sexta-feira, 31 de janeiro de 2025

CONFLITOS PELA ÁGUA NO BRASIL

 


O mito da abundância das águas no Brasil dá lugar a situações em que milhares de quilômetros de rios federais apresentam conflitos. 16,4 mil km dos cerca de 105 mil km de rios federais no Brasil são considerados de especial interesse para gestão, seja do ponto de vista quantitativo ou qualitativo, o que equivale a 16%. . 



Há as relações conflituosas nas quais os movimentos sociais e comunidades protestam contra práticas consideradas exploratórias ou poluentes por parte de empresas ou governos. Exemplo: manifestações contra a construção de barragens que deslocam populações ou afetam ecossistemas.

Há litígios legais, com disputas judiciais sobre direitos de uso ou preservação da água entre atores como governos, empresas e ONGs. Exemplo: Processos contra mineradoras. 

No Brasil, entre as principais regiões com conflitos estão o semiárido do Nordeste nos estados de Bahia, Sergipe e Minas Gerais. Em função do desmatamento e da ocupação temerária do território, a crise hídrica muda de região: em alguns anos afeta o sudeste, em outras a região de Brasília, em outros anos o semiárido nordestino, a Amazônia ou o sul do país. 

 A frequência dos conflitos tem aumentado, como mostram os gráficos abaixo.

Gráfico, Gráfico de linhas

Descrição gerada automaticamente

 Fonte: Comissão Pastoral da Terra. Publicado no Relatório Conjuntura 2020, da ANA.

Há no Brasil vários tipos de disputas. Na bacia hidrográfica do Paraguai, a pesca, a geração de energia, o turismo e o lazer a disputam; na bacia do rio São Marcos há disputas para irrigação e geração de energia. O setor hidroviário necessita de uma profundidade mínima nos rios para os barcos não encalharem, o que demanda que o setor hidrelétrico libere água dos reservatórios, reduzindo o potencial de produção de energia. Quando isso não acontece, paralisam-se hidrovias. Procissões religiosas tradicionais com barcos no rio São Francisco, em certos momentos foram prejudicadas devido à retenção de água nos reservatórios para geração de energia elétrica.

No Brasil, além dos problemas de escassez na região semi árida, devido a problemas de oferta, existem conflitos de quantidade e de qualidade nas regiões metropolitanas e nas regiões mais populosas do país devido à poluição. 

No norte de Minas, no rio Verde Grande, já na década de 90 a população ameaçou destruir todas as bombas de sucção para irrigação quando ela passou a faltar para o abastecimento humano. A polícia é chamada a intervir Medidas de gerenciamento paliativo evitaram então a eclosão da violência.

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“Em virtude do expressivo desenvolvimento regional concomitante à baixa disponibilidade hídrica, característica da região de clima semiárido, são registrados conflitos pelo uso da água na bacia hidrográfica do rio Verde Grande desde a década de 80.” 



Conflitos Procissão fluvial religiosa x geração de energia no rio São Francisco 

Em janeiro de 2016, a Chesf realizou operações especiais, com aumento de defluência a partir da Usina de Xingó, de forma a atender às solicitações das Prefeituras de Penedo, Propriá e Piaçabuçu para viabilizar a realização das Procissões Fluviais do Bom Jesus dos Navegantes de Penedo, de Propriá e de Piaçabuçu.  

https://www.chesf.com.br/SistemaChesf/Documents/RT-DORH%20006%20-%202016-IBAMA.pdf  


No Rio Madeira as hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau retém troncos de árvores e os liberam sem aviso e com isso provocam acidentes, barcos vão a pique, com   mortes e reclamação dos navegadores contra hidrelétricas e exigências para avisar antes da liberação dos troncos, para evitar acidentes e afundamentos de barcos.

No entorno de açudes no semiárido nordestino, as atividades agrícolas dependem de uma distribuição previsível de água, e isso tem levado à multiplicação de conflitos.

A expansão do agronegócio ( chamado também de hidronegócio pelo volume de águas que consome) demanda grande quantidade de água e o bombeamento para irrigação por vezes desfalca aquela necessária para o abastecimento humano. Do mesmo modo, a perfuração de poços para extraí-la do subsolo rebaixa os lençóis freáticos e subtrai a que estaria disponível para outros usos ou para recarregar os rios. ver https://cptnacional.org.br/publicacoes-2/noticias-2/7002-a-morte-das-aguas-no-oeste-da-bahia 

Na região oeste da Bahia, a captação intensiva de água nos últimos anos, voltada para abastecer as empresas do agronegócio, atinge diversas populações, especialmente ribeirinhos e comunidades de Fundo e Fecho de Pasto do município de Correntina.... A partir da década de 1970, empresas da agroindústria se instalam na região, incentivadas pelo Estado a modernizar o campo e produzir para exportação. Contudo, também desencadearam diversos conflitos ao tentar expulsar comunidades que viviam e produziam ali há séculos.”  

http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/conflito/ba-comunidades-tradicionais-de-correntina-lutam-por-direito-a-agua-e-sobrevivencia/

“No Brasil, grandes projetos de irrigação do campo que beneficiam a expansão do agronegócio têm levado à expropriação das terras indígenas, quilombolas, ribeirinhas e camponesas”

.http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/conflito/ba-comunidades-tradicionais-de-correntina-lutam-por-direito-a-agua-e-sobrevivencia/ 


No Brasil, os conflitos pela água refletem tensões em torno de seu uso, acesso e gestão, envolvendo diferentes setores, interesses e atores. Há conflitos por escassez e competição de uso: áreas com baixa disponibilidade hídrica enfrentam disputas pelo uso da água entre diferentes setores. Isso acontece na região do Semiárido: o acesso limitado à água gera competição entre uso doméstico, irrigação agrícola e consumo industrial. E aconteceu na crise hídrica no Sudeste (2014-2015): em São Paulo, a baixa nos reservatórios como o Sistema Cantareira causou tensões entre abastecimento urbano e agrícola.

Há conflitos econômicos em que empresas competem para explorar ou vender água como recurso econômico, causando tensões com comunidades locais. Exemplo: Conflitos entre indústrias de engarrafamento de água e populações que enfrentam escassez. ( ver exemplo da Coca Cola na Serra da Moeda em Minas Gerais)

Há conflitos relacionados à contaminação, quando a  poluição de rios e aquíferos causa tensões entre populações afetadas e empresas ou atividades responsáveis. No caso do Rio Doce, o desastre de Mariana (2015) comprometeu a qualidade da água, afetando populações ribeirinhas e ecossistemas. Há conflitos por infraestrutura hídrica: a construção de barragens e sistemas de transposição gera impactos sociais e ambientais significativos. A Transposição do Rio São Francisco: apesar de beneficiar regiões do semiárido, a obra gerou críticas de comunidades locais desalojadas e de ambientalistas preocupados com os impactos ecológicos. A Barragem de Belo Monte (Rio Xingu): Populações indígenas e ribeirinhas foram afetadas pelo alagamento de terras e pela alteração dos fluxos naturais do rio.

Há conflitos de território e direito ao uso da água, com disputas entre comunidades tradicionais e setores econômicos que exploram intensivamente os recursos hídricos. Exemplos são o agronegócio no cerrado: grandes plantações de soja e algodão consomem grandes volumes de água, muitas vezes impactando comunidades quilombolas e indígenas;  o desmatamento na Amazônia em que a redução das chuvas devido ao desmatamento interfere nos ciclos hídricos, afetando populações dependentes dos rios.

Há conflitos por privatização. Em algumas cidades, a concessão dos serviços de água para empresas privadas gerou reclamações sobre aumento de tarifas e redução na qualidade do serviço. Exemplo no Rio de Janeiro (CEDAE): a privatização parcial da companhia enfrentou resistência de movimentos sociais e sindicatos.


As regiões mais afetadas são a Amazônia: conflitos envolvendo desmatamento, mineração ilegal e populações indígenas;  o Nordeste: escassez hídrica e disputas pelo uso do Rio São Francisco; o Centro-Oeste: disputas relacionadas ao agronegócio intensivo e à preservação de nascentes no Cerrado; o Sudeste: tensões urbanas e industriais em áreas de alta densidade populacional e eventos de crise hídrica.

Esses conflitos evidenciam a importância de uma abordagem integral para a gestão do ciclo das águas no Brasil, em sintonia com as necessidades sociais, econômicas e ambientais.


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