sexta-feira, 24 de julho de 2020

Aprender ou morrer


Maurício Andrés Ribeiro

A epidemia acelera a aprendizagem humana. Com isso, impulsiona transformações no mundo e no rumo da história. Todos estão aprendendo velozmente como se adaptar às novas rotinas das quarentenas, dos distanciamentos e dos lockdowns.
A aprendizagem mais imediata é voltada para  viver, reduzir riscos e manter a saúde. Para isso aprendem-se conhecimentos práticos de higiene: como lavar as mãos, como mudar posturas corporais e cumprimentos tradicionais; usar acessórios tais como máscaras; exercitar o distanciamento físico de outras pessoas, possíveis transmissoras de vírus.
Nessa nova rotina foi preciso aprender a como usar o tempo, escalonar e priorizar tarefas e temas. É necessário  aprender com leveza, evitando  gastar esforço e recursos  com ideias que não conduzem ao bem estar e que enfatizem a competição sem colaboração; focar no essencial, na aprendizagem daquilo que importa e descartar o que é supérfluo.
As quarentenas estimulam um estado de alerta, vigilância e atenção diante dos riscos da doença e proporcionam tempo para estudos e reflexão. Ao ficar em casa, aprende-se como estudar remotamente, como operar com os sistemas informatizados, como acessar conteúdos em vídeo e texto no celular e nos computadores, como participar de lives e webinars.  Tal habilitação se tornou essencial.
Cada profissional adapta suas atividades: comerciantes aprendem a vender por delivery e a anunciar seus produtos on line; artistas aprendem a fazer lives; pesquisadores aprendem a atuar em webinars.
As formas  de educar  passam  por transformação  durante a pandemia e as quarentenas.  Com o isolamento físico,  suspenderam-se aulas em escolas e muitas crianças e adultos aprendem em casa. Um efeito colateral da pandemia foi acelerar a modernização na educação. O vírus deu uma chacoalhada na inércia e no comodismo  nesse campo.
Os professores e alunos se adaptam. Acelerou-se a alfabetização digital usando o zoom, meeting, YouTube, Skype e outras mídias; acelerou-se  o intercâmbio e aprendizagem mútua, com o compartilhamento de boas práticas de educação remota que uns já dominam e outros professores ainda não. Lidar com as tecnologias é habilidade que os professores  precisam ter para dar aulas remotamente. Isso demanda infraestrutura, equipamento, assistência técnica, softwares e acesso à rede como instrumentos de trabalho. Professores aprendem a lidar com celulares, tablets e computadores, como adaptar suas aulas para que sejam instrutivas e atraentes e não afastem  seus estudantes. Nessa educação mediada pela tecnologia ressalta a  importância dos professores  em carne e osso.
Estudantes aprendem a usar as novas tecnologias nos celulares e computadores e a prestar atenção aos conteúdos transmitidos. Alunos em casa recebem aulas de música, pilates, ginastica, yoga.
Esse impulso na aprendizagem, dado de fora para dentro pelo vírus, pode induzir a uma modernização permanente dos sistemas de educação. Esse avanço precisa impulsionar os governos para proverem a infraestrutura necessária, com computadores e acesso à internet e para que não seja revertido quando passar a fase crítica da pandemia. Que seja  internalizado, com todos os seus ganhos de democratização da educação e ganhos ecológicos associados.
Aula ao ar livre em Kenchankuppe, India.
Isso envolve mudanças no  modo de aprender nas escolas e fora delas. A educação ao ar livre saudável, com ventilação e insolação natural, dispersa os vírus. riscos de contaminação na volta às aulas presenciais, elas próprias precisam ser redesenhadas para manter o distanciamento físico. Minhas netas na fazenda  aprendem a conviver com a natureza, nomes de plantas e arvores, convivem com bichos, tomam leite de vaca no curral. Aprendem também a educação sanitária, como lavar as mãos,  como  se proteger. Convivem com primas e se sujam na terra, são felizes. Não têm a escolinha bilingue que tinham na metrópole, o que é compensado pelo tipo de aprendizado que desfrutam no  ambiente rural.
Os profissionais da saúde têm o desafio de atender os doentes, não se contaminar e não se  deixar levar por cansaço ou desespero diante da tragédia sanitária e das mortes que presenciam diariamente.  A proximidade da morte  ensina as pessoas  a serem mais cientes de sua fragilidade e vulnerabilidade, a serem mais humildes, mais solidarias, com maior sentido da unidade humana e da ajuda mútua. A serem menos arrogantes, menos egoístas. Há exceções, aqueles espertinhos que tentam se aproveitar e tirar vantagem da situação em proveito próprio, a usar seu poder econômico para se apropriar de recursos deixando os demais para trás. Mas esses tipos de atitudes são crescentemente reprovados e denunciados, gerando constrangimentos a quem os pratica. A percepção da fragilidade da vida e sua vulnerabilidade  podem levar  a mudanças de atitudes, especialmente na educação e na saúde.
Coletivamente, em aproximações sucessivas e por tentativa e erro, a sociedade aprende quando abrir e  fechar as atividades econômicas, avaliar o risco de um lockdown continuado para a economia  e qual o risco da circulação para a saúde das pessoas. Os governos, empresas e pessoas aprendem a lidar com essa nova situação. Todos aprendem sobre o vírus, os modos de combatê-lo e de prevenir futuras pandemias. Acontece um grande processo pedagógico, a pedagogia do susto, do choque, do inesperado que ensina rapidamente.
Aula de Yoga em  escola no Sri Aurobindo Ashram, New Delhi, India.
Uma transformação da consciência  por meio da educação  é necessária para lidar com as mudanças no ambiente externo e criar condições para nos adaptarmos a elas. 

A epidemia evidencia desigualdades, injustiças, a unidade humana e sua interdependência, a necessidade da solidariedade, de empatia, a presença do trágico. Esse aprendizado é valioso na atual circunstância e pode ser valioso para as futuras pandemias, mudanças do clima e outras encrencas que virão. No limite, é aprender ou morrer!

 

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