quarta-feira, 15 de janeiro de 2025

O FUTURO DA ÁGUA NA TERRA



A água no planeta Terra não terá grandes variações de sua quantidade ao longo do tempo. Pequenas quantidades podem vir a se somar caso um cometa ou um corpo celeste gelado choque com a Terra e deixe aqui  a água com que viaja pelo universo. No limite, o futuro da água na Terra é o mesmo do futuro do planeta, quando o Sol se transformar numa estrela gigante vermelha daqui a 4,5 bilhões de anos.

Num futuro mais próximo  de nós, mas ainda na escala dos ciclos longos e de uma visão macro dos problemas, haverá variações significativas nas quantidades  de água em estado sólido, líquido ou gasoso. Caso o planeta se esquente, haverá menos água em estado sólido, com o derretimento das geleiras e das calotas polares. Haverá mais água em estado líquido, especialmente nos oceanos, cujo nível se elevará. Haverá mais água em estado gasoso, proveniente da evaporação. Isso causará mais furacões e tempestades, calamidades, desastres e catástrofes. 

Estamos no final de um período interglacial de cerca de 12 mil anos, período em que floresceram muitas civilizações humanas. Caso venha uma nova era glacial, com o esfriamento global, essas proporções de água líquida, sólida ou gasosa se invertem e as consequências para a sobrevivência da espécie serão desafiadoras. 

Num futuro mais imediato, as secas e estiagens trazem escassez de água, com consequências para as atividades humanas. A demanda por água está aumentando devido ao crescimento populacional, urbanização, agricultura intensiva e outros usos. Muitas regiões já enfrentam escassez de água, e essa situação pode se agravar se não forem implementadas medidas eficazes de gestão e conservação.

Quando falta, ela se torna um fator que limita as possibilidades de sobrevivência e  de atividades econômicas. Hoje ela já falta para muitas pessoas no mundo e há projeções de que cerca da metade da população do planeta sofrerá com a falta de água própria para seu uso e consumo nas próximas décadas. Em muitas partes do mundo, a escassez de água está gerando tensões e conflitos, especialmente em áreas onde os recursos hídricos são limitados e disputados por diferentes setores da sociedade.

 A poluição proveniente de atividades industriais, agrícolas e urbanas compromete a qualidade da água. Substâncias químicas, resíduos, microplásticos e poluentes afetam a saúde dos ecossistemas aquáticos e a disponibilidade de água potável, exigindo esforços para reduzir e controlar a contaminação.

As mudanças climáticas estão alterando os padrões de precipitação, aumentando eventos extremos, derretendo geleiras e afetando os ecossistemas aquáticos. Isso pode levar a mais escassez de água, inundações, salinização e outros impactos negativos.

No futuro, água limpa e pura tende a se tornar mais cara. Ela não se encontra mais em quantidade no Brasil, como no tempo em que Pero Vaz de Caminha escreveu sua famosa carta ao rei de Portugal dizendo que as águas são muitas, infindas. 

 O futuro da disponibilidade de  água para uso humano  no planeta dependerá de ações tomadas em todos os níveis, desde políticas públicas até mudanças comportamentais individuais. A gestão eficiente, a conservação, a implementação de tecnologias de reaproveitamento e tratamento de água e a cooperação internacional serão fundamentais para garantir que a água continue disponível para uso humano e para os ecossistemas. As mudanças climáticas, o crescimento populacional e a poluição representam desafios consideráveis, mas uma abordagem integrada e sustentável pode ajudar a garantir um futuro mais seguro e estável para as águas do planeta.

A curto prazo, nos próximos 5 a 10 anos espera-se um aumento de secas e inundações. Pressões populacionais e urbanização aumentarão a demanda por água. A poluição de fontes de água, tanto por resíduos industriais quanto por esgoto doméstico não tratado, continuará sendo um desafio significativo. As tecnologias de tratamento, reciclagem e captação de água da chuva devem se tornar mais acessíveis e comuns.

A médio prazo, nos próximos 20 a 30 anos, a mudança climática terá impactos profundos na distribuição e disponibilidade de água. A escassez de água poderá intensificar tensões e conflitos entre nações que compartilham bacias hidrográficas transfronteiriças. A agricultura, que é responsável por uma grande parte do consumo de água, terá que se adaptar a métodos mais eficientes, como a irrigação por gotejamento e o uso de culturas resistentes à seca. 

A longo prazo, nos próximos 50 a 100 anos e além, caso as tendências atuais de consumo de água e poluição continuem sem mudanças significativas, é provável que uma grande parte da população mundial enfrente escassez de água. A dessalinização e as tecnologias de reuso de água podem se tornar mais comuns e viáveis economicamente. 

A gestão integral do ciclo da água, que envolve a combinação de gestão de águas superficiais, subterrâneas e atmosféricas, será crucial para otimizar o uso e reduzir o desperdício. 

A disponibilidade de água também estará atrelada à saúde dos ecossistemas. Regiões que enfrentam grave escassez de água poderão ter ecossistemas severamente degradados, o que poderá afetar a biodiversidade e os serviços ambientais essenciais para a sobrevivência humana.  Espera-se um aumento significativo na implementação de soluções baseadas na natureza, como a restauração de ecossistemas de zonas úmidas e florestas, que ajudam a regular o ciclo da água e a melhorar a recarga de aquíferos. A conscientização sobre a importância da água e as práticas sustentáveis de consumo provavelmente aumentarão com o tempo. Campanhas educativas e políticas de incentivo a tecnologias de baixo consumo e reciclagem poderão melhorar a eficiência no seu uso.

O futuro da água no planeta Terra é estável. Mas é incerto o futuro da água acessível aos terráqueos para proporcionar-lhes vida saudável e bem-estar, com baixo custo. Isso dependerá da sabedoria e da hidro consciência para se relacionar bem com ela, desenvolver a ciência para melhor compreendê-la,  protegê-la, preservar nascentes naturais, evitar desperdícios, desenvolver novas tecnologias para dessalinização e obtenção de água potável e gerenciar integralmente o seu ciclo. Dependerá, ainda, de ações que superem o imediatismo do lucro máximo aqui e agora, do autointeresse estreito e individualista. Ações que considerem o interesse coletivo e público que se sustente ao longo do tempo podem aumentar as chances de acesso à água de boa qualidade para todos.


LIMITES HUMANOS PARA A GESTÃO INTEGRAL DO CICLO DA ÁGUA



Gerir integralmente o ciclo da água é uma meta ambiciosa e desejável, mas dificilmente alcançável em sua totalidade devido à complexidade, escala e interdependências do ciclo hidrológico. Por mais que o ser humano possa alterar processos locais, é impossível controlar todo o ciclo globalmente. Grandes massas de água, como oceanos e calotas polares, têm tempos de resposta muito longos às intervenções humanas. Mudanças nessas áreas só ocorrem de forma gradual. A capacidade humana de interferir no ciclo da água tem limites.

Embora não seja possível gerir integralmente o ciclo da água devido aos seus aspectos  globais, podemos gerenciar suas partes de maneira integrada e responsável. Isso requer uma abordagem colaborativa, adaptativa e baseada em conhecimento técnico e científico. A gestão integral reduz impactos negativos e também aumenta a resiliência do sistema hídrico e das comunidades que dele dependem. Uma abordagem sensata é trabalhar em harmonia com os processos naturais, focando na preservação e na regeneração, em vez de tentar controlá-los completamente.

 O ciclo da água está profundamente interligado ao clima global. Alterações humanas em uma região podem ter efeitos imprevistos em outra, limitando nossa capacidade de prever e controlar os resultados. O ciclo da água é impulsionado por forças naturais, como a energia solar e a gravidade, que estão além do controle humano. Processos globais, como evaporação oceânica, circulação atmosférica e precipitação, operam em escalas que não podem ser diretamente geridas. Os componentes do ciclo da água (água superficial, subterrânea, atmosférica, etc.) estão interligados, e intervenções em um ponto podem ter consequências imprevistas em outros. Alterações regionais no uso da água podem impactar ecossistemas e comunidades distantes.

Há limites tecnológicos para tal gestão, pois apesar dos avanços em tecnologia, ainda não podemos manipular processos como precipitação (chuva) ou recarga de aquíferos de forma precisa e segura em larga escala. Além disso, as soluções tecnológicas, como a dessalinização e o reaproveitamento de águas residuais, têm custos elevados, consumo energético significativo e dependem de recursos nem sempre acessíveis. Enquanto algumas regiões possuem recursos para implementar soluções tecnológicas avançadas, outras não têm capacidade técnica ou financeira, limitando os benefícios globais. Intervenções tais como a construção de grandes barragens ou projetos de geoengenharia, podem levar a efeitos adversos inesperados, como perda de biodiversidade, deslocamento de populações e mudanças no clima regional.

Há limites éticos e sociais, pois alterar o ciclo da água, mesmo localmente, pode gerar conflitos e afetar ecossistemas vulneráveis. Decisões éticas são necessárias para evitar desigualdades e injustiças ambientais. Algumas intervenções, como a manipulação climática, enfrentam resistência da sociedade devido a preocupações éticas e morais.  A desigualdade no acesso a recursos e tecnologias dificulta a implementação de políticas integradas em escala global. Conflitos de interesses entre setores (agricultura, energia, abastecimento urbano) complicam a gestão coordenada.

Há  limites de sustentabilidade, como por exemplo ocorre na extração de água subterrânea além da capacidade de recarga natural, que pode levar ao esgotamento de aquíferos, salinização de solos e a desequilíbrios irreversíveis. Algumas mudanças, como a poluição de aquíferos ou a perda de áreas úmidas, são extremamente difíceis ou impossíveis de reverter, criando barreiras ao uso da água no futuro. O ciclo da água está intimamente ligado à saúde dos ecossistemas naturais, como florestas e zonas úmidas. A degradação desses sistemas compromete o equilíbrio geral.

Há limites impostos pelas mudanças climáticas,  que intensificam secas, enchentes e tempestades, tornando mais difícil gerenciar e prever o ciclo da água. A alteração nos padrões de chuva e evaporação devido ao aquecimento global cria cenários incertos, dificultando intervenções humanas eficazes. Eventos extremos, como secas prolongadas e enchentes, desafiam a capacidade de planejamento e resposta.

Embora seja difícil gerir integralmente o ciclo da água devido à sua complexidade e aos desafios citados, é possível avançar. Isso exige esforços coordenados entre governos, cientistas, organizações e comunidades, priorizando a conservação, e a equidade social. Realizar uma gestão integral do ciclo das águas é uma tarefa desafiadora devido à complexidade dos processos naturais, às limitações humanas e às barreiras socioeconômicas e políticas existentes.


EM BUSCA DA GESTÃO INTEGRAL DO CICLO DA ÁGUA

 O futuro da vida humana sobre  a Terra e sua evolução depende dos terráqueos compreenderem o ciclo integral da água e se comportarem de modo harmônico com ele.

 Para as próximas gerações será cada vez mais vital ter não apenas conhecimento especializado, mas uma consciência holística e integral sobre a água. A água fala e precisamos saber ouvir sua voz e conhecer seu ciclo e suas histórias. Ela está nos dizendo, com os furacões e inundações, com as secas dos rios, com as ilhas de plásticos no oceano, que a saúde do ambiente não está boa e que precisa haver cuidados. 

Se soubermos compreender o que ela nos fala, poderemos sair bem da mega encrenca trazida pelas emergências do clima. Se não soubermos escutá-la, o sofrimento crescerá, prejuízos e mortes acontecerão. Ela é uma chave para compreender o mundo em que vivemos nós humanos,  seres em transição.

Ter empatia com a água, colocar-se no lugar dela, tratá-la como pessoa, senti-la como parte de nosso próprio corpo,  podem ser atitudes que levem a um relacionamento mais amigável e harmonioso com ela. Pesquisar soluções e tomar decisões baseadas na água pode ser um caminho para construir uma cultura de paz conosco mesmo, com os outros e com  a natureza.

Gerir integralmente o ciclo das águas significa adotar uma abordagem que considere todas as etapas do ciclo hidrológico e suas interdependências, integrando aspectos ambientais, sociais, econômicos e políticos. 

Gerir integralmente o ciclo da água requer uma abordagem adaptativa, colaborativa e transdisciplinar. Embora não possamos controlar todo o ciclo, podemos atuar de maneira consciente e planejada em cada um de seus componentes, minimizando impactos negativos e promovendo a resiliência e a sustentabilidade do sistema hídrico global.

Para garantir um futuro com menores conflitos pelo uso da água, é crucial promover práticas de conservação da água que melhorem a eficiência no uso na agricultura, na indústria, no uso doméstico e em outros usos. É possível amenizar os impactos da falta de água por meio de tecnologias que reduzem o seu  desperdício e mau uso. Será necessário investir em pesquisa e desenvolvimento de tecnologias inovadoras para o tratamento de água, dessalinização, reciclagem de água e monitoramento, entre outras. 

É preciso desenvolver estratégias de gestão integral do ciclo da água, para proteger fontes de água, restaurar ecossistemas aquáticos e garantir acesso equitativo à água potável. Uma técnica  econômica é imitar o processo que a natureza usa para  produzir água limpa, por meio das florestas que permitem que ela se infiltre no solo, formando caixas d’água subterrâneas  de onde brotam as fontes, olhos d’água e as nascentes.

Deve-se promover a cooperação entre países e comunidades, gerenciando corpos de água transfronteiriços para que sejam compartilhados de forma justa. É  realista buscar um equilíbrio sustentável, reconhecendo a interdependência entre humanos e o ambiente. 

A gestão integral não significa controle absoluto, mas sim convivência harmônica com o ciclo da água, respeitando seus limites e dinâmicas naturais. 


terça-feira, 14 de janeiro de 2025

A IMPORTÂNCIA DA GESTÃO INTEGRAL DO CICLO DA ÁGUA


A gestão integral do ciclo dA água vai além da gestão integrada de recursos hídricos superficiais e subterrâneos. Uma gestão do ciclo integral envolve todos os aspectos, desde a água na atmosfera, as nascentes, a proteção florestal e o uso do solo, os oceanos.  Isso agrega uma complexidade e uma dificuldade ainda maior aos já enormes problemas envolvidos com o gerenciamento integrado das águas subterrâneas e superficiais.

Uma abordagem holística e transdisciplinar considera o ciclo integral, inclusive sua fase meteórica ou na atmosfera, pois cada vez mais a gestão de recursos hídricos está dependente do clima e de suas variações.  Tal gestão considera as interconexões entre o que ocorre quando ela escorre superficialmente, se infiltra nos solos e forma os lençóis subterrâneos e  quando se encontra em estado meteórico, no vapor na atmosfera.

A gestão integral do ciclo considera todas as suas formas de presença na natureza: sólida, líquida; gasosa; meteórica, superficial e subterrânea. Ela exige uma compreensão ampla desse ciclo.

A gestão integral do ciclo da água depende de uma boa articulação entre o nível  global, o federal, os estados e municípios,  a partir de dados e informações compartilhados. Numa federação, cada ente tem suas responsabilidades. A chuva chove nos municípios, pois ela cai no território da bacia e quem cuida do uso e ocupação do solo são os municípios. Depois ela escorre para riachos e córregos estaduais e algumas vezes chega a rios federais. Quando ela se infiltra no solo passa a ser de domínio dos estados, que gerenciam as águas subterrâneas. Enquanto está na atmosfera, ninguém é responsável pelo seu gerenciamento. 

Para se lidar de modo integral com a gestão do ciclo, é relevante reduzir as demandas nas diversas atividades econômicas, especialmente o consumo pelo usuário que mais a utiliza, a agricultura irrigada.  Isso implica em inovar nas tecnologias e em atuar sobre a economia para reduzir as demandas excessivas que causam estresse hídrico. Implica em  atuar sobre a cultura e os hábitos alimentares e de vida. 

A gestão integral do ciclo da água articula seu planejamento e gestão numa perspectiva de longo prazo. Ela compartilha dados e sistemas de informação. Requisito importante para que ela se torne realidade é evoluir dos estudos técnicos especializados e dos conhecimentos da hidrologia, para  a perspectiva de uma hidrologia integral, transdisciplinar, e daí para a Hidrosofia, ou seja, tratar  a água com sabedoria. A gestão integral do ciclo das águas requer uma abordagem que leve em consideração todos os compartimentos do ciclo hidrológico — águas superficiais, subterrâneas, atmosféricas e oceanos — e também influências externas, como a gravidade lunar, que afeta as marés e, consequentemente, o ciclo da água. 


O gerenciamento do ciclo integral das águas é um projeto potencial e virtual que se inicia com a hidratação das mentalidades, da sociedade, da economia, para que a civilização  deixe de ser hidrocida, se torne hidrocêntrica, supere a hidroalienação. 

É necessário promover a hidroconsciência na sociedade, de modo que os atuais e futuros governantes, empresários, representantes em conselhos de recursos hídricos ou em comitês de bacias, tenham sido educados para atuar de modo hidricamente responsável em cada um de seus campos de atividade. É necessário hidratar as consciências. É necessário investir no conhecimento e no desenvolvimento de instrumentos para dar conta de toda a variedade de problemas relacionados com o ciclo das águas.

A GICA é uma meta e um objetivo que progressivamente evolui e dá seus primeiros passos. Há uma longa caminhada pela frente para que ela se realize.

As águas na atmosfera são relevantes para a gestão integral do ciclo da água

 

A gestão das águas na atmosfera é um campo menos discutido em comparação com a gestão de águas superficiais e subterrâneas, mas é uma área importante para lidar com questões como a seca, a mudança climática e a segurança hídrica. A atmosfera desempenha um papel crucial no ciclo hidrológico e a gestão de suas águas envolve a compreensão e o controle de fenômenos como precipitação, evaporação, condensação e transporte de umidade. 

Pierre Dansereau, o grande botânico e biogeógrafo canadense, formulou um esquema sobre as várias etapas da relação do ser humano sobre o ambiente, desde suas origens até os dias  atuais e para o futuro. Na atualidade, depois da etapa da urbanização, segue-se a etapa que ele denominou de controle climático (H), representada visualmente  por um avião bombardeando nuvens com produtos químicos para  fazer chover.


Entre as experiências de gestão de águas na atmosfera estão a tecnologia de modificação do clima ou cloud seeding. A semeadura de nuvens é uma técnica que visa aumentar a precipitação por meio da dispersão de substâncias como iodeto de prata ou cloreto de sódio em nuvens para estimular a formação de gotas de água maiores e a precipitação.  Essa técnica pode ajudar a aumentar a disponibilidade de água em regiões áridas e semi desérticas, proporcionando alívio em situações de seca prolongada e apoiando a agricultura. A China é um dos líderes mundiais em cloud seeding e tem programas significativos de modificação do clima, especialmente para aumentar a precipitação em regiões secas e para garantir água durante eventos como os Jogos Olímpicos. A técnica pode trazer consequências conflitivas. Na China, isso gerou disputas entre regiões vizinhas, pois nuvens bombardeadas numa província deixaram de chover em outra, devido aos movimentos dos ventos, subtraindo água de uma delas em benefício da outra. Os Emirados Árabes Unidos implementaram um programa de semeadura de nuvens para aumentar a precipitação em áreas desérticas, ajudando a aliviar a escassez de água e melhorar a gestão dos recursos hídricos. A revista Scientific American n.63, edição especial, tem uma matéria sobre o tema “Invocando Chuva”, por Dan Baum, que mostra a semeadura de chuva por meio de iodeto de prata. Isso faz se aglutinarem dentro das nuvens as pedras de gelo que se derretem ao caírem para regiões da atmosfera em que a temperatura é maior, formando chuvas ou tempestades de granizo, que chegam em estado sólido na superfície. 

Na gestão integrada de água e clima há  projetos de pesquisa e cooperação internacional. Iniciativas como o projeto Global Precipitation Measurement (GPM) da NASA e da Agência Espacial Japonesa ajudam a monitorar e prever padrões de precipitação e transporte de umidade em escala global. Esses dados podem ser usados para ajudar na gestão de recursos hídricos, prever eventos climáticos extremos e melhorar a resposta a desastres relacionados à água. Em alguns países da América Latina, como o Brasil e o Chile, projetos que combinam o monitoramento da precipitação atmosférica com a análise de mudanças climáticas ajudam a prever e mitigar secas e enchentes, influenciando políticas de gestão de água e infraestrutura de abastecimento. Os sistemas avançados de previsão de tempo e clima  usam satélites e sistemas de radar para monitorar a umidade atmosférica, a cobertura de nuvens e os padrões de precipitação em tempo real e ajudam a prever mudanças nos ciclos de água. O Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) no Brasil e outras agências meteorológicas ao redor do mundo usam tecnologias avançadas para prever e analisar padrões atmosféricos que impactam a gestão da água.

Dentre as principais dificuldades para a gestão de águas na atmosfera estão os desafios tecnológicos e científicos. Apesar dos avanços tecnológicos, a previsão precisa de padrões climáticos e atmosféricos ainda enfrenta dificuldades devido à complexidade dos sistemas climáticos e à variabilidade da atmosfera. Os Programas de modificação do clima e sistemas de monitoramento avançados podem ser caros para implementar e manter. Isso limita a capacidade de muitos países, especialmente aqueles em desenvolvimento, de adotar tais tecnologias.

Há questões ecológicas e ambientais, pois as  técnicas como a semeadura de nuvens levantam preocupações sobre os possíveis impactos ambientais e a alteração de padrões de precipitação que podem afetar ecossistemas locais e regionais de maneira inesperada. Além disso, as práticas de modificação do clima podem beneficiar regiões específicas em detrimento de outras, levando a possíveis conflitos sobre a distribuição da água.

Há, ainda,  desafios políticos e regulatórios. Não há uma regulação global clara sobre a modificação do clima e a gestão de água atmosférica, o que pode levar a disputas políticas, especialmente em regiões com escassez de água compartilhada. A gestão de águas atmosféricas e a modificação do clima muitas vezes exigem cooperação internacional para evitar impactos negativos em países vizinhos, mas a falta de acordos políticos pode ser um obstáculo significativo.

Existem questões éticas e de segurança, pois a  implementação de técnicas de modificação do clima pode ter impactos indesejados em comunidades que dependem de padrões climáticos específicos, levantando questões sobre quem decide e controla esses processos. A modificação de aspectos do clima por meio da geoengenharia é vista com ceticismo por muitos especialistas, que alertam para os riscos de mudanças inesperadas e irreversíveis nos padrões atmosféricos.  A gestão das águas na atmosfera deve ser integrada com a gestão das águas superficiais e subterrâneas para garantir uma abordagem holística. Essa integração pode ser desafiadora devido à falta de dados e modelos que considerem todas as interações no ciclo da água.

A gestão das águas na atmosfera é uma área complexa que envolve tecnologias avançadas e cooperação entre países e setores. As boas experiências, como a modificação de nuvens e sistemas de monitoramento climático, demonstram o potencial de aumentar a disponibilidade de água em áreas afetadas por secas e mudar a dinâmica dos recursos hídricos. No entanto, os desafios relacionados a custos, questões ambientais, políticas e a falta de regulamentação internacional são obstáculos importantes que precisam ser superados para que essa gestão seja eficaz e sustentável. Uma abordagem coordenada que combine ciência, tecnologia, políticas públicas e a participação das partes interessadas será crucial para enfrentar esses desafios de forma bem-sucedida.


segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

OS OCEANOS 

Os cinco grandes oceanos são um só, interligados por correntes marítimas que no passado foram usadas pelos navegadores.  

Os oceanos estão na superfície da Terra, cobrindo aproximadamente 71% da área total do planeta. O termo “águas superficiais” refere-se a todas as águas que estão presentes na superfície da Terra, como rios, lagos, mares e oceanos. Essas águas estão expostas diretamente à atmosfera e fazem parte do ciclo hidrológico global. Embora sejam águas superficiais, os oceanos diferem de outros corpos de água devido à sua vastidão, profundidade e composição química pois são predominantemente salgados. O sal dos oceanos resulta de milhões de anos em que os rios transportaram para os mares os sais existentes nas rochas. Ao evaporar, as águas se dessalinizam; o sol é, portanto, um grande dessalinizador natural da água do mar. 


Figura: Os oceanos correspondem a 97,5% das águas do planeta.

Eles representam o maior reservatório de água do planeta e têm funções críticas para a regulação climática e a manutenção da biodiversidade. Os oceanos desempenham um papel fundamental na evaporação, formação de nuvens e precipitação, conectando-se com outros corpos de águas superficiais e subterrâneos. A circulação das correntes marítimas influencia o clima em todas as partes do planeta. 

A água tem a capacidade de reter calor e de liberá-lo para a atmosfera, e o clima é afetado pelo comportamento dos oceanos. Eles são crescentemente compreendidos como reguladores térmicos do planeta. O fenômeno do El Nino, com a elevação da temperatura do Pacífico, provoca alterações climáticas em várias partes do mundo. No Brasil, aumentam as chuvas no Sul e reduzem-se as chuvas no nordeste, nos anos de El Nino. Inversamente, o fenômeno La Nina resfria o Pacífico e influencia o clima na América do Sul e no Brasil, onde aumentam as chuvas no norte e nordeste e aumentam as secas no sul.


Os ciclones e furacões tornam-se mais frequentes e intensos devido ao aquecimento dos oceanos.

O aquecimento das águas dos oceanos,  tem efeitos sobre o clima em várias partes do planeta com eventos climáticos extremos. A água evaporada dos oceanos forma as nuvens que, trazidas pelos ventos, chovem nos continentes: as monções na Índia, os rios voadores na Amazônia. Mudanças da circulação no Atlântico podem  colapsar a Amazônia.

Com o degelo nos pólos, a quantidade de água líquida aumenta e eleva-se o nível dos mares. Se a AMOC - Célula de Revolvimento Meridional do Atlântico (Amoc, em inglês) e as correntes marítimas no oceano Atlântico se alterarem, existe a possibilidade de se cortar a corrente do Golfo, o que poderá levar à Europa uma nova era do gelo. e aumentar o risco de colapso na Amazônia  

terça-feira, 13 de agosto de 2024

Maria Helena Andrés e o Japão

Maria Helena Andrés visitou o Japão em 1970, durante a feira internacional de Osaka que celebrava o progresso e a harmonia da humanidade. Impressionou-se com a tecnologia avançada, que coexistia com as tradições zen e shintoista. Ela escreveu então: “Através dos diversos “stands” o visitante toma conhecimento do que se passa no mundo, do progresso tecnológico e da inventividade humana que se projetou vertiginosamente no século XX.  A criatividade manifestou-se através da arte, da ciência e da técnica, preenchendo a necessidade do homem de avançar para o futuro e descobrir novas realidades. A riqueza da técnica aliava-se ao gosto estético de criar beleza.  Entre luzes e formas o mundo se desenrolava, sintetizado e projetado nos diversos pavilhões. Estruturas metálicas, tubos, torres e globos continham a síntese do progresso de cada país. Havia uma aproximação dos povos, uma identificação de culturas.”

“Eu estava em plena fase dos astronautas quando viajei para o Japão. Nos meus quadros daquela fase, eu pintara aqueles objetos estranhos, brilhantes. Era o meu mundo imaginário que ali estava exposto!”

Naquela viagem, Maria Helena visitou Kyoto e observou sobre as crianças japonesas e sua disciplina:           “As casas são limpas, não há desordem, o espaço é livre sem móveis. A criança desenvolvida dentro desse ambiente de ordem, cresce condicionada a uma estrutura que se revela através de seu comportamento: atravessa a rua sozinha, mesmo que tenha pouca idade, e tem iniciativas de adulto. Naturalmente, sua arte reflete este comportamento disciplinado. A criança japonesa revela, nos desenhos, muita sensibilidade e precocidade.”

Artistas japoneses

Ao buscar inspiração no Japão, a artista fez a trajetória inversa à de pintores japoneses que migraram para o Brasil, tais como Tomie Ohtake, Kazuo Wakabayashi, Tomoshige Kusuno e Manabu Mabe.

Seu abstracionismo lírico tem afinidade com a obra desses artistas, na medida em que revelam a gramática icônica dos japoneses, através da pintura gestual. Essa gramática é apropriada pela publicidade ao conceber logomarcas e outros signos gráficos de forte apelo comunicativo.      Em sua autobiografia (ver link http://www.imha.org.br/arquivos/Capitulo-5-Outras-Viagens-ao-Oriente.pdf )  há um capítulo com vários textos sobre o Japão. Maria Helena estudou sobre Tessai, Mariko Mori, e os artistas japoneses que imigraram para o Brasil e observou que: ”O Japão assimilou a civilização ocidental e, apesar de conservar hábitos tradicionais, houve simultaneamente uma aceleração de seu progresso. Perdura o culto às imagens na tradição dos templos budistas: águas jorrando das fontes sagradas, nuvens de incenso e velas acesas…. Em Kyoto, os jardins de pedras sem plantas, são despojados como a doutrina Zen. O Zen-budismo foi a alma da arte japonesa.”

Em texto sobre a arte de Tessai, artista que representou o Japão na VI Bienal de São Paulo, Maria Helena registrou que: “Suas telas transmitiam a mensagem que só os grandes artistas conseguem comunicar. Provocavam um suspense e uma alegria estranha. Suas cores transparentes não reproduziam simplesmente a natureza. Ultrapassavam o conceito individualista da arte para alcançar o campo mais vasto de arte para a humanidade.”  “Tessai era um homem de vasto saber, afamado mundialmente pelo seu humanismo e erudição. Entusiasta de viagens, aproveitou todo o tempo disponível, desde a juventude até a velhice, para vaguear a pé pelo Japão inteiro. Interessado em história, geografia e folclore, esteve sempre em contato com a grandeza do cenário natural e treinou incessantemente seus olhos para a melhor compreensão e percepção da realidade. Tessai atingiu o apogeu de sua arte aos oitenta anos de idade, quando conseguiu, através da luminosidade das cores e da transparência de tintas superpostas, chegar à síntese dos processos da pintura oriental. Aliando suas experiências de vida aos estudos teóricos, Tessai conseguiu transmitir em sua obra uma síntese de cultura, arte, filosofia e religião. “ (Trecho do livro “Encontro com mestres no oriente”)

Em texto sobre O SILÊNCIO DE BUDA a artista refletiu que “O Buda imenso medita, como meditam todos os budas de Kyoto. A atitude é serena, desligada do mundo e de sua agitação. As linhas curvas da escultura, despojadas de sentimentalismo, procuram a harmonia universal. Buda significa o Iluminado, aquele que está liberto da ignorância. A arte japonesa, que se faz representar através da força mística dos Budas, é uma arte que alia a tranquilidade à monumentalidade. Conduz ao eterno, levando o espírito a superar a terra e suas narrativas históricas e regionais.  Há serenidade no rosto, nas mãos, no ondulado da túnica e em toda a atitude da figura. Há quietude mental como querem os filósofos do Oriente. As linhas curvas, às vezes, lembram o Barroco. No entanto, não procuram a agitação, mas o equilíbrio, não levam o espírito ao sofrimento humano, à revolta, ao sentimentalismo, mas conduzem ao centro de todas as coisas onde existe quietude e serenidade.”         

“ Os artistas da China Antiga e do Japão escreviam textos poéticos em suas telas de seda e usavam o mesmo pincel para escrever letreiros ou cartazes. As cenas desenrolavam-se linearmente através dos grandes painéis, como se a natureza, perdendo os limites de espaço captados por nossa percepção, pudesse se desdobrar em tela panorâmica, revelando o conjunto de várias paisagens. Árvores e folhagens obedeciam a um ritmo caligráfico de intensidades variadas. As manchas sugeriam espaços indefinidos, esfumaçados, cheios de nuvens. Os poemas acompanhavam o traçado das árvores e dos rochedos, com a mesma sensibilidade do desenho. A letra integra-se à paisagem, faz parte dela, não se destaca do conjunto como elemento dissonante. A caligrafia oriental é por si mesma artística e sugeriu ao ocidente a pintura de ação, o grafismo e o abstrato lírico.”

Meditação e zen

No texto sobre JARDINS DE MEDITAÇÃO E ARTE JAPONESA observou que “ O japonês preserva cuidadosamente seus recantos de meditação. Esses são templos, onde a natureza é o altar para o encontro com a eternidade. Na tranquilidade desses jardins a alma recebe como benção o mistério nascido da terra. Em Kyoto, os jardins de pedras sem plantas, são despojados como a doutrina Zen. O Zen-Budismo foi a alma da arte japonesa. Essa escola de reflexão importada da China expandiu-se também pelo Japão e exerceu sua influência sobre arquitetos, urbanistas e artistas plásticos. Esses artistas pintavam em grandes rolos de 15 metros sobre papel ou seda. A identificação do homem com a natureza é expressa através desses segmentos lineares, onde forma e espaço se equilibram em ritmo sinuoso: rochedos e árvores retorcidas, montanhas em planos superpostos, pintura de sonho e poesia, deixando entrever um pouco da Eternidade.”

Sobre a proporção do ser humano na paisagem Maria Helena refletiu que   “A filosofia Zen ordenou sugerir e não demonstrar. O homem desaparece dentro da paisagem. A natureza que o antecipou continua, em seu silêncio, a superá-lo. O homem vive, cresce e morre. A montanha resiste, afronta tempestades, ventanias e às vezes terremotos, mas só uma energia muito forte consegue derrubá-la. Talvez, por isso mesmo, suas pinturas emocionem tanto o homem receptivo à Realidade Espiritual. Foram feitas por monges budistas dedicados à meditação. Não procuram refletir cenas realistas, mas a Eternidade das coisas.”

          “Enquanto o mundo ocidental preocupava-se com o homem, e o renascimento rendia-lhe verdadeiro culto como centro do universo, o Oriente silenciosamente engrandecia a natureza. As grandes paisagens, em rolos enormes, dos museus de Kyoto e Tóquio, são testemunhas de uma arte sempre renovadora. De sua influência sobre o Ocidente nasceu a pintura abstrata informal.”


A grande onda de Kanagawa - Mestre Hokusai

 Influência japonesa na arte de Maria Helena Andrés

A influência japonesa na arte de Maria Helena Andrés se mostra de três maneiras: na iconografia da pintura abstrata informal; na inclusão da escala cósmica em suas pinturas, colocando o ser humano em proporção diminuta diante da natureza e dos  cosmos; e na busca da essência e da unidade espiritual.

No Japão, a artista absorveu a essência da cultura zen, de sua caligrafia e iconografia que buscam a essência do gesto livre, para além das aparências físicas visíveis.






Desenhos de MHA sobre papel

 



 




 

A  influência da caligrafia japonesa está presente na logomarca do Instituto Maria Helena Andrés, criado em 2005. Essa logomarca identifica ao mesmo tempo os traços da artista e sua assinatura.



Esse pioneirismo de Maria Helena Andrés na aproximação com o Japão  seguiu um pensamento semelhante ao do crítico de arte Mário Pedrosa que, ao retornar de uma viagem feita ao Japão, redigiu o ensaio denominado “ A caligrafia sino-japonesa moderna e a arte abstrata no Ocidente”, na qual revela ter encontrado respaldo para discorrer sobre a pintura informal ou lírica. Em uma sequência de matérias publicadas no Jornal do Brasil, em 1959, Pedrosa afirmava: ”toda a arte chinesa, e mesmo a japonesa é iconográfica, isto é, feita em função de uma ideia ou símbolo”


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