sexta-feira, 13 de setembro de 2019

O capitalista não egoísta


Maurício Andrés Ribeiro
 

O capitalismo não existiria sem os capitalistas. Quem são  os capitalistas? São as pessoas físicas ou jurídicas que investem, compram ações e buscam o lucro. Se você é aposentado ou pensionista e um fundo de pensão gerencia suas aplicações, você também é um capitalista.
Os capitalistas em geral desejam o lucro máximo para suas aplicações financeiras. Para isso colocam à frente de empresas e corporações em que investem pessoas capazes de extrair o máximo de lucro com o mínimo de custos. Essas pessoas são em geral remuneradas proporcionalmente ao lucro e dividendos que proporcionam aos donos do capital, os acionistas e investidores. No afã de maximizar lucros muitas vezes praticam a gestão temerária, assumindo riscos para a segurança do trabalhador ou para  a segurança ambiental, e assumindo-se riscos de provocar desastres,. Há exemplos recentes disso na atividade de mineração
Nas relações econômicas a defesa intransigente do lucro, a ganância, a externalização de custos para os demais e a internalização de benefícios são exemplos de comportamentos egoístas. Na busca de internalizar lucros  as empresas externalizam custos que recaem sobre a sociedade de modo difuso e sobre o meio ambiente. Numa contabilidade integral que internalizasse custos muitas empresas deixariam de ser lucrativas.


 
Acionistas  ativistas protestam em frente à sede da Billiton na Austrália após o desastre de Mariana.
Fundos de investimentos que envolvem trilhões de dólares recentemente recomendaram a seus clientes que invistam em atividades que não degradem o ambiente.
Chefes de 130 bancos  que movimentam US$47 trilhões também reafirmam compromissos com sustentabilidade ambiental, proposta que já existia desde o protocolo verde no Brasil e a declaração de Colevecchio.
Será que os capitalistas estão descobrindo que o egoísmo dá prejuízo? Quando perguntei isso numa rede social, varias respostas demonstraram desconfiança e denunciaram que seria greenwashing, maquiagem verde, e desacreditaram de  tais propostas.
Os capitalistas sempre buscam o lucro, mas há sinais de alguma mudança no topo de empresas. Chefes de 181 corporações americanas em 2019 assinaram um documento no qual se comprometem a priorizar os interesses não apenas dos acionistas e investidores ( shareholders) mas também dos demais interessados naquela empresa (stakeholders). Propõem investir nos  empregados, lidar eticamente com fornecedores, apoiar as comunidades em que trabalham e preservar o meio  ambiente, gerar valor para os acionistas.
As diversas partes interessadas numa corporação. Os investidores e acionistas tem sido priorizados sobre os interesses das demais partes.

Pode-se perguntar:
Será veraz esse compromisso ou serão apenas palavras da boca para fora sem materialização prática na realidade?
Os chefes estariam dispostos a abrir mão de suas receitas para beneficiar a coletividade?
As corporações deveriam mudar seus critérios de remuneração dando melhores retornos aos dirigentes que beneficiem a todas as partes interessadas (stakeholders ) e não apenas aos acionistas e investidores ( shareholders)?
Esses dirigentes (CEOs) serão capazes de colocar essas ideias em prática em suas corporações?
Eles serão capazes de contagiar positivamente outras corporações para que abracem tais ideias e atitudes?
Ao assinar tais compromissos,  esses dirigentes de corporações americanas se aproximam dos acionistas engajados ou "concerned shareholders."
O movimento de acionistas engajados aponta na mesma direção do manifesto dos CEOs de grandes corporações: beneficiar todas e cada uma das partes interessadas nas atividades de um empreendimento e não apenas os detentores do capital.  Em contexto em  que os atores externos  não querem ou não podem atuar, um caminho possível é a ação de dentro para fora nas corporações. Os movimentos de acionistas ativistas ou acionistas engajados participam de assembleias das empresas e levam ali suas questões e propostas.
Esses dois movimentos, dos chefes de corporações e dos acionistas ativistas sinalizam para uma convergência pós-egoísta.

Quando os acionistas/investidores, detentores do capital, não forem mais tratados como stakeholders privilegiados e as demais partes interessadas tiverem prioridade, estaremos migrando em direção ao pós capitalismo. A questão central é se é possível migrarmos de comportamentos egoístas para comportamentos pós egoístas seja no capitalismo ou em qualquer outro tipo de contexto socioeconômico. Outros empresários se mexem quando vêm  ameaçados seus mercados consumidores no exterior e partem para uma ação não propriamente altruísta, mas de um egoísmo mais esclarecido e proteger seus interesses. Talvez esse seja um passo intermediário para se evoluir em direção à seva, ação desinteressada.
Os links abaixo sobre acionistas engajados ou acionistas ativistas ( concerned shareholders) informam sobre um tipo de ator que pode ter importância crescente, ao atuar de dentro para fora das corporações, influenciando decisões em assembleias.
Os capitalistas podem estar-se ecologizando. Sinais disso pipocam em toda parte. Ainda sao poucos, mas estao crescendo. Por razões contábeis, econômicas, práticas e de um egoismo mais esclarecido e não por motivações éticas, filosóficas, altruístas. Do emesmo modo como a abolição da escravatura começou pequena e culminou décadas depois com a libertação dos escravos, pode ser que estejamos no inicio de um movimento que um dia poderá dar bons frutos, com a domesticação do capital.












 

 

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