sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

Ciclo de leitura sobre Sri Aurobindo - I - A Evolução



Maurício Andrés Ribeiro

Participei do ciclo de leitura sobre Sri Aurobindo[1], realizado em 2018 no Centro de Referência em Educação Integral e Ambiental em Brasília. Foi enriquecedor ouvir e refletir coletivamente os textos selecionados a partir de sua extensa obra de 30  volumes.
Os trinta  volumes da obra completa de Sri Aurobindo.

Éramos cerca de dez pessoas e cada uma lia um trecho.  A leitura pausada, lenta, refletida, ajuda a absorver os significados de modo mais pleno. Os textos por vezes são de difícil leitura, com frases longas e ideias condensadas. As leituras eram entremeadas com a palavra livre para comentários e interpretações, divagações e reflexões. A percepção dos outros joga luz sobre aspectos que para cada um de nós individualmente haviam passado despercebidos. Acontecem sinergias, estímulos cruzados e compreendemos várias ideias. O exercício exigiu capacidade de escuta, paciência e espírito de diálogo.  

Sri Aurobindo era um visionário. Enxergava longe e inventava conceitos e palavras que dessem nome a realidades ainda não nomeadas.

Nas leituras,  situávamos o contexto em que os textos foram escritos: alguns, há várias décadas, outros há mais de um século. Como os clássicos, permanecem atuais na realidade contemporânea. 

Sempre li Aurobindo a partir de meu interesse pela ecologia e pela evolução. Sua mega visão da evolução, simultaneamente combinada com uma valorização do mundo interior, da alma, do espirito, da subjetividade aproximam o micro e o macro, o interior e o exterior.  “A evolução é uma lenta transformação da energia em consciência”, escreveu Sri Aurobindo. Ele descreve a evolução da matéria para a  vida e para a consciência. O ser humano ainda está em sua infância e tem um longo caminho a percorrer.

O Ocidente enfatizou uma visão negativa do homem como lobo do homem, marcado pelo pecado original, pela ambição insaciável.  Esse ser em sua infância é como um anjo que se estraga em sua vida social. No Oriente há visões distintas, enfatizando o Deus que se encontra dentro de nós e que precisa emergir e aparecer. O cumprimento indiano Namasté significa isso: “O Deus dentro de mim saúde o Deus que existe em você.”
Para onde a evolução leva a espécie humana?
 

Evolucionista, Sri Aurobindo inseriu a história humana com seus alguns milhares de anos, na história natural, com ciclos de milhões e bilhões de anos. Muito antes de Yuval Harari fazer isso em Sapiens e em Homo Deus,  isso já estava presente em A Vida Divina, no O Ciclo Humano, em O ideal da unidade humana. Sua visão do tempo é alongada. Ele frequentemente usou a expressão no momento atual, que não trata necessariamente do preciso segundo em que o texto foi escrito, ou do momento em que ele está sendo lido, mas do momento na história humana inserida na história natural em que vivemos. Trata-se de um momento estendido no tempo pois, na história natural, um século pode ser um momento.  Ele  escreve:  “No momento atual a humanidade atravessa uma crise evolutiva em que se esconde a escolha de seu destino; pois foi alcançado um estágio em que a mente humana obteve um desenvolvimento enorme em certas direções, enquanto em outras está paralisada e desorientada e não consegue mais achar seu caminho.” Os textos clássicos têm a qualidade de permanecerem atuais muitos anos depois de terem sido escritos. O distanciamento, o tratamento da humanidade como espécie em evolução, a visão de um astronauta, à distância  e do alto, torna os textos valiosos para o mundo atual.

Sri Aurobindo nos percebeu como seres em transição que têm em si uma centelha divina, capazes de contribuir para construir  e  acelerar a evolução. Uma força universal conduz a história humana, diz Sri Aurobindo, cuja perspectiva sobre a evolução parte do poder do espírito em moldar a matéria. O ser humano é visto com um ser com infinitas possibilidades e potencialidades; para desenvolvê-las precisa trabalhar sobre seu próprio corpo, suas células físicas, para serem capazes de receber a energia que vem do universo e da Natureza.

Se o ser humano é um ser em transição sujeito a uma mutação de consciência, cultural e de comportamento, como propõe Sri Aurobindo, ele transita em direção a que? Qual será a modalidade de ser que o sucederá?  Quais as principais características desse ser emergente que dá seus primeiros passos?



[1] Sri Aurobindo é autor de extensa obra publicada em trinta volumes pelo Sri Aurobindo Ashram Trust, Pondicherry, Índia.

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