segunda-feira, 27 de janeiro de 2025

RESPONSABILIDADES NO GERENCIAMENTO INTEGRADO DE ÁGUAS SUPERFICIAIS E SUBTERRÂNEAS


O gerenciamento integrado de águas superficiais e subterrâneas apresenta uma  complexidade técnica, política e administrativa que exige trabalho e articulação em várias escalas, da federal, à estadual e municipal, além da articulação internacional.

No Brasil, a legislação dispõe sobre a existência de águas de domínio federal e de domínio estadual. As águas superficiais podem ser de domínio federal ou dos estados, como mostra a figura.  

Mapa

Descrição gerada automaticamente

Figura: Dupla dominialidade: rios federais e estaduais

As águas subterrâneas são de domínio estadual, “desde que não se trate de águas subterrâneas federais, isto é, sob terrenos de domínio da União, que banhem mais de um Estado ou sejam compartilhadas com outros países” conforme acórdão de relatoria do ministro Herman Benjamin, do STJ.  

Desde a  criação da lei n. 9.433 em 1997, apenas uma pequena parte das águas subterrâneas é gerida de modo integrado com as superficiais. 

Apesar do ciclo da água superficial ser interconectado com as subterrâneas, muitas vezes sua gestão é feita de modo fragmentado e isolado, o que traz problemas de diversos tipos. 

Para que uma outorga seja dada com responsabilidade é necessária a avaliação hidrológica integrada. Unificar critérios para a outorga entre distintos órgãos outorgantes pode levar a uma gestão menos tateante e a autorizações concedidas com melhor conhecimento  sobre as reservas existentes. Há casos em que os aquíferos contribuem para alimentar os rios de domínio de outro estado ou federais e a retirada de uma quantidade de água desse aquífero reduz a vazão dos rios em outro estado. Quando um estado autoriza a retirada de água subterrânea que serve para alimentar as águas superficiais de rios de domínio da União, aflora menos quantidade na superfície, pois elas integram o mesmo sistema de vasos comunicantes.  Quando a mesma água é outorgada mais de uma vez, isso provoca insegurança na gestão.   

Acontecem casos em que, numa bacia crítica, fiscais do órgão federal lacram e fecham atividades que extraem águas de superfície e outorgas são negadas para novas atividades. Mas quando os fazendeiros cavam poços e extraem a subterrânea, com ou sem a autorização dos órgãos gestores estaduais, causam impactos nas águas superficiais. 

Figura: Rio alimentado por água subterrânea

Os fluxos de base dos aquíferos contribuem para a vazão dos rios. 

Os municípios têm competências legais para atuar sobre o que se faz com o seu solo e dispõem de instrumentos para a gestão das águas subterrâneas, tais como leis de ocupação do solo e os planos diretores. O planejamento urbano e municipal precisa ser hidratado e levar em consideração a questão da água subterrânea. 

Quando os lençóis freáticos são abastecidos por água de chuva, manter o solo permeável e proteger as áreas de recarga de aquíferos facilita com que eles sejam recarregados.   O zoneamento do solo, protegendo e mantendo permeáveis as áreas de recarga, permite a infiltração da água de chuva.  Quando o solo é impermeabilizado por asfalto ou cimento, as enxurradas escoam e menos água se infiltra. Para promover a recarga, pode-se reduzir a impermeabilização dos terrenos, por meio da adoção de pavimentação adequada e da definição de taxas máximas de ocupação. Vários municípios têm editado leis para manter áreas permeáveis que permitiam a infiltração e a recarga.

Pode-se estimular o aproveitamento da chuva dos telhados por meio  da  redução de impostos e premiação para aqueles que promovam a sua condução para poços de recarga. 

Na escala internacional, o Brasil compartilha com países vizinhos vários aquíferos subterrâneos, que não respeitam as fronteiras políticas nacionais e que apresentam fluxos em várias direções. Grandes aquíferos como o do Alter do Chão e o SAGA na Amazônia, o Urucuia ou o Aquífero Guarani extrapolam as fronteiras políticas de estados e de países e demandam cooperação internacional para serem bem gerenciados.

Há experiências de gestão integrada  de águas superficiais e subterrâneas ao redor do mundo. A França adota um modelo de gestão de bacias hidrográficas que integra as águas superficiais e subterrâneas, através de comitês de bacia que coordenam políticas públicas e a participação de diferentes stakeholders. Esses comitês colaboram com diferentes níveis de governo (nacional, regional e local) e incluem representantes de usuários, cientistas e ONGs para promover a gestão sustentável.  O uso de sistemas de monitoramento e planos de gestão integrados ajuda a manter um equilíbrio entre o uso de água subterrânea e superficial, especialmente em regiões onde há sobre-exploração de lençóis freáticos.

A Austrália implementou a Lei de Gestão de Água em 2007 para garantir que os recursos hídricos sejam usados de maneira sustentável e eficiente, com uma abordagem integrada entre águas superficiais e subterrâneas. A gestão das bacias é feita por autoridades de gestão de água que planejam e implementam medidas de uso da água, considerando tanto as águas superficiais quanto as subterrâneas.


Nenhum comentário: