O Grito - Edward Munch |
O medo é uma emoção
primitiva expressa por animais e seres humanos. Diante do perigo representado
por um predador, um animal ou uma pessoa
humana pode fugir ou lutar. Dessa decisão pode depender sua sobrevivência. Feras acuadas não têm a opção da fuga. Usam os
recursos à sua disposição e atacam ferozmente para se defender. Usam sua força e agressividade para sair da situação
em que se encontram. Cutucar a onça com vara curta é perigoso, diz a sabedoria
popular.
O medo se inicia na mente
e ativa várias partes do cérebro a partir de um estímulo estressante ou
assustador. A resposta do corpo é inconsciente.
Um rato fica paralisado
diante da cobra que vai devorá-lo. O sistema nervoso libera hormônios e adrenalina na corrente
sanguínea. A emoção e o pensamento de medo levam o corpo a suar, empalidecer, tremer. Quando
criança eu suava frio e desmaiava na cadeira do dentista. Anos depois, tomei
consciência de que a causa do
medo era a perspectiva de sentir dor. Isso tensionava o corpo e o levava a mudar seu
estado de consciência, da vigília para a inconsciência do desmaio. A partir do momento em que
tomei a decisão de não ter mais medo da dor, nunca mais desmaiei no dentista. A força da vontade mental controlou a emoção
negativa e eliminou a reação física do desmaio. A respiração se acelera, o
coração dispara, aumenta a pressão arterial, as pupilas se dilatam, músculos se
tornam mais rígidos, os pelos da pele se arrepiam, há calafrios, pois a pele se
esfria e as artérias liberam mais sangue para os músculos agirem, liberam-se os
esfíncteres. Defecar nas calças é uma reação do corpo ao medo.
Pierre Weil estudou os
chacras ou centros energéticos do corpo, sendo que o primeiro deles se
relaciona com a segurança, categoria que “está ligada ao sistema ou instinto de
defesa do indivíduo identificado com as necessidades do seu corpo físico.
Proteção contra as intempéries, alimentação, locomoção, defesa contra agressões
são as necessidades essenciais ligadas a esta categoria. Medo e raiva são as
emoções destrutivas deste centro.”[1] O chacra da segurança é o
mais básico e rege o medo e a coragem. Sente-se medo por preocupação com a própria segurança. Há gradações dessa
emoção, do estresse à ansiedade, à preocupação, até o pânico, o pavor, a paranoia. O pânico pode provocar agressividade,
violência, em busca de manter a segurança e o status quo.
O mestre indiano
Sri Aurobindo considera o medo uma reação vital que
nubla a inteligência, tira a presença de espírito e impede a pessoa de enxergar
a coisa certa a fazer. Para
dissolvê-lo pode-se usar a mente para raciocinar, explicando que o medo é um
perigo em si mesmo. Se existe um perigo real, é somente com o poder da coragem
que se pode escapar dele. Mira Alfassa, a Mãe, que coordenou a construção de Auroville,
no sul da Índia, afirma que na raiz do medo está o egoísmo bem como a falta de confiança
espontânea no destino. Quando se tem fé e se entrega para o Deus o medo evapora. “O medo é um tipo de angústia
que vem da ignorância”.
A ecologia do ser estuda os seres vivos no ambiente e as relações
entre o corpo, os pensamentos, sentimentos e emoções. Uma visão integral considera que o ser humano
também dispõe de alma e espírito. Quem vive a dimensão espiritual do ser humano
dispõe de possibilidades adicionais de lidar com o medo, por meio da reserva de
energia espiritual. Acreditar que aquilo que acontece é o melhor que poderia
ocorrer ajuda a superá-lo e a manter a autoconfiança que traz audácia, coragem,
ousadia. Para aqueles que creem, colocar-se nas mãos de Deus e enfrentar o que
o destino lhes reserva é uma forma poderosa de lidar com o medo. A perda da fé e da esperança facilita que ele se instale.
Para
lidar com o medo é preciso tomar
consciência de sua inutilidade. Manter
a calma, tranquilidade, serenidade
é um antidoto contra ele. Uma vontade
forte e livre não permite que o medo se instale. Exercícios físicos corporais
estimulam e tornam mais positivas as emoções e pensamentos e ajudam a evitá-lo. Pela lei da atração, o medo atrai o objeto do medo; não ter medo
afasta o objeto do medo. Somente com coragem o perigo real ou imaginário poder ser
enfrentado. Ajuda a afastar
o medo o desenvolvimento da autoestima,
ter um projeto ou meta a realizar, ter compromisso com a verdade, manter a
calma. Olhar de frente aquilo que se teme ajuda a superar o encolhimento, o recuo e o instinto
de fuga.
A propaganda hipnotiza,
fascina, espalha o medo. Por meio dela pode-se semear dúvidas e cizânia,
perturbar, causar intranquilidade, excitação. Paz e guerra se realizam
crescentemente no campo psicológico. Espalhar inquietação,
preocupação com o futuro, pânico, desestabilizar com a guerra de nervos são
formas de fazer nascer e crescer o medo. Governos usam a tática de dominar pelo terror. Michael
Moore mostrou no filme Fahrenheit 9/11
como o governo americano, ao buscar
apoio para atacar o Iraque,
induziu um clima de medo entre a população americana por meio da mídia de massa.
Manipulou o medo ao terrorismo e a supostas armas de destruição de massa do
inimigo. O medo ao estrangeiro nas ondas
de refugiados e migrantes leva europeus a se fecharem em políticas
nacionalistas e xenófobas.
A perspectiva de perder alguma coisa provoca medo.
Esse algo pode ser a perda da vida, da liberdade, saúde, juventude, memória;
perder uma pessoa querida, vantagens, bens materiais, emprego, conforto e bem estar. Há o medo da perda do
poder e das benesses que ele traz, que geram reações como as de uma fera
acuada.
Há
o medo do salto no escuro, de vertigem e se estar
caindo num abismo, de encontrar algo com que não se poderá lidar. O medo do desconhecido traz angustia e insegurança em relação ao
futuro. O pânico pela
falta de informação confiável acontece em casos de acidentes nucleares.Medos
ancestrais incluem o de serpentes, de
ratos e insetos e de forças naturais poderosas difíceis de enfrentar. Nas
cidades, pessoas deixam de frequentar os espaços públicos ou de saírem à noite
por medo da violência, de serem assaltadas e agredidas. Cercam-se de muros
altos para se proteger dos perigos do ambiente externo, fora do lar, sua zona
de conforto. Afastam-se de situações que levem ao confronto.
Atualmente, cresce a consciência sobre novos perigos à
vista, associados a perdas de biodiversidade e mudanças climáticas
rápidas. Diante de mega desafios tais
como os representados pelas mudanças no clima e a crise ecológica da atual
época antropocena, acender luzes amarelas de alerta e de emergência são passos
para lidar com os perigos à frente. Ao aterrorizar as pessoas, as previsões de
catástrofes paralisam as reações, podem produzir sensação de impotência, de não
ter o que fazer, de medo do futuro. Para além de uma reação emocional de medo,
a iminência da catástrofe pode ser compreendida pela razão como um desafio a
ser vencido. Isso cria motivação para desenvolver a astúcia, a inteligência, a
resistência. Com calma, vem a aceitação da situação e a consciência da
necessidade da adaptação, o desenvolvimento de estratégias de sobrevivência. Mobilizam-se
ações para se proteger e escapar da catástrofe, evitar que o desastre aconteça ou
para se prevenir e criar sistemas de alerta. Cientistas convencidos dos riscos
que eventuais colisões com outros corpos celestes representam para a vida na Terra
montam sistemas de previsão e de prevenção. Cientistas também denunciam o
déficit de consciência ecológica dos governantes, a ganância e o egoísmo que
estão na raiz de muitos problemas contemporâneos. Cumprem assim o papel de expandir a consciência
ecológica coletiva e de pressionar por ações adequadas para lidar com essas
circunstâncias críticas.
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