terça-feira, 30 de junho de 2015

Introdução à educação integral

A educação integral é distinta de educação em tempo integral e de educação integrada. Sraddhalu Ranade é cientista, educador e professor que reside no Sri Aurobindo Ashram em Pondicherry, Índia. Ele elaborou um inspirador guia de introdução à educação integral para professores e pais. (INTRODUCTION TO INTEGRAL EDUCATION - An Inspirational Guide, de Sraddhalu Ranade, publicado por Sri Aurobindo International Institute of Educational Research, Auroville, 2007).
Ranade constata que o mundo atual passa por crises múltiplas e gigantescas nunca vistas na história humana: crise ambiental, climática, política, econômica, de relacionamento internacional, na religião, na política, na administração, da educação, nas famílias que tendem a se fragmentarem, crises individuais. Tais crises se intensificaram em progressão geométrica nos últimos anos e podem desembocar numa explosão e colapso ou, então, em algo novo. A educação é uma chave para se superar as crises, ao preparar as novas gerações.
 Ele afirma que o objetivo mais alto da educação é produzir um ser humano melhor, capaz de transcender a condição humana, superar a si próprio e à natureza. Em livro e seminário gravados para treinamento de professores, o objetivo não foi “discutir diferentes técnicas de educação, mas levar aos participantes uma maneira radicalmente diferente de experimentar a educação e o nosso papel nela como professores e pais – e gradualmente crescer em direção a uma nova atitude em relação ao todo da própria vida, pois os dois são inseparavelmente unidos.” O livro se fundamenta nos princípios das filosofias e modos de ser que evoluiram por milênios numa das duas civilizações mais sustentáveis e resilientes que já existiram, a civilização indiana (a outra é a chinesa). O autor “enfrenta o desafio de reconstruir as bases da educação sobre as percepções psicológicas mais profundas inatas para a civilização indiana, e dá uma forma concreta para a nova mentalidade que deve permear a educação futura da humanidade.
Com base em programas de formação de professores de Educação Integral realizados pelo autor na Índia, mostram-se as grandes linhas ao longo das quais os professores, pais e escolas podem fazer uma transição suave para o novo paradigma educacional. O livro chama o leitor para uma viagem experimental de auto-descoberta, rica em idéias de mudança de vida e sua aplicação prática no ensino de todos os dias e na paternidade. Ele inspira e reacende nossas aspirações mais profundas e restaura a fé em nossos ideais, mostrando o caminho para a sua realização e satisfação.” A palestra focaliza o modelo mental (mind set).
 A partir dessa abordagem e atitude filosóficas fluem metas, técnicas, práticas. A educação integral exige uma mudança psicológica interna, sendo uma abordagem a partir dos sentidos e do coração. Ranade observa que há três atores principais na aprendizagem escolar: os professores, os pais e os estudantes. Professores e pais têm uma responsabilidade sagrada. A tarefa dos professores e dos pais é ajudar a criança a ser o que escolheu ser, regar a semente, deixar crescer, encorajar e dar força, não focar nas fraquezas.
A criança sabe o que quer ser. A criança carrega a semente do conhecimento em si; ela já sabia e, aprendendo, descobre que já sabia!.
O professor tem suas expectativas, aspirações e papéis, bem como seu entendimento das várias atividades na escola. Ele deve pensar lateralmente e iniciar mudanças no atual ambiente e ethos de ensino em sala de aula, que é altamente estruturado, rígido em termos de controle de tempo e orientado para exames.
 Como ensinar?
O que ensinar?
Por quê ensinar?
 Ensinar para obter emprego e renda?
 O treinamento e capacitação de professores são aspectos estratégicos da educação integral, pois eles são atores chave para facilitarem a aprendizagem.

 

terça-feira, 23 de junho de 2015

Ecologia integral e cultura de paz

“Se quisermos lidar com a origem das crises com que agora nos defrontamos, precisamos despertar de nosso transe e recuperar um contato mais consciente com nossa própria sabedoria interior. Precisamos do equivalente cultural à desipnose”. Peter Russell A ecologia se originou na área biológica e tratou do ambiente natural, dos bichos e plantas e sua relação com o ambiente. Depois, se expandiu para a análise das relações entre os seres humanos e destes com o mundo natural. Formou-se o campo das ciências socioambientais. Um movimento correspondente de ampliação de perspectiva ocorreu em instituições: organizações não governamentais dedicadas ao meio ambiente se tornaram socioambientais. Esse enfoque constituiu um avanço. Mas é ainda um avanço parcial, ao excluir um terceiro campo, o da ecologia interior. No Brasil, ainda engatinha a abordagem integral da ecologia, que precisa estender-se a esse terceiro aspecto, complementando o socioambientalismo. O psicólogo Pierre Weil e eu publicamos artigo com a figura abaixo, que visualiza três grandes campos da ecologia integral. (Revista Thot, no. 53, 1990) Ao constatar que estamos em relação agressiva e destrutiva com o ambiente, Pierre propunha desenvolver a paz consigo mesmo, a paz social e a paz na natureza. James Lovelock, o criador da teoria de Gaia também denuncia esse tipo de relação belicosa: “Apossando-se maciçamente de terras para alimentar as pessoas e empesteando o ar e a água, estamos tolhendo a capacidade de Gaia de regular o clima e a química da Terra, e se continuarmos assim, corremos o risco de extinção. Em certo sentido, entramos em guerra contra Gaia, guerra que não temos esperanças de vencer. Tudo o que podemos fazer são as pazes enquanto ainda somos fortes e não uma ralé debilitada”. Na visão de Peter Russel, físico e psicólogo, as crises que a humanidade enfrenta são sintomas de uma crise psicológica muito mais profunda. Ele visualiza a oportunidade de desenvolver, como adaptação evolutiva, um novo modo de consciência: “A crise está nos empurrando para a mudança interior, para uma transformação em seres humanos verdadeiramente sábios, não mais aguilhoados pelo egoísmo.” (para quem se interessa pelo tema, ver Acordando em Tempo, 2006) A ecologia interior, que cuida da saúde física, emocional, mental e espiritual do ser humano, é fundamento para se desenvolver uma economia ecológica, pois demandas e desejos formados no campo da subjetividade humana, do mundo psíquico, emocional e da consciência condicionam comportamentos e atitudes; moldam e economia e impactam no ambiente. Mudanças de consciência, traduzidas em ações, provocam mudanças – para o bem ou para o mal - no ambiente natural e construído. Pessoas melhores talvez possam construir um mundo melhor. No livro Ecologizar, relacionamos cerca de 40 campos em que se desdobram as ciências ecológicas: a Ecologia ambiental, a Ecologia cósmica, a energética, a Ecologia humana, a mental e da consciência, a cultural e informacional, a Ecologia do ser, a Ecologia profunda e a Ecologia transpessoal, a Ecologia política, a social, a econômica, Ecologia urbana, a industrial, a Ecologia agrária e da paisagem, a Ecologia do cotidiano. A ecologia integral vai além do socioambientalismo. Compreende de forma abrangente a consciência ecológica e o modo como nos relacionamos com a natureza, que podem ser valiosos para a nossa sobrevivência e transformação nessa etapa de crise da evolução.

PIERRE DANSEREAU, PIONEIRO DA ECOLOGIA INTEGRAL

Meu encontro com as ideias de Pierre Dansereau se deu a partir do diagrama sobre os estágios de impacto crescente da espécie humana no ambiente. Ali, ele nos transporta numa viagem no tempo da jornada humana, desde a pré história até a atualidade: houve a fase da coleta de frutos e depois a caça e a pesca; em seguida, o pastoreio, com a domesticação de espécies animais; a domesticação dos vegetais, na revolução agrícola. No século XVIII a revolução industrial amplificou os impactos da ação humana sobre a natureza. Na segunda metade do século XX veio a urbanização acelerada. Vivemos atualmente a transição entre a urbanização e o controle climático. Muitos anos antes do tema das mudanças climáticas se disseminar, Dansereau o colocava como uma etapa relevante no relacionamento do ser humano com a natureza. Ele intuía o futuro e colocava nossa espécie no cosmos. Na época em que o diagrama foi concebido, as viagens interplanetárias estavam em seu início e esse era um cenário futurista, antecipado na ficção científica e nas obras de artes. Na etapa da fuga exobiológica ou transmigração, indivíduos isolados escapam à gravidade do planeta e lançam-se ao espaço cósmico. Ele chamava a atenção para essa escala da ecologia pouco valorizada numa época em que se falava em pensar globalmente, mas não em pensar cósmicamente. Durante sua temporada como diretor adjunto do Jardim Botânico de Nova York, ele se interessou pela ecologia humana e as questões urbanas. Antes da análise do ciclo de vida dos produtos disseminar-se como instrumento para a gestão e o planejamento, ele já analisava as paisagens urbanas e os ambientes construídos e tomava consciência dos sistemas de abastecimento pelos quais transitavam os materiais, a energia, os alimentos usados nos ecossistemas urbanos. Sua bola de flechas identifica os vários níveis tróficos e os processos de ciclagem de recursos por meio dos quais eles se transformam: do mineral, ao vegetal, ao animal herbívoro, ao animal carnívoro, ao investimento e ao controle. Matéria, vida e consciência estão ali incluídas. No campo da ética ambiental, constatou que a compaixão era “a única chave para liberar o fluxo para o compartilhado equitativo dos recursos.” Ele propôs a austeridade feliz como atitude de vida capaz de harmonizar o ser humano com o ambiente. Na linha do não consumismo, da simplicidade voluntária e da sobriedade, a austeridade feliz leva a um modo de vida que reduz o consumo material, como ato de compaixão e de compartilhamento de recursos. Ele foi pioneiro e intuiu essa necessidade de reduzir o peso da pegada ecológica; o indicador da pegada ecológica somente foi concebido décadas depois. Ele também antecipou a importância das ciências da cognição, ao incluir em seus diagramas a noosfera e a diversidade de estágios de consciência humanos. Esse reconhecimento da noodiversidade induz à prática da paciência e da tolerância, para que a convivência humana seja vivida em harmonia e paz.

segunda-feira, 22 de junho de 2015

Yoga é uma das riquezas imateriais e intangíveis da Índia para a evolução humana

Yoga faz parte do soft power, o poder suave da cultura, com que a Índia influencia o mundo. A palavra Yoga vem da raiz sânscrita Yuj, que significa combinar, fundir, juntar. É religação, reconexão com o todo. Sua prática ativa potencialidades latentes do corpo. O Yoga sistematiza conhecimentos que ampliam a auto percepção, a atenção ao momento presente, a percepção de pertencimento ao ambiente. É a ciência e a arte de ajudar o indivíduo a se sentir parte de uma totalidade não individualizada. Desenvolve a consciência do ser integral, incluindo o corpo, suas interações com a mente, as emoções e a espiritualidade. Tais conhecimentos reduzem a possibilidade de manipulação por agentes externos (pessoas, medicamentos, ervas etc.) Exercícios respiratórios (pranayamas) desenvolvem modos de inspirar e expirar a energia que mantém a vida e que está presente em toda a natureza, conhecida como prana. A consciência do ato de respirar, associada à vibração de um som como o OM (som universal) durante a expiração, acalma o pensamento e a mente. Trata-se de prática que pode ser exercitada cotidianamente nos tempos de deslocamento, nos transportes e salas de espera. Utilizam-se diversas posturas (asanas) para aprimorar o uso do corpo. Posturas, respiração, alimentação conscientes ajudam, por meio do corpo a transformar o self, a mente e as emoções. A vida toda é Yoga, diz Sri Aurobindo. Foto: Sri Aurobindo Ashram em Delhi, com escola integral onde crianças e jovens praticam yoga para aumentar a concentração e a aprendizagem.

Noodiversidade e rede social

Somos quase sete bilhões de indivíduos no planeta. Cada um tem sua impressão digital única. Há uma diversidade de indivíduos dentro da unidade da espécie. Há, também, bilhões de manifestações da consciência. A esfera da consciência é a noosfera, conceito elaborado pelo paleontólogo Pierre Teilhard de Chardin, em seus estudos sobre a evolução. A noosfera engloba o conhecimento interior, ideias, espírito, linguagens, teorias, conjunto de energias mentais, pensamentos, emoções, sentimentos, informações, geradas ou captadas desde o início da vida, e que constituem uma sutil camada que circunda o planeta. A raiz grega da palavra, nous, significa o espírito e a consciência intuitiva. Refere-se à imaginação, ao subjetivo, ao todo, ao pensamento flexível e complexo. Da raiz nous deriva também a palavra noética - a ciência da mente humana, que se refere à consciência pura ou intuitiva. As ciências noéticas exploram a natureza e os potenciais da consciência, acessando direta e intuitivamente o conhecimento, para além dos sentidos normais e da razão. Elas exploram a experiência subjetiva e o universo interior da mente individual e coletiva, relacionados com a sabedoria das tradições espirituais e com o mundo físico exterior. Também deriva a palavra noologia, o estudo sistemático de tudo o que se refere ao espírito, ao conhecimento e ao aparecimento e evolução dos pensamentos. Hoje em dia se valoriza a biodiversidade e se procura proteger espécies ameaçadas de extinção. A diversidade da vida ajuda a dar mais estabilidade e a reduzir riscos para a vida humana. Um conceito ainda pouco conhecido, pouco valorizado, a noodiversidade é igualmente valiosa. Um espaço em que se percebe com clareza a noodiversidade é nas redes sociais. Ali as pessoas expressam o que lhes passa pela cabeça, seus interesses, motivações, as causas pelas quais se comprometem e lutam, ou simplesmente jogam e se divertem. As mensagens postadas mostram a noodiversidade, a diversidade de estágios de consciência humana: a diversidade de assuntos e de interesses, de motivações, de abordagens (ativismo e defesa de causas, afetividade, autoajuda, divulgação de informações consideradas relevantes, autopromoção etc). Há pessoas monotemáticas, fixadas num assunto específico; outras têm um leque amplo de interesses e comentam as ideias de outros. Uns se interessam por gatos, outras por sapatos, por cinema e filmes, arquitetura, frases inspiradoras, humor e piadas, futebol, notícias de economia, ecologia, saúde, alimentação, denúncias, campanhas políticas e ideológicas, militância partidária, futebol. Algumas se mostram e autopromovem, outras apenas observam. Ao mesmo tempo essas redes se tornaram arenas de luta nas quais se revelam as dificuldades de lidar com ideais diferentes, a intolerância, as agressões. Cada pessoa que se conecta na rede social é um neurônio no cérebro global. A rede social também abre oportunidades para praticar uma boa ação diária: veicular e circular ideias edificantes. A tendência ao pensamento único, à hegemonia ideológica, a impor uma forma de ver o mundo, à intolerância e impaciência com quem pensa diferente está presente em diversas situações da vida social e política. O fanático não tolera a existência do diferente e procura suprimi-la. Tolerância, compaixão, capacidade de ter empatia e de se colocar no lugar do outro são qualidades que dão espaço para o florescimento da noodiversidade. Neste momento, diferentes estágios, modos e estados de consciência estão sendo vividos pelos bilhões de indivíduos e pelas diversas parcelas da humanidade – do astronauta à tribo isolada na Amazônia passando pelas populações urbanas e pelos agricultores. A crise climática e o risco do colapso ecológico ajudam a despertar para a era do conhecimento intuitivo, uma etapa da evolução que se baseia no desenvolvimento da consciência humana e não mais nos lentos processos da evolução biológica. Matéria (geodiversidade), vida (biodiversidade) e consciência (noodiversidade) integram um mesmo espectro. Mas a evolução da matéria é lenta e se processa nos ritmos da história geológica; a evolução biológica é mais rápida; e a noológica (da consciência intuitiva), é veloz como um raio. A noodiversidade é mais ampla do que a biodiversidade ou a diversidade social e cultural, pois a consciência é fluida, impermanente, intercambiável, sofre influências e transformações constantes e tem a sua dinâmica própria. Estamos no estágio terminal da era cenozoica (a era dos mamíferos) e no umbral da era ecológica (ou noológica) da evolução da história na Terra: uma era em que a vida passa a ser governada pela consciência ecológica, que compreende sermos parte integrante de um organismo vivo e consciente; e entende que da saúde desse organismo depende nossa saúde e sobrevivência.

quarta-feira, 17 de junho de 2015

Ecologizar as religiões

Padres e bispos, pastores, pais e mães de santo, rabinos, monges, médiuns, gurus, mestres espirituais, líderes religiosos de todas e de cada uma das tradições de sabedoria influenciam as mentes e as atitudes de seus liderados. Eles são milhões em todo o mundo, com bilhões de seguidores. São ouvidos, suas vozes são respeitadas. Transmitem, de geração para geração, valores e princípios de comportamento. Codificam princípios éticos e obtêm a adesão voluntária de seus seguidores. Transmitem conhecimentos, com impacto sobre o estilo de vida daqueles que a elas aderem. Formam a cosmovisão e moldam o imaginário individual e grupal, influenciam hábitos alimentares e de consumo em geral, bem como a vida pessoal e as ações profissionais. Quando propõem mudanças de valores, estilos de vida e padrões de consumo podem ajudar a lidar com o colapso climático e ambiental. Na sociedade contemporânea, várias fontes influenciam a consciência das pessoas: desde os meios de comunicação de massa, com seus apelos consumistas, até as escolas, as organizações sociais, as famílias, os ambientes de trabalho e também as religiões. As religiões são fatos antropológicos que geram intensa energia individual e social e que modelam comportamentos. Por um lado, podem produzir fanáticos fundamentalistas intolerantes. Por outro lado, podem ser veículos privilegiados para a disseminação da consciência ecológica. Ken Wilber constata no seu livro Espiritualidade Integral que a consciência se manifesta em vários estágios: arcaicos, míticos, mágicos, racionais. As religiões reconhecem esses vários estágios da consciência e não os excluem. Nesse ponto diferem da ciência, racional, que descarta as versões infantis da consciência e “adota apenas os resultados mais recentes do momento”. A consciência racional da era moderna e pós-moderna rejeita crenças e mitos e não abre espaço para eles, o que na visão de Ken Wilber, produziria reações como as dos terroristas e militantes fundamentalistas. Cada um desses estágios é como uma estação num caminho. As pessoas estacionam em algum deles antes de avançar para o seguinte. “As primeiras estações - arcaico para mágico e até mítico – envolvem estágios que, todavia, são aqueles que a vanguarda da humanidade vivenciou em seus primórdios da vida, na infância e na adolescência.” Ele afirma que a religião “é a única instituição com permissão para sancionar estágios que a humanidade atravessou nos seus primórdios, agora codificados em suas versões do nível mítico de sua mensagem espiritual.” Ele diz a religião dá legitimidade aos mitos criados no passado e que são significativos para os cerca de 70% da população mundial que vivem nesses estágios mágicos ou míticos. Ele constata que a religião funciona como uma esteira transportadora de um estágio de consciência para outros. Ken Wilber observa que “quanto antes as tradições espirituais começarem a oferecer estágios e estados superiores, mais cedo a religião poderá assumir seu novo papel no mundo moderno e pós-moderno: o papel de grande esteira transportadora da humanidade em geral.” Pensadores e cientistas na vanguarda reconhecem o potencial das tradições espirituais para contribuir na formação da consciência ecológica. Diz James Lovelock, em A vingança de Gaia que (2006, p. 132) “Meu desejo há muito tempo é que as religiões e os humanistas seculares se voltem para o conceito de Gaia e reconheçam que os direitos e necessidades humanos não são suficientes. Os religiosos poderiam aceitar a Terra como parte da criação de Deus, protegendo-a da profanação.” Entretanto o próprio Lovelock (2006, p. 131) constata as limitações das religiões ao observar que “Os fundadores das grandes religiões do judaísmo, cristianismo, islamismo, hinduísmo e budismo viveram em épocas quando éramos bem menos numerosos e vivíamos de um modo que não sobrecarregava a Terra.” E que “Nossas religiões ainda não nos deram as regras e orientações para o nosso relacionamento com Gaia. O conceito humanista de desenvolvimento sustentável e o conceito cristão de direção são maculados por uma arrogância inconsciente. Não dispomos do conhecimento nem da capacidade para atingi-los.” Algumas tradições compreendem a espécie humana como parte da grande teia da vida, dependente da sobrevivência do mundo animal e vegetal. Podem ajudar a disseminar a consciência ecológica. As religiões podem oferecer a seus praticantes a vivência de estados de consciência contemplativos e meditativos e, dessa forma, ajudá-los a ascender para estágios de consciência mais amplos. A transmissão de mensagens e valores por meio das tradições espirituais é parte da aprendizagem ecológica. Em várias religiões, essa transmissão era feita por intermédio de imagens, mitos e histórias que, numa linguagem ao mesmo tempo forte e atraente, disseminaram as informações fundamentais para a sobrevivência autossustentada. A tradição iconográfica e pictórica, de forte impacto visual, que se desenvolveu nas antigas civilizações, alcançava essa totalidade de adequação entre forma e conteúdo, conduzindo informações de conteúdo ecológico codificadas em mitos religiosos. A atual etapa da civilização exige valores pós-materialistas para que nossa espécie sobreviva. As religiões e tradições espirituais, se ecologizadas, poderiam contribuir para a consciência e as práticas ecológicas. A Encíclica do Papa Francisco divulgada em junho de 2015 é um passo positivo no sentido de ecologizar o catolicismo. Ecologizar as religiões pode ser um caminho promissor para alcançar a transformação da consciência humana.