sexta-feira, 7 de agosto de 2020

Pandemia, segurança e riscos


Maurício Andrés Ribeiro

 A pandemia acelerou a consciência sobre os perigos  que ameaçam a sociedade e os indivíduos.

Vivemos na sociedade do risco, escreveu o sociólogo Ulrich Beck. Ele nota que riscos estão crescentemente associados a causas globais inicialmente  invisíveis. A percepção do dia a dia é insuficiente para identificá-los. A vida prática real torna-se cega e incapaz de gerar as defesas necessárias diante deles. É necessário conhecimento técnico especializado para compreender o mundo e saber como lidar com ele. Por virem de dimensões pouco perceptíveis aos sentidos humanos (vírus, radiações atômicas) depende-se cada vez mais de ciência (matemática, química, física, biologia) e tecnologia (microscópios, radiômetros etc) para detectar tais ameaças.

A ciência e a tecnologia são valiosas para lidar com novos riscos imperceptíveis pelos sentidos humanos, tais como os virus e as radiações.

Para proteger a população dos vírus os  epidemiologistas, infectologistas, patologistas, imunologistas e profissionais da saúde são convocados por governos. Eles detêm conhecimento especializado  para lidar com as situações, reduzir os danos à vida e orientar sobre as medidas de controle para evitar sua propagação. Revaloriza-se então o conhecimento prático, como lavar as mãos e colocar máscaras. Medidas de isolamento físico e de higiene são adotadas, aceleram-se pesquisas e estudos para compreender a doença e para produzir vacinas.

A produção e distribuição de riscos prejudica os mais pobres.  A vulnerabilidade e a exposição a riscos se distribuem desigualmente na sociedade,  prejudicando mais os menos capazes de se protegerem. Na escala local de uma cidade, pessoas nas periferias não tem condições de fazer quarentena e  isolamento físico, por necessidade de trabalhar e ganhar o pão de cada dia ou por falta de espaço. Elas se viram como podem e se expõem a riscos.

Pandemias, mudanças do clima, incêndios, furacões,  enchentes, secas são eventos críticos nesse estágio da evolução, o estágio terminal da era cenozoica. Mudanças de temperatura alteram o  ciclo da água e potencializam eventos críticos. 



A noção de segurança precisa ser ecologizada e hidratada. A concepção de segurança é reconceituada e a biossegurança torna-se tema central, juntamente com as questões  de segurança ecológica, segurança climática, segurança hídrica, segurança alimentar, emergências que estão na origem e na raiz de outras formas de insegurança pública, econômica, social, política.

Numa abordagem proativa, aprender como prevenir futuras pandemias (por exemplo protegendo habitats de animais silvestres, alteando o relacionamento humano com os animais) é um modo econômico e ecológico de lidar com  a segurança biológica. Mais estratégico do que atuar sobre os eventos críticos depois que ocorreram é desenvolver ações preventivas, de alerta precoce, proativas, de planejamento e gestão, que reduzam a possibilidade de ocorrência de desastres e que evitem o sofrimento social.

O princípio da precaução, presente na Declaração do Rio de 1992, afirma que, na ausência da certeza científica formal, a existência de risco de um dano sério ou irreversível requer medidas que previnam este dano. Esse princípio garante contra riscos potenciais que, de acordo com o estado atual do conhecimento, não podem ser ainda identificados.  Defender-se de tais riscos  e desastres, por meio de ações preventivas e não apenas reativas depois que já  ocorreram, pode fazer a diferença entre a vida e a morte, a diferença entre maiores ou menores prejuízos econômicos e sociais.

Os governos e populações locais têm um grande papel potencial nas ações para prevenir emergências e precisam ser desalienados e conscientes de suas responsabilidades. Diante dessas realidades emergentes  é sábio capacitar os agentes de defesa para lidar com a segurança biológica, ecológica, climática e ambiental e prover os recursos necessários para enfrentar os novos riscos a que estão expostas as populações.

No meio da neblina da pandemia é pouco previsível o que está à frente,  além da sensação de que atravessamos uma zona de turbulência na história natural e na história humana. Sabemos que tudo passa e os ciclos do tempo mostram um pêndulo que oscila do caos à ordem e novamente ao caos, num movimento caórdico, que é o padrão na evolução.

No meio da pandemia há por um lado um cenário distópico em que se visualiza o colapso, a extinção, catástrofes, desastres, o impulso para a morte e a busca de salvação em protetores externos. Esse cenário traz o desejo de voltar a um passado bucólico imaginário –  fechamento, tribalismos, nacionalismos e ao medo do futuro. Por outro lado, há o cenário de uma utopia possível com mais solidariedade, cooperação construtiva, coevolução, unidade humana e com as demais espécies vivas. Paciência e prudência, calma, coragem  e confiança são atitudes sensatas diante da pandemia.

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