8.      A práticas alimentares tais como o uso da pimenta, cúrcuma, cominho e outros condimentos e especiarias fortalecedores da imunidade que atuam como remédios?

9.      Ao vegetarianismo e baixo consumo per capita de carne, que reduzem a existência de wet markets como os da China e daí reduzem o risco de produzir novas pandemias derivadas do relacionamento de humanos com seres não humanos, animais silvestres e outros?

10.   À consciência do corpo com respiração e posturas corporais adequadas, bem como ao hábito de tirar os sapatos ou sandálias antes de entrar em casa e lavar os pés, comer com a mão direita e fazer a higiene com a esquerda, ao uso disseminado de água sanitária? Ao uso de lenços no rosto para quem não tem máscara?

11.  Se o contágio depende do estado imunitário e a primeira barreira contra a entrada do vírus no organismo é a mucosa, então a alimentação, meditação, respiração consciente ou exercícios posturais podem ter algum efeito nesse estado imunitário? À imunidade adquirida por meio de hábitos de vida, alimentares, na medicina, nos exercícios com o corpo?

12.  A práticas e valores espirituais, a meditação e Yoga, fé e crença,  o Namasté ao invés do aperto de mão,   que aumentam a imunidade? Calma, OMM, desestresse, coragem, confiança, valores espirituais e fé fortalecem o sistema imunológico?

13.  A fatores  genéticos? A imunidade inata dos indianos seria maior do que as dos brasileiros? Alguns artigos levantam a hipótese de que os indianos podem ter diferenças genéticas que os protegem contra os vírus. E a pandemia na Ásia em geral também intriga os cientistas.

14.   À eficácia de medicina ayurvedica e outras medicinas tradicionais, e outros modos de prevenir e cuidar de doenças? A Índia é grande fabricante de remédios alopáticos, ayurvédicos, homeopáticos. À exposição a uma vacina contra tuberculose?

15.  À menor prevalência de diabetes e obesidade, que aumentam a vulnerabilidade, em comparação com outros povos?

16.  A uma cepa diferente do vírus, menos contagiosa e menos letal do que a que circula na Europa e no ocidente?

17.  A uma combinação entre várias dessas hipóteses acima?

 

Não tenho respostas definitivas para essas questões. Continuo acompanhando comparativamente a evolução da pandemia no Brasil e na Índia para compreender o que nos diferencia e o que nos aproxima. Desconfio que isso poderá trazer bons ensinamentos e lições que os brasileiros podem aprender com a India.

Vamos ver qual será o resultado alguns meses à frente...

Cuide-se!