domingo, 13 de dezembro de 2020

Adaptação necessária para a sobrevivência na onda da pandemia.

 

                                                  Adaptar-se à onda e saber surfar nela.

Maurício Andrés Ribeiro

 Em poucos meses o coronavirus impôs  adaptações que incluíram adotar novos estilos de vida, mudar  rotinas, teleatividades, aprender a usar tecnologias digitais,  afastar-se fisicamente dos demais para não ser contagiado, passar a adotar hábitos de higiene mais frequentes, usar máscaras como filtros para se proteger. A pandemia exigiu grande capacidade de adaptação da humanidade.

A capacidade de adaptação é vital para a sobrevivência de um  ser vivo no seu ambiente. Ela exige compreender as condições do contexto e encontrar a melhor maneira de evitar os riscos presentes no ambiente.

As mudanças ambientais exigem adaptações. As espécies que não se adaptam tendem a se extinguir ou a sofrer perdas populacionais. Observou o físico e jornalista Flávio de Carvalho Serpa[1] que “Sobrevive o mais adaptado. A natureza não distingue entre o bem e o mal. A humanidade é a única que tem a ética e honestidade como fator seletivo, o que é bom.” A ética é constituída pelos princípios que regem os costumes e hábitos e propiciam a arte e os benefícios da convivência.

Para se adaptar é preciso estar alerta, atento às instabilidades,  às rápidas variações do  dia a dia e ajustar sua rotina ao contexto do momento. Um surfista  hábil se movimenta conforme a onda e todas  as variações que ela oferece. Se ele vacila, pode se machucar ou coloca em risco a própria vida. A grande onda  da pandemia exigiu a habilidade de  um bom surfista.

Na adaptação se vive cada momento e cada dia, e se renuncia a planos de médio e longo prazos pois o futuro torna-se imprevisível. Muita gente precisou reprogramar viagens ao avaliar que os riscos associados a elas eram maiores do que os benefícios e precisou ter paciência e esperar a vinda de uma vacina ou que passasse o pico de contaminações. A adaptação exige criatividade para formular respostas inovadoras aos desafios. Exige informações e dados para monitorar na sintonia fina, por exemplo, como a pandemia se espalha e desenhar as táticas adequadas para lidar com ela.   

Para se adaptar é necessário compreender as mudanças e aceitar que elas são inevitáveis. Uma certa resignação é pré-requisito para se dispor a mudar. Nesse ponto os brasileiros com o seu jeitinho e os indianos com o seu jugaad estão bem equipados comportamentalmente para a adaptação, que exige capacidade de improvisação, aceitando o inesperado como parte da vida.

Visões controversas nas narrativas sobre a realidade propõem maneiras distintas de lidar com ela. Nesta pandemia governos propuseram ações que iam de um lockdown ou fechamento completo e radical, e outros não impuseram qualquer restrição e deixaram a critério dos indivíduos tomar a decisão que lhes parecesse mais correta. Por ser um evento inesperado, houve experimentações, tentativas e erros e aprendizagem com aproximações sucessivas no modo de lidar com ela.

Há aqueles que negam, resistem a se dobrar aos fatos e a aceitar que mudanças são necessárias, seja por ignorância, por conservadorismo e horror às mudanças ou por incapacidade de ter respostas a dar às novas situações.

Para reduzir ansiedade e estresse e reduzir os custos das demandas extra que deverão atender, planos de saúde  e empresas de seguros divulgaram dicas para a adaptação do modo de vida durante a pandemia.

O homem é produto do meio, que por sua vez é produto do homem. O ser humano, dentro de certos limites,  tem a capacidade de influir sobre o ambiente e de moldá-lo conforme suas necessidades. As paisagens produzidas ou influenciadas pelo ser humano tornam-se cada vez mais frequentes no planeta. Mas somos também aprendizes de feiticeiros: algumas das experimentações que fazemos geram efeitos colaterais imprevistos que se voltam contra nós como bumerangues. A adaptação  a uma nova situação pode ser passageira e volta-se ao estado anterior quando a emergência passar, ou pode ser duradoura, quando essa mudança perdura por longo tempo. Na medida em que a pandemia se  alonga no tempo novos hábitos e táticas precisam se incorporar às rotinas e não se pode baixar a guarda.

Antes da pandemia convivíamos com vários hábitos e, bem ou mal, nos adaptávamos a eles. Assim por exemplo, consumismo, viajismo, carnivorismo são hábitos ecologicamente destrutivos que causam danos ambientais.  A pandemia impôs um freio . e eles serão superados quando a sociedade desenvolver a vontade e os meios para deixá-los para trás. Quando se tornarem psicologicamente impossíveis, desaparecerão.

Adaptar-se a um ambiente doente pode levar a uma doença deformadora, a normose, que Jean Yves Leloup, Pierre Weil e Roberto Crema definem como “o conjunto de normas, conceitos, valores, estereótipos, hábitos de pensar ou de agir aprovados por um consenso ou pela maioria de uma população e que levam a sofrimentos, doenças ou mortes. São patogênicos ou letais, e são executados sem que os seus atores tenham consciência desta natureza patológica, isto é, são de natureza inconsciente. As normoses são estágios ainda não percebidos pela sociedade como doenças, tais como as neuroses ou psicoses.”

Outras normoses ainda não devidamente reconhecidas coletivamente são os modelos mentais como o  especismo, que discrimina  a espécie humana entre as demais, influencia nos comportamentos insensíveis que prevalecem na sociedade e está na origem de pandemias quando se consomem animais silvestres ou se destroem seus habitats naturais.

Numa sociedade convive-se com injustiças sociais e econômicas, com situações que geram poluições ambientais e afetam a saúde individual e coletiva. Por insensibilidade, anestesia, enrijecimento, ou conformismo fecha-se os olhos para tais questões. A superação das normoses se inicia com a tomada de consciência de cada pessoa que, quando desperta, deixa de se deixar levar por comportamentos imitativos, automaticamente.  A partir dessa autocritica e capacidade de discernimento avolumam-se críticas a tais hábitos. A renúncia a tais normoses pode ser uma estratégia para reduzir os riscos de ocorrência de novas pandemias.

 

 

 



[1] Em e-mail ao autor em agosto de 2011.

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