sexta-feira, 12 de julho de 2019

A arte e a Essência para além das aparências


Maurício Andrés Ribeiro

O fotógrafo Sebastião Salgado, em depoimento a Dráuzio Varela, ressaltou que depois de viajar,  observar e fotografar em muitos países,  fez uma viagem para dentro de si mesmo. Constatou que para além da diversidade das aparências há uma  essência que é a mesma, que fronteiras são artificiais e que somos  parte  de um todo e o mesmo ser humano, com o mesmo comportamento básico.
A família do homem - a unidade humana vista por fotógrafos
Nos anos 60 uma grande exposição de fotografias sobre a família do homem (The Family of man) no MoMA de Nova Iorque retratava a diversidade de tipos, rostos, culturas humanas e propunha  que acima disso estava uma unidade, a da espécie.
Por meio da fotografia,  forma de expressão artística que retrata a diversidade do mundo percebido pelo olhar humano, se constata que para além das aparências há uma unidade, uma essência comum na família humana. Se a  visão analítica tende a separar, a visão sintética permite superar  o nível básico das diferenças para encontrar denominadores comuns essenciais.
Durante toda minha vida convivi com uma artista espiritualizada, minha mãe, que fez essa jornada em busca da essência. A perspectiva macro e evolutiva, a fraternidade universal  e ao mesmo tempo familiar, o aprendizado permanente e progressivo, o respeito à liberdade de visão de cada um estão expressos em seus escritos. Maria Helena busca a essência em sua arte e em sua capacidade de enxergar para além das aparências da realidade sensível.  Ela afirma que  a verdadeira essência da arte  é  libertar a mente das tensões e conflitos e penetrar no recinto do sagrado, alcançar o invisível, aquilo que está por detrás de todas as aparências. Ela constata as diferentes fragmentações que tentam sobreviver sob o mesmo céu e mostra a importância de “quebrar os departamentos que desejam empacotar a verdade em pratos feitos, fazer desaparecer por completo o EU e o TU, para apenas permanecer a ESSÊNCIA.” Em busca da síntese e da integração ela escreve que “A síntese Oriente–Ocidente e a integração planetária estão dentro de nós mesmos, no equilíbrio do lado direito e esquerdo de nosso cérebro, razão e intuição. A harmonização desses dois aspectos de nossa individualidade torna-se cada vez mais uma necessidade no campo da consciência. Já não se trata somente da integração do planeta, mas do retorno à Essência de onde viemos e para onde vamos.”

Painel A dinâmica do cosmos na UNIPAZ-DF por Maria Helena Andrés
Um dos iogues mais lúcidos, Sri Aurobindo reconheceu esse objetivo da Arte: “Seria objetivo da Arte (numa sociedade espiritualizada) não somente apresentar imagens do mundo subjetivo e objetivo, mas vê-los com a visão significante e criativa que há atrás das aparências e revelar a Verdade e a Beleza das quais as coisas visíveis e invisíveis para nós são as máscaras e símbolos de figuras significantes.“ (v.15 -241) “Atrás das aparências do universo há a realidade do ser e da consciência”  Ele escreveu sobre a essência e as aparências: “A razão humana tem uma dupla ação: misturada ou dependente, pura ou soberana. A razão aceita uma ação misturada quando se limita ao círculo de nossa experiência sensorial, admite sua lei como verdade final e se ocupa apenas com o estudo de fenômenos, ou seja, com as aparências das coisas em suas relações, processos e utilidades. Essa ação racional é incapaz de conhecer o que é, ela conhece apenas o que parece ser; ela não tem uma sonda com a qual explorar as profundezas do ser, ela pode apenas explorar o campo do devir. Por outro lado, a razão afirma sua ação pura quando, aceitando nossas experiências sensíveis como ponto de partida, mas recusando-se a ser limitada por elas, vai além, julga, trabalha conforme sua própria lei e se esforça para chegar a conceitos gerais e inalteráveis que se apegam não à aparência das coisas, mas àquilo que permanece por trás de suas aparências. A razão pode chegar aos seus resultados pelo julgamento direto, ao passar imediatamente da aparência àquilo que permanece inalterado por detrás e, nesse caso, o conceito ao qual ela chega pode parecer um resultado da experiência sensível, dependente desta experiência, embora na realidade seja uma percepção da razão trabalhando conforme sua lei própria. “ (A Vida Divina, Livro I, capítulo 8).

Ele conclui: “... diz-se que na história é sempre o inesperado que acontece. Mas não seria o inesperado se os homens pudessem tirar os seus olhos da superfície e olhar para a substância, se eles se acostumassem a colocar de lado as aparências e a penetrar além delas na realidade secreta e disfarçada, se eles parassem de ouvir o barulho da vida e, ao invés, ouvissem o seu silêncio.”

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