Maurício Andrés
Ribeiro
Um efeito colateral da pandemia é o regresso
às aldeias, liberando espaço nas cidades. Com a descentralização e a
necessidade do isolamento físico, ganham relevo as ecovilas, as comunidades
rurbanas, as vilas rurais.
Depois de
décadas de urbanização acelerada no mundo inteiro, e mais ainda no Brasil, o
pêndulo caórdico da evolução oscila para o outro lado, o da desurbanização e da
descentralização. Esse movimento pendular é facilitado pelas novas tecnologias
da informação e da comunicação e impulsionado pelos menores custos para se
viver em pequenas cidades e no interior. Nas grandes cidades as áreas mais bem equipadas
com infraestrutura estão gentrificadas e expulsam quem não tem condições de
pagar os altos preços para viver ali.
Essa
tendência à desurbanização é um atrativo especial para idosos empobrecidos num
mundo com previdência social em crise e que maltrata os velhos urbanos.
Há outros benefícios dessa tendência, como a maior proximidade com o ambiente natural e maior facilidade para o isolamento físico, o que não significa maior o isolamento social, pois no século XXI as conexões sociais se estabelecem via internet e redes.
Há outros benefícios dessa tendência, como a maior proximidade com o ambiente natural e maior facilidade para o isolamento físico, o que não significa maior o isolamento social, pois no século XXI as conexões sociais se estabelecem via internet e redes.
Há várias décadas o Vila
Rural foi um programa pioneiro do Paraná
para redistribuir a população e aliviar pressões migratórias sobre as cidades.
Assentamentos de cinquenta a cem famílias em vilas cercadas por terrenos para
cultivo são localizados nas proximidades dos distritos e povoados. O uso da
escola, do posto de saúde e de equipamentos coletivos é compartilhado com a
população das vilas rurais. Evitando-se a
localização das vilas rurais próximas de grandes cidades, elas são mais viáveis
porque a terra é barata; funcionam melhor porque não se tornam cidades-satélites
ou dormitório de metrópoles. Os trabalhadores rurais têm condições de exercer
sua profissão de plantar. Como não estão dispersos em fazendas isoladas, têm
acesso aos serviços públicos. Cria-se cultura urbana num assentamento rural, e
a proximidade física entre as casas dá proteção, segurança e economia de
infraestrutura. Quando tiverem sido
implantadas muitas vilas rurais, haverá um amplo contingente de população fixado
no campo. A distribuição espacial da população terá reduzido a dispersão rural
e o congestionamento urbano. A organização do espaço será energeticamente mais
eficiente, já que cada vila rural poderá abastecer-se, no entorno, com água,
materiais de construção, fontes de energia e alimentos locais, o que reduz a
demanda de transporte de longas distâncias. A longo prazo, pode-se constituir uma rede de assentamentos conectados
entre si, num padrão de organização espacial equilibrado e econômico.
A atual e as próximas pandemias fortalecem essa tendência à desurbanização em direção a um padrão territorial organizado numa rede de milhares de pequenas vilas e cidades de modo descentralizado. . Ao implantar o programa das vilas rurais, o Paraná resgatou um padrão de assentamento que se mostrou energeticamente eficiente e sobreviveu por milênios.
A atual e as próximas pandemias fortalecem essa tendência à desurbanização em direção a um padrão territorial organizado numa rede de milhares de pequenas vilas e cidades de modo descentralizado. . Ao implantar o programa das vilas rurais, o Paraná resgatou um padrão de assentamento que se mostrou energeticamente eficiente e sobreviveu por milênios.
Esse padrão é similar
àquele que se estruturou durante milênios na Ásia. Na Índia, 60% dos seus mais
de 1 bilhão e 300 milhões de habitantes vivem numa das 600 mil aldeias que
pontilham o território do país e que são semiautônomas no abastecimento de
água, energia, alimentos, materiais. Na hipótese de um colapso no abastecimento
de combustíveis fósseis, estão menos vulneráveis do que as metrópoles
energívoras. Na hipótese de uma pandemia como a que assola o mundo em 2020, essas
aldeias são menos vulneráveis à propagação do vírus, o que talvez ajude a
explicar os baixos números de casos e de
mortes na pandemia de 2020 na Índia, se comparados com os números que acontecem
em outros países aparentemente melhor equipados e estruturados para lidar com a
pandemia.
Kenchankuppe é uma das 600 mil aldeias indianas em que vivem 800 milhões de pessoas. |
Crianças indianas comemoram a doação de livros para sua escola. |
Aula ao ar livre numa escola na aldeia de Kenchankuppe no sul da Índia. |
Na França e na
Alemanha, as pequenas cidades são as que mais se valorizam nessa pandemia, ao
passo que as grandes cidades, saturadas, poluídas e com altos custos de infraestrutura,
vêm perdendo população. Ao redor de cidades como Milão configuram-se redes de
pequenas cidades com alta qualidade ambiental e com menos custo energético.
Essa desurbanização é um processo
de ajuste de longo prazo em direção a uma sociedade energeticamente mais eficiente
e que antevê o declínio da era dos combustíveis fósseis. De fato, a cidade que
hoje se constrói ainda é rígida o suficiente
para que, daqui há cinquenta anos, suas construções estejam de pé. Naquele momento,
a disponibilidade de petróleo será menor, seu preço será mais alto do que é
hoje, a consciência sobre os impactos ambientais e climáticos de seu uso será
maior e também será maior a consciência sobre os riscos a que está exposta a saúde de seus cidadãos,
especialmente os mais vulneráveis.
Vilas rurais, ecovilas ou comunidades rurbanas podem vir a se constituir no padrão de
assentamentos mais adequado a uma
civilização pós-petróleo e que tome medidas preventivas em relação às próximas
e futuras pandemias.
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