sexta-feira, 12 de abril de 2019

Sri Aurobindo, a Natureza e a consciência ecológica


Maurício Andrés Ribeiro

Nas mais de 14.000 páginas de sua obra completa em nenhum momento Sri Aurobindo escreveu a palavra ecologia., cunhada no século XIX pelo biólogo Ernst Haeckel e popularizada na segunda metade do século XX. Nem por isso ele deixou de expressar o que viria depois a ser chamado de consciência ecológica.
Ele escreveu sobre a Natureza Suprema, (com N maiúsculo) que inclui o Divino e uma Força universal; a natureza inferior, dos fenômenos e da matéria; a natureza universal, o self e a natureza, os seres conscientes e a natureza. Entre as leis da natureza que ele reconhece estão as da unidade na diversidade ( conceitos que usava bem antes de se propagar a ideia da biodiversidade, da sociodiversidade e mais recentemente da noodiversidade). Ele também apontou os condicionamentos de vários tipos que o ser humano sofre, incluindo as influências de seu ambiente.
Onde Sri Aurobindo buscou inspiração para desenvolver suas ideias, quando fala da Natureza e do meio ambiente?  Vivendo num ambiente natural, cultural e social extremamente diversificado como é o da Índia ele incorporou a importância da diversidade,  da harmonia e da união dos opostos.  Ele estudou  a cultura Indiana milenar, os Vedas, os Upanishads, a Bhagavad Gita, nos quais está presente a cosmovisão  ecológica de uma civilização que sacralizou a natureza, enxergou a presença de Deus nos animais, nas plantas, nas águas e no próprio interior do ser humano com sua centelha divina ( o cumprimento tradicional indiano, o Namasté, significa que o Deus que  habita em mim saúda o Deus que habita em ti).
Sri Aurobindo escreveu muito sobre os fundamentos  da cultura indiana
Ele expressa visão evolucionista: “Sabemos que há uma evolução, mas não o que a evolução é; isso permanece ainda como um dos mistérios iniciais da Natureza.” Sobre a evolução humana ele diz que “No ser humano, a evolução se torna autoconsciente – só ele pode fazer voluntariamente aquilo que a natureza faz de forma espontânea, subconsciente.”
Em sua obra se encontram ideias que expressam profunda consciência ecológica e que apresentam grande afinidade com a perspectiva das ciências ecológicas, especialmente com os campos da ecologia cósmica,  da ecologia espiritual, da ecologia humana, da ecologia profunda, da ecologia do ser, da ecologia interior, da ecologia transpessoal.

A Biomimética propõe aprender a viver com a natureza.

A Enciclica Laudato Si propõe o cuidado com a casa comum, na perspectiva da ecologia integral.
Seus textos visionários foram escritos há várias décadas. Visões  que emergem no ocidente se aproximam daquelas  expressadas por Sri Aurobindo. Pensadores ocidentais como Peter Russell ( O cérebro global, O Buraco branco no tempo), James Lovelock (Gaia), Ken Wilber (  espiritualidade integral, a visão integral que se aproximam do yoga integral de Sri Aurobindo), Edgar Morin,  Henri Bergson; o Papa Francisco  e sua encíclica Laudato Si, que  tentou atualizar o catolicismo na perspectiva da ecologia integral pioneiramente pensada por Pierre Dansereau ( e sua escalada da relação humana com o ambiente), Pierre Weil ( que escreveu sobre a Arte de Viver em Paz e sobre a fantasia da separatividade entre nós e a natureza); Vladimir Vernadski e Pierre Teilhard de Chardin ( a noosfera, a evolução e o ponto Ômega); a  ecologização de tudo ( ver o blog Ecologizar e os escritos de Bruno Latour); entre muitos outros. Emergem questionamentos ao antoropocentrismo e  perspectivas biocentricas e ecocentricas que propõem aprender a viver de acordo com a Natureza.
Pierre Dansereau e Teilhard de Chardin escreveram sobre a noosfera.
Ecologizar, o verbo da vez, nas palavras de Bruno Latour.



Sri Aurobindo valorizou a tecnologia ao escrever que "A ciência tem imensa importância não porque ela descobre os segredos da natureza para o avanço do conhecimento, mas porque os utiliza para a criação de máquinas e desenvolve e organiza os recursos econômicos da comunidade."(15-464)
No mundo contemporâneo há práticas baseadas na natureza, no design e na arquitetura tais  como, por exemplo,  a biomimética, que imita os padrões e processos naturais no design. A natureza oferece  exemplos de como inspirar a criação de  produtos e  processos.  Janine M. Benyus mostra como esse campo do conhecimento da  Biomimética poderá transformar as descobertas em muitos campos da atividade humana – informática, medicina, produção e distribuição de energia, economia e negócios, e a alimentação do planeta.

Há exemplos na agricultura ( na permacultura, na agrofloresta, na agricultura orgânica); nas práticas e inovações em Auroville., cidade-laboratório localizada no sul da Índia inspirada pela visão  de Sri Aurobindo.
A planta de Auroville inspirada na espiral da evolução.
 Essas  abordagens práticas ou teóricas que emergem a partir da segunda metade do século XX como sementes de pensamento ecológico  convergem com as palavras e textos escritos sobre a Natureza por Sri Aurobindo na primeira metade daquele século.  
Ademais, a própria vida reclusa de Sri Aurobindo em Pondicherry, focado na reflexão, sem deslocamentos e seu modo frugal de existência  produziu uma leve pegada ecológica, em sintonia com os valores da ecologia espiritual contemporânea.


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