segunda-feira, 23 de julho de 2018

Viajismo e pós pandemia

Maurício Andrés Ribeiro

A pandemia que acontece em 2020 produziu vários efeitos colaterais. Entre eles, destaca-se a redução do numero, frequência e intensidade de viagens.
O viajismo é uma forma de consumismo de serviços que acontece quando pessoas se deslocam de um local para outro.  Viajar compulsivamente é uma normose social que pode tornar-se um vício pessoal.

Homo turisticus
O homo turisticus sai de seu lugar de origem e se desloca para onde haja situações de seu interesse. Há o turismo de convenções e de negócios, o cultural, o cívico, o de aventuras, o sexual, o ecológico, o rural, etc.
Homo photographus
Cada turista se tornou um homo photographus. Com uma câmera, um tablet ou um telefone celular em mãos, fotografa o que lhe chama a atenção, capturando múltiplas imagens dos lugares por onde passa.
Cidades como Nova Iorque, Paris, Roma, Florença, Veneza e, Lisboa, o Porto, atraem multidões de turistas, que invadem as ruas e espaços públicos. Andam pelas ruas e esperam em filas para acessarem museus e outros locais atraentes. Organizados em grupos, seguem as bandeiras de seus líderes para não se perderem.  

Com o envelhecimento da população, um tipo cada vez mais frequente é o turista geriátrico, que usa sua aposentadoria, poupança ou patrimônio em viagens pelo mundo. Tal tipo de turismo movimenta milhões de pessoas e impulsiona a economia. É positivo para a saúde individual, pois os idosos caminham, se exercitam, conhecem pessoas, lugares e coisas diferentes, animam e alegram suas vidas.
Mas o viajismo excessivo tem altos custos.
Gentrificação ou sobrevalorização de imóveis, expulsão de populações locais para ceder espaço a alojamentos para turistas são problemas locais provocados pelo turismo excessivo, que estressa a capacidade de suporte do ambiente local e pode matar a galinha dos ovos de ouro que traz receitas e renda.
O excesso de turismo em algumas cidades tem gerado a turismofobia. Em Lisboa, o termo terremoturismo compara o efeito do grande terremoto de Lisboa aos impactos hoje provocados pelas ondas de turistas.
O turismo traz consequências negativas para a saúde ambiental. Uma viagem implica em deslocamentos no espaço, provoca gastos de energia e impactos ambientais. O transporte de pessoas e de cargas é uma atividade humana que impacta o clima, especialmente quando utiliza combustíveis fósseis cuja produção, refino e queima liberam gases de efeito estufa.
Cada modo de transporte provoca impactos específicos. Um viajante que se desloca num trem pode emitir três vezes menos gás carbônico do que aquele que viaja de avião num mesmo trajeto.  A aviação é grande emissora de gases de efeito estufa. O tráfego aéreo tem aumentado, à medida que se intensifica o turismo regional e o internacional.
Os impactos das viagens podem ser reduzidos, em parte, por meio de decisões coletivas de investir em modos de transporte ecologicamente amigáveis e energeticamente eficientes.
Cobrar o custo integral de um bilhete, incluindo os custos ambientais, reduziria o viajismo. Durante a Rio+20, ocorrida em 2012, participantes da conferência calcularam a emissão de CO2 e compraram certificados para as neutralizarem. A emissão de 1 ton./CO2 custava R$10,00, quantia que foi paga em máquina de cartão de crédito pelo então chanceler brasileiro e por outros participantes.  Seria possível transformar esse tipo de contribuição voluntária em taxação compulsória para todos? Seria viável aumentar os preços de todas as passagens aéreas de forma a internalizar os custos de emissão de CO2? Seria aceitável encarecer o tráfego aéreo global, internalizando nos preços de passagens o custo ambiental integral? Houve resistências em generalizar essas práticas.  Em 2013 a União Europeia tentou implementar um acordo para que os aviões que circulam na região comprem créditos de carbono para compensar suas emissões poluentes. A reação negativa dos Estados Unidos e de nações em desenvolvimento interrompeu a aplicação desse acordo.
Aumentar os preços de viagens está na contramão do esforço de empresas e de governos para reduzir custos e impostos, aumentar o consumo e incrementar o turismo interno e externo. O mercado também facilita o crédito, para que o cidadão se endivide e gaste em viagens. Além disso, por meio de campanhas publicitárias, os cidadãos são convencidos ou mesmo seduzidos a viajar.  Aumentar o preço das viagens inviabiliza ou dificulta que os mais pobres viajem, mas os ricos continuarão a fazê-lo ainda com mais gosto, pois o viajar converter-se novamente em sinal de status, tornando-se um bem posicional, um privilégio valioso.  
Uma forma de reduzir as viagens de lazer e turismo de longa distância é valorizar o ambiente local no qual se vive, adotando o principio do “quanto mais perto, melhor”. O “turismo quilometro zero” se faz no entorno de onde se mora. Reduz transportes, viagens, deslocamentos.
As modernas tecnologias da informação e da comunicação, com as tele e videoconferências, facilitam a realização de viagens virtuais que dispensam o deslocamento físico, ao transportarem informações, textos e imagens. Parte das viagens de negócios pode, e em certos meios, já é substituída por tais conferências à distância. Navegar na internet também é uma forma de viagem virtual. A pandemia de 2020 sinaliza nessa direção ao reduzir drasticamente o numero de viagens aéreas,  em  cruzeiros marítimos, em trens e coletivos no quis é alto o risco de contágio.
Talvez um dia, quando se fortalecer a era subjetiva, será reduzido o ciclo de intensas viagens pelo ambiente exterior. A introspecção, a meditação, as viagens para o interior psicológico em busca do autoconhecimento poderão  se tornar mais valorizadas, em benefício da saúde pessoal e ambiental.

(*) Autor de Ecologizar e de Meio Ambiente & Evolução Humana  ecologizar@gmail.com

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