terça-feira, 19 de novembro de 2019

Dharma, a palavra da Índia para o mundo.

Enquanto outras civilizações ascenderam, tiveram seu apogeu e decairam, a Índia se sustentou baseada em seu Dharma
Maurício Andrés Ribeiro 

Ao passarmos os olhos pela história das nações, podemos sentir ressoar da boca coletiva do povo esta palavra que, expressa em atos, constitui a contribuição de cada nação para uma humanidade ideal e perfeita. Para o antigo Egito, tal palavra foi Religião; para a Pérsia, Pureza; para a Caldéia, Ciência; para a Grécia, Beleza; para Roma, Lei, e para a Índia - o mais velho de seus filhos -, para a Índia, Ele concedeu uma palavra que a todas resumia, a palavra Dharma. Eis a palavra da Índia para o mundo.

                                        Annie Besant, in Dharma  

A palavra Dharma tem múltiplos significados e definições. Um deles se relaciona com a sustentabilidade. Entre todas as civilizações, a indiana  é a mais sustentável.  O Dharma ajuda a explicar como aquela civilização se sustentou durante milênios e não entrou em colapso, como ocorreu com outras civilizações que não tiveram a capacidade de se sustentar, tais como a grega, a egípcia,  as dos incas, maias e astecas. A civilização indiana acumula um tesouro de saberes úteis para um mundo que perde aceleradamente suas condições de sustentabilidade. O conceito de dharma é fecundo no atual contexto em que se valoriza o que é sustentável. Dharma tem, nesse sentido, uma relação direta com as questões da sustentabilidade. Ao exercer seu dharma, a espécie humana pode buscar meios para  sustentar-se  nessa era em que  se anunciam colapsos e limites do planeta.
O Dharma é um dos tesouros imateriais indianos. O substantivo provém do sânscrito dhr, que significa sustentar, carregar: “É a lei, aquilo que sustenta, mantém unido ou erguido” observa Heinrich Zimmer, no seu livro Filosofias da Índia. Dharma é “o ‘suporte’ dos seres e das coisas, a lei da ordem em sua maior extensão, isto é, a ordem cósmica.”.   [2] LEMAITRE. Hinduísmo ou Sanatana Dharma, p.76.
O ex-presidente S. Radhakrishnan, em livro sobre a visão hindu da vida diz que “Dharma sustenta os meios os quais prendem uma coisa e mantém sua existência. Toda forma de vida, todo grupo de homens tem seu dharma, que é a lei do seu ser. Dharma ou virtude está em conformidade com a verdade das coisas; adharma ou vício é a oposição disto.”[1]
Cada um de nós nessa vida tem seu dharma, sua missão ou tarefa a cumprir.  
Swami Dayananda esclarece a importância do autoconhecimento e da autoconsciência, bem como a relevância da ação bem realizada: “Como não há um certo absoluto e nem um errado absoluto nesse mundo relativo, o senso de dharma tem que crescer dentro de cada um. Uma pessoa que entende o dharma pode decidir sobre uma ação apropriada a qualquer situação, assim como o bom motorista sabe como comportar-se em qualquer nova situação do tráfego. [...] O dharma é a justiça ideal que se fez vida; a virtude é medida pela perfeição atingida por cada um no exercício do seu papel”.[2][10] 
Dayananda observa que “De acordo com o dharma, a ação humana tem um resultado invisível bem como um resultado imediato e tangível. O resultado invisível da ação soma-se de forma sutil na conta do ‘fazedor da ação’ e, com o tempo, frutificará, tangivelmente, para ele como uma experiência ‘boa’ ou ‘má’ - algo prazeroso ou doloroso.”[3] Para ele, uma boa ação frutifica como prazer e uma má ação frutifica como dor ou sofrimento. No campo da ação, há uma relação do dharma com o conceito de carma (ou karma).
O dharma é, no dizer de Sri Aurobindo, a lei do ser, padrão de verdade, regra ou lei da ação; é a forma como o povo indiano concebe a conduta religiosa, social ou moral. Dharma significa cada ideal que podemos nos propor e a lei do seu trabalho e da sua ação.”16-175  Sri Aurobindo
O dharma pode ser visto como um fator de agregação, que evita a fragmentação de uma pessoa ou civilização.
Uma declaração universal do dharma humano e sua aplicação prática poderiam  ser um passo relevante para lidar com a emergência climática, ecológica e ambiental que desafiam o mundo contemporâneo.



[1] RADHAKRISHNAN. A visão hindu da vida. Rio de Janeiro: Edições MM, 1971. .(pg.69)
 
[2] DAYANANDA, Swamy, the teaching of the Bhagavad Gita, p.20.
 
[3] DAYANANDA, Swamy, Introduction to Vedanta, p.10.
 

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