sexta-feira, 20 de novembro de 2020

Impactos da pandemia na micro e na mega história

Maurício Andrés Ribeiro


A história humana na espiral da evolução da história natural

Em meio à neblina da pandemia é imprevisível o que está à frente. Prevalece a sensação de que atravessamos uma zona de turbulência na  mega história natural e na história humana, nas micro histórias  pessoais e nas histórias das nações.

 Esperar que tudo volte ao normal ou torcer para que isso aconteça não parece ser realizável. Voltar ao normal, não! escreve George Monbiot, mostrando os custos  da volta a uma normalidade que expolia o planeta.  Melhor  é  seguir em frente e mergulhar no desconhecido. As histórias pessoais e familiares de cada um  de nós estão sendo reescritas. Planos foram alterados,  opções de vida foram repensadas, valores e atitudes foram  revistos. Mudanças de ritmo na vida coletiva e na vida pessoal induzida pela pandemia pode alterar o rumo da evolução caso seja duradoura e caso a inércia do modo antigo não  force um retorno à normose anterior.

Várias análises focalizaram as mudanças na escala dos estados-nação. A pandemia acelerou a história e tornará o mundo diferente do que foi, com menor presença norte-americana, mais desordem e mais desafios globais, menos dependência da China e da Índia para as cadeias de suprimento de equipamentos de saúde e medicamentos, por meio de produções em muitos outros países, bem como maior resistência a imigrantes, possíveis portadores de vírus perigosos. Neil Howe periodizou os ciclos da história e identificou uma grande crise no Estados Unidos a cada quatro  gerações, o que coincide com a pandemia de 2020.

Outras análises foram mais longe e abordaram como a pandemia acelerou o aprendizado humano e com isso impulsionou transformações no mundo e no rumo da evolução. Como um evento extremo e que tem seu lado trágico, acelerou mudanças na história,  relembraram  escritores. Bruno Latour escreveu que o vírus teve a capacidade de mudar o mundo  rapidamente, como uma guerra, e que havendo visão, vontade política e ações aplicando os instrumentos corretos,  essas transformações podem continuar. 

Historiador que em seus livros conectou a história natural e a história humana, Yuval Harari  constatou que para lidar com a pandemia  o maior perigo é o ódio, a ganância e a ignorância.

A antropóloga e historiadora Lilia Schwarcz opinou que a pandemia vai alterar  a história   e que tudo vai ser reinterpretado, em novas narrativas. Spike Lee  dividiu a história em aC/dC- antes e depois do coronavirus - e propôs apertar o botão de reiniciar e fazer um reset.

O evento do Covid-19 é pequeno diante da magnitude da ruptura trazida pelas mudanças do clima e pela dinâmica planetária nesse estágio terminal da era cenozoica. Em transição para nova etapa, a humanidade entrou numa mega crise da evolução. Vários pensadores propuseram nomes para ela: era ecozoica, tecnozoica, eremozoica, psicozóica etc. Sugiro que pode ser a era da consciência - a era  noológica. Para sobreviver nessa nova etapa, a espécie humana precisa se reinventar, especialmente no campo da consciência: das ciências, das artes, das filosofias e cosmovisões,  do autoconhecimento, da educação, da aprendizagem, da espiritualidade e das práticas de vida frugais.

A pandemia criou oportunidade para refletir sobre o que já fez sentido, sobre o que não faz mais sentido e sobre o que pode dar um propósito claro à vida  humana individual e coletiva. Foi uma oportunidade para a recriação e a autotransformação que ainda não se sabe se será ou não bem aproveitada.

O tempo dirá.

 

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