Maurício Andrés Ribeiro
Numa emergência médica, o paciente vai para um pronto socorro onde recebe os primeiros cuidados. Sendo grave o seu estado, ele é internado numa Unidade de Tratamento Intensivo – UTI, monitorado com aparelhos sofisticados e atendido por médicos especializadas. Quando melhora, é levado para uma unidade de tratamento semi-intensivo e depois para um quarto. Quando recebe alta, vai para casa e lá continua seu tratamento.
Nas emergências hídricas, na iminência de um colapso no
abastecimento, o pronto socorro é feito em salas de crise. Salas de crise são
criadas quando se acendem sinais de alerta ou alarme nos dados de chuva e
vazão que são coletados sobre as bacias
brasileiras. Desde que foram criadas, realizaram-se
netas centenas de reuniões. Ali acumulou-se experiência em lidar com eventos críticos e em resolver conflitos. São
eficientes para o tratamento de
emergências e urgências.
As salas de crise
atuam com um horizonte de tempo curto,
que inclui os próximos dias ou semanas, em função da situação conjuntural e
das circunstâncias.
Elas são espaços
para encontros híbridos, virtuais e presenciais, nos quais participam os
principais atores e instituições relacionados com a gestão da água numa bacia
que entrou em estado crítico, seja por falta ou excesso dela. As abordagens variam, conforme as
características de cada bacia: em alguns casos é necessário mudar a operação de
reservatórios para liberar ou reter água (São Francisco, Paraná, Tocantins). Em
outros casos, lida-se com as secas e as enchentes (rio Madeira, Pantanal) e
suas consequências, como por exemplo a interrupção de rodovias ou os incêndios
florestais.
Nas salas de crise se divulgam informações
qualificadas. O CEMADEN - Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres
Naturais, com visão interdisciplinar e aplicada, apresenta as perspectivas para os próximos dias. O ONS
- Operador Nacional do Sistema Elétrico - apresenta como os reservatórios estão
sendo operados nos vários subsistemas regionais no Brasil e o quanto de energia
está sendo exportada ou importada de um sistema para o outro. O INEMET - Instituto
Nacional de Meteorologia faz previsões do tempo para os próximos dias e semanas
a partir de modelos europeu, americano e outros. Fazem-se previsões climáticas,
avaliam-se as perspectivas de chuvas e a chegada de frentes frias, num
horizonte previsível de 15 dias. Na
medida em que se aprimoram os modelos climatológicos e meteorológicos
reduzem-se as imprevisibilidades.
A base de informações de boa qualidade é fundamental, para que a partir
dela se construam os consensos necessários. No início de cada reunião das salas de crise, são expostos
com objetividade os dados e informações relacionados com a chuva e a vazão
naquela bacia nos próximos meses. Esse nivelamento prévio de informações entre
os participantes oferece um patamar comum a partir do qual podem-se propor como
solucionar os problemas
diagnosticados. Fala-se em
linguagem técnica, com todo um vocabulário de hidrologuês:
modelagens, curvas de segurança, afluências e defluências, modelo curva-vazão,
afluências incrementais, evaporação em reservatórios. Apresentam-se gráficos, mapas, modelos, cenários climatológicos, meteorológicos e
previsões. Fala-se em energia armazenada
e energia excedente, em região importadora e exportadora de energia, fechamento
e abertura de comportas em reservatórios, simulações, vazão prevista, política
de defluência, perspectiva de evolução do volume do reservatório.
Enquanto há crises
e emergências, a frequência de reuniões precisa ser maior, diária ou semanal,
pois a agilidade é essencial para enfrentar situações mais graves. Quando passa o período crítico, a sala de crise se transforma numa sala
de acompanhamento. É quando a bacia hidrográfica sai da UTI e vai para um
tratamento semi-intensivo, com monitoramento para acompanhar seu estado de saúde.
Tanto nas salas de crise como nas salas de acompanhamento uma informação
crucial é sobre a água em estado meteórico. A água na atmosfera é o
elemento fundamental nessas análises pois ela influi nas águas superficiais,
nas cheias e secas. Compreender a água na atmosfera é uma ciência cada vez mais
estratégica.
As salas de crise foram testadas
durante anos e constituem uma experiência positiva em lidar com eventos
críticos e com emergências hídricas. Até o presente, nas
salas de crise não se propõe interferir na
quantidade de água na atmosfera por meio de geoengenharias ou hidro engenharias,
bombardeamento de nuvens etc. Entretanto, no futuro, pode ser que o
gerenciamento integral do ciclo da água venha a incorporar esses instrumentos e
técnicas.
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