A metrópole adensada perde atratividade na pandemia
Maurício Andrés Ribeiro
Nas últimas décadas houve um esvaziamento do campo e uma explosão demográfica nas grandes cidades. A pandemia fortaleceu a tendência de desmetropolização e de migração reversa.
Viver nas cidades tornou-se imprevisível. Quem pôde, saiu delas para viver no campo ou em pequenas cidades, menos sujeitas a riscos.
Negócios imobiliários se intensificaram com a fuga das metrópoles em busca de destinos com mais espaço e menor custo de vida. Intensificou-se o êxodo para o campo e para pequenas e médias cidades. Valorizaram-se casas no campo, desvalorizaram-se apartamentos em cidades. “Sell city, buy country.”
Na quarentena, permanecer por longo tempo num espaço pequeno tornou-se desconfortável e buscou-se áreas rurais com mais espaço em pequenas cidades na Europa e na Inglaterra. Tal êxodo imobiliário para as pequenas cidades e da cidade para o campo, ocorreu na Espanha bem como nas aldeias italianas.
A pandemia e a crise econômica dela decorrente aceleraram tendências de mudanças nas cidades americanas. Famílias se mudaram para periferias e zonas rurais menos caras e menos adensadas. Cortaram os custos dos ambientes densos e esvaziaram os usos de parques, cinemas e lugares públicos.
Cresceu a consciência sobre os riscos sanitários a que estão expostos os cidadãos mais vulneráveis. Nas grandes cidades, as áreas mais bem equipadas com infraestrutura se gentrificaram e expulsam quem não tem condições de pagar os altos preços para viver ali. A desmetropolização trouxe um atrativo especial para idosos empobrecidos num mundo com previdência social em crise e que maltrata os velhos urbanos.
Pessoas fugiram da contaminação em busca de tranquilidade e bem estar, com mais espaço para crianças e menos aglomerações. Maior proximidade com o ambiente natural é um benefício dessa tendência. Viver no campo ou em pequenas cidades reconecta crianças e adultos com a natureza e constitui um momento pedagógico de desalienação ecológica e de compreensão dos ciclos e ritmos naturais. Afastados dos apelos consumistas torna-se mais leve sua pegada ecológica, hídrica, de carbono, o que alivia os impactos que seus modos de vida provocam no ambiente.
A pandemia acelerou o impulso para se reconectar com a terra, para valorizar a agricultura familiar, para voltar a viver no meio rural e aprender sobre os vegetais, os animais e a água. A agricultura domiciliar, reduz a dependência em relação a sistemas de abastecimento de grande escala, gera mais segurança alimentar por meio da produção de alimentos junto ao local de consumo, em ciclos e sistemas locais, além de trazer bem-estar emocional. A pandemia reforçou a importância da agricultura familiar e da soberania alimentar. A FMI, a FAO e órgãos de meio ambiente da ONU propuseram sistemas alimentares sustentáveis que valorizam as produções locais e regionais, dietas saudáveis com menor consumo de alimentos de origem animal, bem como a agricultura regenerativa, que proteja os solos, a água e o ar, a conservação de florestas e a redução da pecuária.
Depois de longo período de urbanização acelerada no mundo inteiro e no Brasil, o pêndulo da evolução oscilou para o outro lado. Esse movimento pendular foi facilitado pelas novas tecnologias da informação e da comunicação e impulsionado pelos menores custos para se viver em pequenas cidades e no interior.
A pandemia acelerou a desterritorialização. No mundo atual as distâncias físicas perderam importância pois as conexões sociais para o trabalho, o estudo e a cultura se estabelecem via internet e redes de comunicação. O real distanciamento social acontece entre quem está ou não está conectado.
Muitas cidades substituíram a estratégia de atrair empresas com incentivos fiscais e passaram a oferecer vantagens para atrair indivíduos que já dispõem de emprego e renda. Cidades passaram a atrair trabalhadores individuais com liberdade para morar em qualquer lugar. Conectados nas cidades Zoom, em alusão ao aplicativo mais usado, eles escolhem onde viver de acordo com seu bem estar e não com a localização de seus empregadores.
As construções que se fazem na cidade hoje poderão estar de pé daqui há cinquenta anos. Naquele momento, a disponibilidade de petróleo será menor, seu preço será mais alto, a consciência sobre os impactos ambientais e climáticos de seu uso será maior, o risco de ocorrerem novas pandemias será maior. A desmetropolização é um ajuste de longo prazo em direção a uma sociedade energeticamente mais eficiente, que antevê o declínio da era dos combustíveis fósseis e que procura se proteger de novas pandemias.
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